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Surto no Santa Rita: fungo histoplasma é comum em fezes de aves e morcegos

Surto no Santa Rita: fungo histoplasma é comum em fezes de aves e morcegos

Quadro clínico dos contaminados é compatível com a histoplasmose, doença causada pelo fungo Histoplasma capsulatum. Causa, porém, ainda não foi apontada de forma definitiva e investigações continuam

Publicado em 3 de novembro de 2025 às 18:30

 - Atualizado há 11 dias

Hospital Santa Rita
Diversos funcionários do Hospital Santa Rita apresentaram um quadro de infecção, que é analisado pela Sesa Crédito: Ricardo Medeiros

Considerado a causa mais provável do surto de infecção no Hospital Santa Rita de Cássia, em Vitória, segundo a Secretaria de Estado da Saúde do Espírito Santo (Sesa), o fungo histoplasma é bastante comum em fezes de aves e morcegos e pode contaminar até mesmo quem não tem comprometimento imunológico.

Segundo a professora Sarah Gonçalves Tavares, do Departamento de Patologia da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), no meio ambiente, ele tende a ser encontrado em solos enriquecidos com fezes desses animais, em ambientes com pouca iluminação (como cavernas, galerias, entre outros) e temperatura não muito elevada, em torno de 18 °C e 21 °C.

A professora explica que a maioria dos fungos não causa doenças. E que, para isso acontecer, o paciente precisa ter alguma deficiência imunológica. Entretanto, essa regra não se aplica ao histoplasma, que é um patógeno primário, que pode adoecer até mesmo quem tem um bom sistema imunológico.

“Pelo simples fato de eu inalar uma carga fúngica alta, eu posso ficar doente. Se estou naquelas galerias ou estou num ambiente com ar-condicionado contaminado, por exemplo, e, por ventura, inalo essas estruturas desse fungo, dependendo da quantidade de carga fúngica, posso ficar doente. E as síndromes clínicas mais frequentes são justamente as pulmonares.”

Ainda segundo Sarah, a maioria dos pacientes contaminados pelo fungo tende a não apresentar sintomas, mas, em média, 5% evoluem para quadros de pneumonia, seja de forma leve, moderada ou grave.

A evolução dependerá, sobretudo, de quanto fungo foi inalado e do paciente, de qual era o quadro de saúde quando foi contaminado. Uma pessoa imunodeprimida ou com algum tipo de comorbidade tende a vivenciar situações mais delicadas.

“A pessoa pode ter sintomas semelhantes a um simples resfriado ou não perceber que ficou doente, e alguns pacientes podem ter sintomas mais agudos. Febre, calafrio, dor de cabeça, dores no corpo, tosse, cansaço… Também podem desenvolver artrite, artralgia, e podem ter um quadro mais delicado, inclusive evoluindo para óbito, dependendo do quadro. Isso é o que acaba acontecendo", aponta.

Em casos leves a moderados, o tratamento com antifúngicos pode durar de seis meses a um ano. Já em casos mais graves, ela explica que é necessário fazer o medicamento de forma intravenosa, durante internação hospitalar.

No caso de pacientes imunocompetentes (sem deficiências imunológicas), como dos funcionários afetados, a evolução do quadro tende a ser uma pneumonia autolimitada, que o próprio corpo cura, sem necessidade de antifúngico.

E como houve contato com o fungo?

Carolina Salume, médica infectologista e coordenadora da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Santa Rita de Cássia
Carolina Salume, médica infectologista e coordenadora da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Santa Rita de Cássia Crédito: Carlos Alberto Silva

Ainda não está claro nem comprovado, mas a coordenadora de Controle de Infecção Hospitalar do Santa Rita, a infectologista Carolina Salume, acredita que o contato com o fungo pode ter relação com frestas ou vedações ineficientes de janelas. Para a especialista, é baixa a chance da entrada do fungo ter acontecido pelo ar-condicionado.

"Todo o ar-condicionado do hospital passou por manutenção e limpeza de filtro pouco antes do surto. Além disso, as amostras recolhidas nele foram negativas. Por isso existe a possibilidade de ter vindo pelas janelas, alguma fresta que tenha ficado aberta inadvertidamente. Isso porque as janelas de hospital não são abertas. É hipótese, mas acreditamos que ocorreu contato do meio externo com o meio interno do hospital", explicou Salume.

A especialista afirma que toda vedação necessária para evitar a entrada de partículas foi feita de acordo com os protocolos. "Nós temos comissão de obra, inclusive no hospital. A gente segue todas as diretrizes junto à engenharia e à CCIH (Comissão de Controle de Infecção Hospitalar), mas aconteceu alguma coisa que a gente ainda não sabe explicar", explicou.

Investigações continuam

Embora o quadro clínico dos contaminados seja compatível com a histoplasmose, os testes realizados no Laboratório Central do Espírito Santo (Lacen-ES) e na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, ainda não permitem afirmar de forma definitiva a origem do surto, por isso, as investigações continuam.

Em uma amostra retirada de um bebedouro da unidade, por exemplo, também foi encontrada uma bactéria (Burkholderia cepacia), mas a infectologista avalia que a hipótese de que essa seja a causa do surto é pouco provável, uma vez que ela traria casos mais graves do que os apresentados pelos contaminados.

“A gente não acredita que seja o motivo porque só foi encontrada em um ponto e, principalmente, porque temos 27 hemoculturas, de 27 pacientes, e todas elas foram negativas. E para essa bactéria ter chegado no pulmão, teria que passar pela corrente sanguínea. Se fosse um surto por Burkholderia, a gente esperaria um número maior de pacientes internados, de quadros graves, com sepse (infecção generalizada), porque é uma bactéria comum, a gente tem em todos os hospitais, e os quadros não são tão brandos quanto esses.”

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