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Entenda a proposta para incluir atuais servidores na reforma administrativa

Entenda a proposta para incluir atuais servidores na reforma administrativa

Projeto enviado pelo governo ao Congresso vale apenas para futuros servidores. Inconformados, parlamentares apresentaram medida que prevê a inclusão de atuais funcionários públicos e membros de Poder nas novas regras

Publicado em 13 de outubro de 2020 às 15:42

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Fachada do Congresso Nacional, em Brasília, que abriga a Câmara dos Deputados e o Senado Federal
Fachada do Congresso Nacional, em Brasília: Membros de Poder ficaram fora do projeto enviado pelo governo. (Marcos Oliveira)

Promessa do governo federal para enxugar a máquina pública, a reforma administrativa valeria, até então, somente para futuros servidores. Apesar de os efeitos serem positivos – cálculos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ( Ipea) projetam uma economia entre R$ 673 bilhões e R$ 816 bilhões para União, Estados e municípios – não são imediatos. 

A maior parte da economia levaria cerca de dez anos para acontecer – período durante o qual a dívida pública se aprofundaria ainda mais. Nesse cenário, a Frente Parlamentar da Reforma Administrativa propôs ao Congresso a extensão das mudanças para atuais funcionários públicos.

Os parlamentares também querem incluir os chamados membros dos poderes, como juízes, promotores e procuradores do Ministério Público no pacote, a fim de acabar com privilégios.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/2020, da reforma, prevê o fim de distorções como férias com duração superior a 30 dias; aumento de remuneração com efeito retroativo; aposentadoria compulsória como forma de punição; progressão na carreira baseada exclusivamente em tempo de serviço, entre outras. Entretanto, as novas regras não afetariam quem já ingressou no serviço público.

Mantida como foi apresentada pelo governo federal, a reforma permitiria aos Estados poupar entre R$ 286,2 bilhões e R$ 339,7 bilhões com a folha do funcionalismo, na comparação com um cenário sem reforma. São eles que mais têm espaço para reduzir os gastos.

Nos municípios, a redução de despesas pode ficar entre R$ 200 bilhões e R$ 224 bilhões. Para a União, o estudo estima a possibilidade de economia de R$ 186,9 bilhões a R$ 252,3 bilhões.

Oficialmente, o governo não apresentou, ainda, qual a previsão de economia com a reforma. Isso seria feito nas próximas etapas. O ministro da Economia, Paulo Guedes, entretanto, chegou a mencionar um potencial de R$ 300 bilhões de diminuição dos gastos com a reforma, já considerando parte das projeções feitas pelo Ipea.

O órgão calcula ainda que iniciativas para reduzir a reposição de servidores daqui para frente, cortar salários iniciais para novos entrantes e alongar os degraus das carreiras podem resultar em impactos de R$ 202,5 bilhões a R$ 318,5 bilhões nas três esferas, a depender do alcance das medidas.

A outra parte da economia viria do congelamento dos salários de servidores federais, estaduais e municipais até o final de 2021, medida aprovada neste ano juntamente com o socorro financeiro concedido aos Estados e municípios, devido à pandemia da Covid-19.

Entretanto, a demora para que essa economia aconteça tende a prolongar o desequilíbrio fiscal do país e aprofundar a dívida pública, que já se aproxima de 100% do PIB (Produto Interno Bruto). Para financiar a dívida, o governo precisará emitir títulos públicos, pagando juros ainda mais altos.

Existe ainda uma tendência de crescimento da inflação, que afeta, sobretudo, as famílias de menor renda.  Além disso, a situação deve provocar uma reação negativa do mercado, resultando em queda nos investimentos.

Para evitar um cenário ainda mais preocupante, o que a Frente Parlamentar propôs é ampliar a reforma, de modo que possam ser feitos ajustes fiscais mais imediatos. 

Segundo o deputado federal Felipe Rigoni, um dos responsáveis pela proposta, não faz sentido ter dois regimes – um para atuais, e outro para novos servidores – andando em paralelo.  "O que tem que ser feito é criar uma transição e colocar todo mundo no mesmo regime."

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Se as regras forem diferentes, o futuro servidor vai, inclusive, ter brechas para questionar a isonomia na Justiça. Isso poderia levar a reforma a cair. E qual seria o ponto disso tudo? Para dar maior eficiência à máquina pública, é preciso adequar o regime

Felipe Rigoni
Deputado federal
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Ele observa que, desta forma, sobrarão recursos para aplicação em outras áreas consideradas prioritárias, como saúde e educação, que beneficiam a população num todo e promovem desenvolvimento socioeconômico.

Analista de macroeconomia da XP Investimentos, Rachel de Sá observou que, apesar das dificuldades de aprovação de tal proposta, é preciso tentar. Mudar as regras para os atuais servidores enviaria uma mensagem positiva ao mercado, podendo atrair investimentos e impulsionar o crescimento econômico, tão mais necessário em tempos de crise.

"Hoje, boa parte dos recursos do governo federal vai para o pagamento de ativos e inativos. Os inativos foram contemplados com a reforma da Previdência, e a administrativa  vem como um complemento. Mas se olharmos só para futuros servidores, o efeito fiscal vai ser só lá na frente. Não muda nada hoje."

A economista destacou que, no curto prazo, é preciso conseguir fôlego para que o teto de gastos seja viável, que não esteja sempre na iminência de ser quebrado, e que o orçamento não seja tão engessado, com tão pouco espaço para despesas não obrigatórias.

Nos municípios, o gasto no mesmo período chegou a R$ 6,15 bilhões, segundo a Revista Finanças dos Municípios Capixabas. 

Ainda não se sabe, exatamente, qual seria a economia no Estado. Entretanto, é fato que as contas do Espírito Santo estão muito mais equilibradas que as de Estados vizinhos, ou municípios, que veem boa parte de suas receitas amarradas à folha de pagamento. As contas não são, nem de longe, sustentáveis. Muitos entes estão pagando seus servidores com atraso, ou mesmo parcelando salários.

"Isso é um problema gravíssimo, e acaba caindo nas costas da União, que vai precisar negociar essas dívidas. Mesmo com a perda de alguns benefícios, é muito melhor mudar a regra, que não ter garantia de salário. E não precisa ser uma mudança brusca. Mesmo uma pequena redução de jornada e salário já ajudaria. Todo bilhão poupado faz diferença", afirma a analista.

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A meta dos servidores não pode ser fazer fortuna. É dinheiro do contribuinte, e é uma escolha de carreira. Ninguém te obriga a isso. Embora alguns cargos precisem de salários competitivos, uma série de penduricalhos podem ser ajustados

Rachel de Sá
Analista de macroeconomia da XP Investimentos
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AS PRINCIPAIS PROPOSTAS PARA A REFORMA ADMINISTRATIVA

Servidores atuais e membros de Poder

  • A reforma proposta pelo governo federal vale somente para os novos servidores. A Frente Parlamentar propõe que as regras passem a valer também para os servidores atuais e membros dos poderes Legislativo e Judiciário, como parlamentares e magistrados.

Diante disso, seria proibido para todos os servidores:

  • Férias em período superior a 30 dias pelo período aquisitivo de um ano;
  • Adicionais referentes a tempo de serviço, independentemente da denominação adotada; 
  • Aumento de remuneração ou de parcelas indenizatórias com efeitos retroativos;
  • Licença-prêmio, licença-assiduidade ou outra licença decorrente exclusivamente de tempo de serviço, independentemente da denominação adotada, ressalvada, dentro dos limites da lei, licença para fins de capacitação; 
  • Redução de jornada sem a correspondente redução de remuneração, exceto se decorrente de limitação de saúde, conforme previsto em lei; 
  • Aposentadoria compulsória como modalidade de punição; 
  • Adicional ou indenização por substituição, independentemente da denominação adotada, ressalvada a efetiva substituição de cargo em comissão, função de confiança e cargo de liderança e assessoramento; 
  • Progressão ou promoção baseada exclusivamente em tempo de serviço; 
  • Parcelas indenizatórias sem previsão de requisitos e valores em lei, exceto para os empregados de empresas estatais, ou sem a caracterização de despesa diretamente decorrente do desempenho de atividades; 
  • Incorporação, total ou parcial, da remuneração de cargo em comissão, função de confiança ou cargo de liderança e assessoramento ao cargo efetivo ou emprego permanente.

Fim de outros privilégios
Além das vedações já propostas pelo governo, a Frente Parlamentar também propõe incluir outras proibições, tanto para novos como atuais servidores. São elas:

  • Estabelecimento da prerrogativa de concessão de abono permanência passa a ser da administração pública, mediante a avaliação de desempenho dos profissionais que estejam com possibilidade de se aposentar;
  • Impedimento de concessão de novas aposentadorias vitalícias para servidores públicos e membros de Poder;
  • Vedação de concessão de licença remunerada para servidores públicos que se candidatem. Não afeta o direito a licença. Logo, o servidor poderá se candidatar, mas não receberá remuneração para afastar-se durante este período.

MAIA CRITICA PROPOSTA E DIZ QUE PODE ATRASAR REFORMA

O presidente da CâmaraRodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou nesta terça-feira (13) que a inclusão dos atuais servidores na reforma administrativa pode provocar judicialização do texto e atrasar a análise da reforma administrativa pelo Congresso.

"Eu acho que essa questão de tratar dos atuais servidores, do meu ponto de vista, vai gerar um litígio, uma judicialização da matéria, e a gente não vai chegar a lugar nenhum. Eu acho que a decisão do governo de tratar dos novos servidores é uma decisão correta", declarou à CNN Rádio.

Na semana passada, o parlamentar havia dito que as regras que envolvem atuais servidores poderiam ser tratadas "de outras formas", em leis futuras, para não travar a votação da reforma.

Na manhã desta terça, Maia classificou como "muito ruim" a possível inclusão, sugerida pela Frente Parlamentar na quinta-feira passada (8), já que iria misturar com direito adquirido, e disse que o parlamento teria mais "êxito" se não fizesse "esse enfrentamento".

O deputado disse ainda que acredita votar a reforma tributária no plenário da Câmara ainda neste ano, mesmo com o esvaziamento do Congresso, provocado pelas eleições municipais.

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