É o Brasil que está sendo testado por sua incapacidade de diagnóstico

País é o 14° do mundo em casos de novo coronavírus e o que menos realiza testes de detecção entre os 15 países mais atingidos. A subnotificação é inevitável e perigosa

Publicado em 15/04/2020 às 06h00
Atualizado em 15/04/2020 às 06h00
Profissionais de Saúde fazem o teste do coronavírus, que transmite a covid-19 por drive- thru, em uma casa de repouso de Madri, na Espanha
Profissionais de Saúde fazem o teste do coronavírus por drive-thru, em uma casa de repouso de Madri, na Espanha. Crédito: MANU FERNANDEZ/AP

Já faz algum tempo que se sabe que a estratégia de sucesso da Coreia do Sul para conter a Covid-19 está diretamente relacionada à capacidade do país de realizar testes de detecção do novo coronavírus na população. Só assim é possível mapear a doença, com elevado grau de assintomáticos que, mesmo aparentemente saudáveis, não deixam de ser um foco de contaminação. É verdade que o país asiático divulgou nesta semana que  ao menos 116 pessoas que haviam supostamente se recuperado voltaram a apresentar o vírus em novos exames. 

Contudo, sendo a reincidência ainda um aspecto nebuloso da Covid-19 para os cientistas, é possível dizer que a política de testagem em massa no país esteja contribuindo até mesmo para essa investigação, essencial para projeções sobre a pandemia nos próximos meses.

No Brasil, mesmo que tenha havido promessa de mudança de protocolo há algumas semanas, o "testar, testar e testar" preconizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) ainda esbarra em outras repetições, neste caso impeditivas. A baixa capacidade de testagem do país acabou moldando as decisões a serem tomadas, com somente os casos graves sendo diagnosticados na fase inicial. Atualmente, o país é o 14º do mundo em casos e o que menos testa entre os 15 países mais atingidos. Por aqui, continuam sendo examinados apenas doentes graves, mortos e profissionais de saúde. A subnotificação é inevitável. E perigosa.

Não se nega que a dependência de insumos importados para os exames esteja sendo implacável em todo o mundo, mas a visão estratégica de alguns países pode fazer a diferença na crise. Vale citar a Alemanha, que tem sido aclamada pelos bons resultados no combate à pandemia. E muito se deve ao fato de o país ser uma máquina de testes, numa das mais altas proporções do mundo: ninguém escapa, das pessoas com sintomas leves às que não manifestam a doença. 

Nessa estratégia de detecção precoce, até 500 mil diagnósticos por semana são realizados. Além disso, o governo alemão se antecipou à crise: ainda em janeiro, quando a epidemia ainda estava incipiente na Ásia, o país começou a produzir testes. O resultado se vê agora.

Sem os testes disseminados, o que se enxerga da pandemia é apenas a ponta do iceberg. A projeção mais recente aponta que devem haver mais de 225 mil casos não detectados em território nacional. Oficialmente, são 25.262. A escassez de testes somada ao isolamento social mais brando do que deveria deve prolongar o tormento. A nova previsão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, de que o pico se estenda até julho acaba sendo resultado dessa falta de estratégia mais comprometida.

A falta de investimentos na indústria de biotecnologia agora cobra seu preço, o que se reflete na escassez de insumos. Capacidade técnica existe. Tanto que o Instituto Butantã, com projeto que prevê realizar 8 mil testes por dia, na semana passada ainda esperava a chegada de reagentes importados. As carências em ciência e tecnologia ficam ressaltadas somente quando essas áreas são requisitadas. Um erro estratégico, uma falha em qualquer projeto de país que se pretenda soberano. O Brasil está sendo testado nessa crise, não pode sair dela sem aprender essa lição.

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