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'Os policiais erraram', afirma Júlio Pompeu sobre greve da PM

"Os policiais erraram", afirma Júlio Pompeu sobre greve da PM

O ex-secretário acredita que o policial passou a ser visto com olhar de mercenário pela sociedade

Publicado em 15 de maio de 2018 às 15:24

Julio Pompeu foi secretário de direitos humanos e participou das negociações Crédito: Nestor Müller/Secom-ES

O ex-secretário de Estado de Direitos Humanos Júlio Pompeu falou em depoimento na 4ª Vara Criminal de Vitória que os policiais militares erraram na greve da Polícia Militar em fevereiro de 2017 e que o movimento “piorou” a imagem dos policiais perante a sociedade.

O depoimento de Júlio Pompeu foi o que mais demorou na audiência, com quase uma hora de duração. Segundo o ex-secretário, em todas as reuniões realizadas com a comissão do governo do Estado, em que  Pompeu esteve, as mulheres que participavam do movimento não cediam fácil. Disse ainda que a ação tinha “pouca liderança”.

“A gente lembrava de quantas pessoas tinham morrido, na esperança de que isso acabasse. As frases não surtiam efeito. Elas chegavam a usar frases do tipo ‘é bom para a sociedade aprender a dar valor aos nossos heróis’”, relatou.

O ex-secretário acredita que o policial passou a ser visto com outro olhar pela sociedade. “Eu acho que essa questão de reconhecer o policial estava mais que colocada antes do movimento. Acho que pirou a imagem deles. A sociedade via alguém que está aí para salvar vidas, mas depois passou a ver mais como mercenário do que herói. Eles erraram, eu acho. Ninguém tem direito de reivindicar algo a custo dos outros”, declarou.

O ex-secretário chegou a ser interrompido pela juíza da 4ª Vara Criminal de Vitória, Gisele Souza de Oliveira, por estar expressando a opinião.

VEJA OS PRINCIPAIS PONTOS DO DEPOIMENTO

- Não tínhamos o necessário para a negociação. Muita gente batia na porta dizendo que queria ajudar e nós precisaríamos saber com quem poderíamos contar e com quem não contar;

- Fizemos um levantamento de redes sociais e recebemos informações da Abin (Agência Brasileira de Inteligência). Já teria previsão de acontecer esse evento em várias partes do Brasil no carnaval. No Espírito Santo, se antecipou pela ida do governador para São Paulo, para se tratar de uma doença;

- Recebemos da Abin um mapeamento de redes sociais com nomes ligados ao cenário nacional. Era fácil perceber porque boa parte dessas mensagens (pelas redes sociais) que trazia pânico para a população era de pessoas com sotaques diferentes, do interior de São Paulo e do interior do Paraná, por exemplo. Com certeza foi algo que extrapolou os limites do Estado. Posteriormente, outras policias militares fizeram movimentos em outros Estados;

- A ausência do governador contribuiu para o movimento? Sim. Os conflitos entre associações também, na minha opinião. O fato político de entrar muitos policiais ao mesmo tempo? Também porque entraram mil policiais para uma capacidade de treinamento de 400 soldados.

- As novas gerações de policiais não lidam bem quando o líder militar questiona. Talvez a doutrina militar tenha que ser repensada. É uma soma de fatores;

- Me pareceu que havia um conflito de lideranças para estabelecer dentro do movimento quem sentaria com a gente. Havia impossibilidade de dialogar. É necessário ter um agente dialogador, é uma necessidade; 

- A gente não sabia como internamente o movimento se organizava. Nosso foco era a negociação. Nossa preocupação toda era essa, com quem vamos sentar e quais propostas poderiam ser colocadas;

- Volta e meia quem exercia o protagonismo mudava;

- Eu tinha contato com César Colnago (vice-governador), porque o governador estava de licença. Tínhamos que checar se era viável ou não, independente do governo. A gente entrava em contato com César para saber se poderia bater o martelo nisso;

- Nós começamos a negociação com um tema único e terminamos com 17 itens na pauta. Na verdade, é o contrário da dinâmica da Justiça do Trabalho, em que começa com muitas pautas e termina com menos. Ali aumentava, era frustrante. Era falta de experiência, não estávamos lidando com sindicalistas. O pragmatismo faz muita falta;

- Havia uma dinâmica muito parecida com movimentos sociais que a gente entra de vez em quando país afora. Em 2013 foi assim. Muita gente com liderança e pouca gente aparecia de fato para assumir a responsabilidade;

- Até entre os militares faltou essa liderança para assumir o protagonismo. Já passou do limite? Será que a mensagem já não foi passada? A posição passiva estava enorme. Todo mundo era líder, mas ninguém assumia responsabilidade, até para aceitar a mesa de negociação. Todas elas caminhavam em torno do ‘quanto melhor pior’;

- O acordo que fechamos (com as associações) dependia da tropa militar. Como houve quebra de hierarquia, uma quebra de representação, não sabíamos até que ponto dizer que a greve acabou, como as associações ou as mulheres falariam que o movimento parou;

- Liderança para manter o movimento não faltava. Para acabar com a greve, a gente estava procurando. Começar uma greve é fácil, difícil é acabar com ela, trazer a responsabilidade do que fez e que aquilo que esperava não será 100% atendido. Faltou gente com coragem;

- A gente usava o argumento de que havia muitas mortes e o tempo em que a gente estava naquele movimento. Mas a reação delas não surtia efeitos e algumas diziam que ‘é bom para a sociedade aprender a dar valor aos nossos heróis’;

- O policial passou a ser visto mais como mercenário do que como herói. Eu fui para a imprensa dizer o contrário. Os militares erraram. Ninguém tem o direito de reivindicar algo a custas dos outros. Apesar do erro, eu acredito… (juíza interrompe Júlio Pompeu pedindo para não expressar opinião).

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