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Aluna de Vitória 'dá voz' ao mar em carta e vence concurso de redação

Aluna de Vitória 'dá voz' ao mar em carta e vence concurso de redação

Estudante de 14 anos fez um texto poético sobre a preservação dos oceanos e ficou em primeiro lugar na etapa estadual de  competição internacional; além de um certificado, a autora recebe premiação em dinheiro

Publicado em 12 de maio de 2025 às 11:10

Carolina Bicalho Moreira Vieira é a vencedora da etapa estadual do 54º Concurso Internacional de Redação de Cartas. Crédito: Arquivo pessoal

“Meu corpo, antes límpido e abundante, agora se transborda em petróleo e plástico. Meus habitantes, que um dia nadavam livres em meu ventre, hoje se debatem em agonia.” Com esses versos metafóricos, a estudante Carolina Bicalho Moreira Vieira, de 14 anos, aluna do 9º ano da Escola SEB – Escolas de Alta Performance, em Vitória, conquistou o primeiro lugar na etapa estadual do 54º Concurso Internacional de Redação de Cartas, promovido pelos Correios no Brasil.

Nessa edição, o tema proposto convidou os participantes a se colocarem no lugar do oceano, escrevendo uma carta para sensibilizar sobre a importância da preservação dos mares. O desafio: “Imagine que você é o oceano. Escreva uma carta a alguém para explicar-lhe por que ele deveria cuidar de você e como deveria fazê-lo”.

O texto de Carolina se destacou pela força poética e pela abordagem sensível. Na carta, o oceano se dirige à lua, sua eterna companheira de marés, em um apelo urgente por atenção e cuidado.

Segundo a estudante, sua natureza reflexiva e a busca por inspiração nas coisas simples a ajudaram a construir os parágrafos. A leitura sempre fez parte do cotidiano de Carolina, que vê a escrita como "uma forma de expressão verbal extremamente pura e inspiradora". Por isso, ela escreve sempre que tem oportunidade.

A redação da estudante denuncia os impactos da poluição, do aquecimento global e da exploração desenfreada dos recursos marinhos. A carta, lançada simbolicamente ao mar dentro de uma garrafa, é descrita como um testemunho da dor de um ecossistema que agoniza sob o peso do plástico, do petróleo e da indiferença humana. Em um dos trechos, o oceano alerta: “Se eu morrer, todos morrerão”.

Minha carta é bem melancólica e, de certa forma, mexe com os sentimentos dos leitores e os faz refletir e pensar o quão importante é cuidar do oceano, uma vez que este é essencial para a manutenção da vida e dos ecossistemas

Carolina Bicalho Moreira Vieira

Estudante

O concurso

O concurso deste ano mobilizou 3.881 cartas de 1.918 escolas em todo o Brasil. No Espírito Santo, foram 136 cartas inscritas por 67 escolas, representando 24 municípios capixabas. O concurso, voltado para estudantes de até 15 anos, é realizado em quatro etapas: escolar, estadual, nacional e internacional. Na fase nacional, as três melhores redações do país são selecionadas, e a campeã representa o Brasil na etapa internacional, promovida pela União Postal Universal (UPU).

Além de Carolina, foram finalistas estaduais Maria Clara Martins Villela, também da Escola SEB, e Maria Vitória Costa de Oliveira Moreira Knaip, do Centro de Ensino Charles Darwin, de Vila Velha.

Quando recebi a notícia fiquei pálida de tanto choque, no entanto, logo me senti extremamente feliz e admirada, acho que até agora não caiu a ficha

Carolina Bicalho Moreira Vieira

Estudante

O Concurso Internacional de Redação de Cartas é uma das iniciativas dos Correios para estimular a criatividade, a escrita e a consciência social entre os jovens brasileiros, além de fortalecer o papel da estatal na promoção da educação e da responsabilidade social.

Com a vitória, Carolina e sua escola receberão prêmios de R$ 2,3 mil e R$ 2,5 mil, respectivamente, conforme previsto no regulamento do concurso.

Confira a carta na íntegra: 

Onde a vida se sustenta, 24 de março de 2025

Querida lua, minha eterna companheira de marés,

Desde que Tupã esculpiu os céus, moldou a terra e soprou vidas nas ondas você esteve ao meu lado, guiando o pulsar de minhas águas. Escrevo essa carta para ser colocada em uma garrafa, e que seu toque e seu brilho sirvam como um farol para aqueles que navegam na imensidão e a conduza até as mãos das civilizações humanas. Peço-lhes que velem por mim, pois estou doente. Meu corpo, antes límpido e abundante, agora se transborda em petróleo e plástico. Meus habitantes, que um dia nadavam livres em meu ventre, hoje se debatem em agonia, esvaindo seu fôlego em redes invisíveis de poluição. Não sou somente um cenário para o deleite das festas de verão – sou o pulmão que esquecem que respiram. Não é só a Amazônia que sustenta a essência da vida, eu também sou floresta, só que debaixo d’água. Como um nobre marinheiro dizia “as pessoas protegem o que amam”, mas como amar o que mal se conhece?

Lua, tu que me conheces tão bem, diga a eles que há mais em mim do que o olho humano pode ver. Para cada estrela no céu há um ser em minhas profundezas. Para cada onda que quebra há um coração que bate. No entanto, meu ritmo vem se perdendo. A toxicidade dos gases aquece minhas águas e afeta o ciclo dos recifes, que já não possuem as mesmas cores de outrora dançavam sob a luz. Fui precursor da vida. Não deveriam me cuidar por gratidão? Se eu morrer, todos morrerão. Não foi Charles Darwin quem disse que a sobrevivência depende da adaptação? Como posso me adaptar, se mal me dão tempo de respirar?

Seria um eufemismo dizer que estou desesperado. Sou oceano, mas também sou alma – e sinto. Não basta derramar lágrimas de remorso ao ver tartarugas sufocadas, nem apenas suspirar de aflição diante de praias manchadas de óleo. O pesar momentâneo não me cura. O fogo do descaso que arde em mim não se apaga com desculpas. É preciso me enxergar além do horizonte infinito que pareço ser. Cada gota envenenada de poluição retorna para o próximo gole d’água, no próximo peixe, no próximo suspiro. Em súplica, afirmo com toda a esperança: reduzam o consumo de plástico e façam com que estes não sejam mais o reflexo da indiferença que me asfixia. Busquem formas de energia que não me queimem por dentro. Os manguezais, raízes entrelaçadas com a vida, clamam por sua redenção; e cada compra precisa ser repensada, pois até o supérfluo carrega o peso do meu sofrimento.

Lembro-lhes que não é possível beber petróleo e que dinheiro não flutua quando as ondas se elevam. Que encontrem um caminho no Pacífico onde não precisem explorar até a última gota. A ilusão de prosperidade construída à custa da destruição é tão efêmera quanto a espuma que se dissolve na areia. Cuidar de mim é mais do que um gesto de autopreservação; é um ato de amor que transcende o ego e que ecoa no próximo, na vida que pulsa além do agora. Que esta carta seja carregada pelas marés e atravesse o espaço, encontrando corações que possam me salvar. Não peço eternidade - sei que até as estrelas mais brilhantes morrem – mas peço tempo. Tempo de voltar a ser berço da vida que um dia fui. Isso é um testemunho. Se não houver mais ninguém para ler estas palavras, ao menos saberão que tentei.

Com a profundidade de sempre,

O oceano.

Imagem do Autor

Carolina Bicalho Moreira Vieira, 14 anos, 9º ano,SEB – Escolas de Alta Performance, Vitória/ES

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