Nesta semana, as duas figuras públicas que magnetizam o cenário político foram flagradas em deslizes retóricos. Jair Bolsonaro, em mais um dos muitos rompantes que revelam a falta de sensibilidade do atual presidente da República, foi novamente inoportuno ao fazer piada com cloroquina e tubaína, direita e esquerda, no mesmo dia em que o país bateu recorde de mortes pela Covid-19.
Enquanto isso, o ex-presidente Lula usava a infeliz introdução “ainda bem que a natureza, contra a vontade da humanidade, criou esse monstro chamado coronavírus” para justificar o impacto positivo da pandemia na contestação da agenda liberal. Pediu desculpas posteriormente, mas sem conseguir apagar o viés absurdamente ideológico e também insensível da declaração.
Foram episódios emblemáticos, que são janelas abertas para o vácuo de lideranças que se arrasta ao longo da década. A falta de um debate público propositivo, sem radicalismo, tem adoecido um país que não consegue encontrar saídas viáveis para salvar a economia, que já se encontrava em frangalhos antes da pandemia, e o consequente naufrágio social que se seguiu.
É assombroso que, como nação, o Brasil se encontre tão despedaçado pela falta de comprometimento público dos diferentes setores e pela ideologização rasteira. Não é somente na política que a liderança se mostra imprescindível, o poder econômico e a própria sociedade civil precisam dessa construção, cujo pilar fundamental é a educação. Só um povo com acesso pleno ao conhecimento é capaz de fazer as corretas distinções políticas, reconhecendo os perigos do populismo, venha de onde vier.
O “nós contra eles”, como é possível testemunhar atualmente, passeia por cores políticas antagônicas, mas é sempre muito conveniente aos desígnios autoritários. Mesmo que a sociedade seja plural, é possível construir uma agenda comum, capaz de estabelecer prioridades. Falta base política para que não haja mais tanto apego a salvadores da pátria, mas a confiança em líderes que promovam o diálogo, a articulação de boas ideias e propostas para a sua execução.
Na pandemia, essa modulação é crucial para a efetividade do combate. Bolsonaro, pressionado pela crise política que ele próprio desencadeou, começou a ceder, como se viu na reunião com governadores realizada na última quinta-feira (21). Mas acenos precisam vir acompanhados de atitudes e, principalmente, de mudança nas convicções.
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A democracia é espelho, com os reflexos apresentando os opostos, e por isso precisa de todo o cuidado, não pode abrir espaços à radicalização e se estraçalhar. Liderar é conduzir, nas crises ou fora delas, mas principalmente aglutinar. Divididos, não saímos do lugar. Ou pior: retrocedemos.
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