Desde que o MEC anunciou cortes nas verbas destinadas às universidades e institutos federais alegando "balbúrdia" nesses locais, houve preocupação das instituições no Espírito Santo. Na web, comentários contra a decisão do governo federal. Nos bastidores, nem sinal de a pasta voltar atrás nos cortes que devem afetar da conta de luz à limpeza das entidades.
Os cortes no orçamento para custeio (manutenção) das universidades e institutos federais preocupa as instituições por ameaçarem, além do ensino, projetos de pesquisa e extensão que trazem inovação. Na Ufes e no Ifes há grupos que estão revolucionando áreas do mercado que vão da saúde à indústria e construção civil, como é o caso do asfalto reciclado, pesquisas do ciclo da febre amarela e carros que andam sozinhos e são pensados até como agentes diminuidores da poluição na Grande Vitória.
O engenheiro civil e professor da Ufes Patrício José Moreira Pires é quem gere o projeto que usa rejeitos da indústria do mármore e granito e das siderúrgicas para criar revestimento asfáltico e base para construção de estradas. O material já foi testado em trechos estratégicos, em ruas de Anchieta, no Sul do Estado, e as análises apontam que esse asfalto reciclado tem uma performance até superior ao produto tradicional. Em breve, ele irá implantar a tecnologia dentro da ArcelorMittal, que fornece grande parte dos rejeitos para o projeto.
Outro projeto da universidade é o carro elétrico autônomo sem motorista. A tecnologia, guiada pelo titular do Departamento de Informática da Ufes, professor Alberto Ferreira, foi pioneira no Brasil e também será levada para a indústria em breve. Até a Vale se interessou, de acordo com o pesquisador, e quer caminhões autônomos para diminuir a poluição na Capital. Os carros que andam sozinhos foram desenvolvidos por ele e alunos por meio de um supersoftware.
"Até agosto de 2020 vamos entregar à mineradora um protótipo e achamos que ela terá total interesse em pôr em prática, porque o produto será ele mesmo, já pronto. É um caminhão-pipa para regar áreas de transporte de pó de minério dentro da empresa para evitar que o vento carregue esse produto e polua a cidade", detalha.
Já no Ifes, toneladas de óleo de cozinha são recolhidos pelo projeto Fábrica de Sabão Ecológico, na região do Aribiri, em Vila Velha, que transforma o material em sabão e ainda revende parte do que é reciclado para que seja transformado em biodiesel. Lá, o professor Mauro Cesar Dias coordena o trabalho, que começou em 2012 e já é responsável até por fazer girar a economia da região, com a solução criativa.
FINANCIAMENTO
Também há muitas iniciativas na área da saúde. O infectologista e professor Aloisio Falqueto é referência nos estudos da febre amarela no país e possui um acervo único no mundo, parte na Ufes e parte na Fiocruz. Trata-se de 25 mil mosquitos congelados em nitrogênio líquido que foram capturados por um grupo de pesquisadores em 2018, quando o Espírito Santo teve um surto da doença.
A ideia é investigar a fundo o ciclo de infecção do vírus, mas o projeto já sofre com problemas financeiros antes mesmo do corte de verbas anunciado pelo governo federal. É que já foram recusados três vezes os pedidos de financiamento a diferentes entidades ligadas à pesquisa no Brasil.
Agora, está em negociação com uma instituição norte-americana, que já acenou positivamente para a liberação do dinheiro. Até agora, paguei tudo do meu bolso, mas para a próxima etapa precisaria desembolsar cerca de R$ 70 mil só para os primeiros trabalhos, reitera.
Aloisio detalha que nesse segundo trâmite da pesquisa precisa de produtos específicos e caros para estudar as interações do vírus no corpo dos insetos transmissores. As análises também desvendariam outros aspectos sobre a febre amarela, finaliza.
OS PROJETOS
Realidade virtual
Como funciona?
Por meio de óculos de realidade virtual, após cerca de 10 sessões o projeto da Ufes poderiam tirar o medo de falar em público, de altura e até livrar o paciente do transtorno de ansiedade. Só poderiam se submeter ao tratamento maiores de 18 anos e a terapia não poderia ser associada a quaisquer outros tratamentos.
Carro autônomo e caminhão anti-poluição
Como funciona?
O projeto da Ufes criou um super software com mais de 2 milhões de decodificações capaz de identificar elementos físicos e visuais, como semáforos e placas de velocidade, e enviar o que eles significam para o computador do veículo. Dessa forma, o automotor funciona de forma independente. Uma mineradora de Vitória se interessou pelo projeto e encomendou um protótipo de caminhão-pipa para reduzir a poluição, que será entregue à empresa até agosto de 2020.
Barco elétrico
Como funciona?
O projeto Solares, da Ufes, criou um barco movido a energia solar. Dessa forma, a embarcação seria equipada com placas que teriam força para gerar energia capaz de mover o veículo náutico com até um tripulante. Depois disso, o grupo também desenvolveu um carrinho com a mesma forma de energia que serviu até como um teste de como seria o comportamento do barco depois de pronto.
Solução para enchentes
Como funciona?
O programa de pós-graduação de Arquitetura e Urbanismo da Ufes criou formas sustentáveis de combater os alagamentos. O grupo inventou solução em infraestrutura verde para drenar as águas das chuvas, reduzir os alagamentos e criar mais áreas vegetadas nas cidades. O plano mais eficaz criado pelo projeto compreende a criação de ambientes de lazer bem arborizados que, além de escoar a água, servem de espaços públicos para ocupação.
Técnica papiloscópica
Como funciona?
O projeto de doutorado na Ufes do policial federal Carlos Magno Alves Girelli foi até matéria nacional e gerou grande repercussão sobre a revolução das investigações policiais. A metodologia criada pelo capixaba em sua tese ajudou até nos trâmites do caso do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco (Psol) e seu motorista, Anderson Gomes. Na técnica do capixaba, é possível descobrir de forma mais fácil e evidente digitais escondidas. No caso da vereadora, o policial localizou digitais nos cartuchos de munição usados no crime.
Impactos da lama
Como funciona?
Um grupo de professores e alunos da Ufes conseguiu fazer análises inéditas dos impactos da lama de rejeitos da Samarco no Rio Doce por todo o seu trajeto. Um dossiê sobre o caso foi escrito pelo projeto e foi entregue às autoridades ambientais. Na ocasião, o estudo monitorou a pluma dos materiais e como a fauna e flora era afetada por ela. Ao todo, foi realizada uma grande expedição e outras análises pontuais.
Raio-X da febre amarela
Como funciona?
Desde que o Espírito Santo viveu um grande surto de febre amarela uma equipe da Ufes voluntariamente se dispôs a coletar mosquitos na mata, congelá-los e guardá-los para analisar ciclos do vírus da doença a fim de desenvolver tratamentos mais eficazes, prevenção mais precisa e vacina. O professor Aloísio Falqueto encabeça o projeto que já tem 25 mil unidades de mosquitos congelados em nitrogênio líquido prontos para serem estudados.
Robô para autistas
Como funciona?
Maria foi o nome do robô criado para interagir com crianças autistas. O equipamento, criado pelo Grupo de Robótica e Automação da Engenharia Elétrica da Ufes, possui inteligência tão refinada que é capaz até de fazer pirraça. O robô reconhece crianças sozinhas, faz o reconhecimento facial e identifica, até, microexpressões faciais. A criação fez muito sucesso até com pesquisadores espanhóis.
Óleo funcional
Como funciona?
O campus de Vila Velha do Ifes desenvolveu o Fábrica de Sabão Ecológico. O projeto promove economia solidária na região do Rio Aribiri, onde se concentra, e se resume a usar o óleo de cozinha para produzir sabão. O projeto, que começou em 2012, recolhe toneladas de óleo de fritura por ano, o que permite até que parte da matéria-prima seja revendida a empresas para transformação de biodiesel.
Rio Doce sistematizado
Como funciona?
O Ifes e o Ministério Público Federal (MPF) firmaram uma parceria para esse projeto. Nele, o objeto de estudo é a água do Rio Doce, por toda sua extensão - principalmente em Colatina -, e os resultados das análises servirão para ações futuras na bacia. Sistema de Informações Hidrológicas para a Bacia do Rio Doce, como é chamado, também terá como produto final um documento que vai reunir várias informações acerca dos efeitos que a lama de rejeitos causou no manancial. Os dados vão compor uma espécie de dossiê final sobre esses aspectos.
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