Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

Oscar, k-pop e a ascensão cultural coreana

Os Oscar para Bong Joon Ho e “Parasita” mostram que a Coreia do Sul é a bola da vez na cultura

Publicado em 16/02/2020 às 06h00
Atualizado em 16/02/2020 às 06h00
Bon Joon-Ho. Crédito: Rachel Luna/Divulgação
Bon Joon-Ho. Crédito: Rachel Luna/Divulgação

Desde que “Parasita” levou o Oscar de Melhor Filme na noite de domingo, 9, muito tem se falado sobre a indústria coreana de cinema. Várias matérias surgindo sobre os outros filmes de Bong Joon Ho e listas e mais listas de “filmes coreanos a que você precisa assistir”. Todas elas são válidas e voltam os holofotes para uma das maiores indústrias cinematográficas do mundo neste momento. Mas como a Coreia do Sul chegou até aqui?

Em meio a uma crise econômica nos anos 1990, uma novela coreana fez muito sucesso na China e o governo sul-coreano viu ali uma possibilidade de lucrar com sua cultura, que viveu uma grande censura durante os anos 1950 e 1990. Suas obras eram consideradas vulgares, degeneradas e “pouco nacionais”... Qualquer semelhança com o Brasil, já sabe, é mera coincidência. Mas voltemos...

Empolgado, o governo coreano passou a subsidiar a música popular. O Ministério da Cultura criou um gabinete voltado apenas para o K-Pop, decisão que, como sabemos hoje, deu certo: o K-pop é uma indústria de US$ 57 bilhões (só o BTS gera US$ 3,6 bilhões por ano para o país). Ainda, o turismo na Coreia triplicou nos últimos 15 anos muito em função da popularidade dos grupos. Com essa notoriedade, empresas coreanas gigantes como Hyundai, LG e Samsung passaram a investir em uma cultura, que, afinal, levava suas marcas para todo o mundo.

Intertítulo

O atual cinema coreano não foi um fenômeno como o K-pop, ele vem em uma ascensão desde o início dos anos 2000. Em 2004, Cannes ficou “absurdada” (perdão pelo neologismo) com “Old Boy”. Cru, violento e poético, o filme de Park Chan-Wook levou o Grande Prêmio do Juri presidido por Quentin Tarantino.

O grupo de k-pop BTS. Crédito: Instagram/@bts.bighitofficial
O grupo de k-pop BTS. Crédito: Instagram/@bts.bighitofficial

Não à toa Bong Joon Ho agradeceu o diretor de “Era Uma Vez Em... Hollywood” em seu discurso pelo prêmio de Melhor Direção. Tarantino é um fã de Bong desde que assistiu a “Memórias de um Assassino” (2003) e “O Hospedeiro” (2007); e chegou a exibir os filmes em uma sala que tem em Los Angeles. Em 2013 ele chegou a declarar que Bong Joon Ho “teria algo que Spielberg tinha nos anos 70”. Não consigo pensar em um elogio maior. Tarantino também colocou todos os filmes de Bong - e outros coreanos - em suas tradicionais listas de melhores do ano.

Voltando à Coreia, para valorizar o cinema nacional, o governo estabeleceu leis contra o domínio hollywoodiano de salas, ou seja, blockbusters como “Vingadores”, por exemplo, estreiam normalmente por lá, só não ocupam praticamente todas as salas de exibição. O resultado: em 2018, os filmes coreanos representaram mais da metade de toda a bilheteria das salas do país. Não deixa de ser irônico pensar que um filme como “Parasita”, que critica o neoliberalismo e a diferença cada vez maiores entre classes na Coreia do Sul, talvez fosse visto pelo governo brasileiro como uma ameaça, e não como uma maneira de mostrar o Brasil mundo afora - basta ver como os governistas trataram a indicação de “Democracia em Vertigem” ao Oscar.

Toda essa exposição da Coreia do Sul nas últimas décadas geraram um “soft power” para o país, ou seja, uma habilidade de influenciar e mudar sua imagem pela cultura. Basta dar uma procurada por filmes coreanos no catálogo da Netflix ou do Amazon Prime Video - são várias produções, inclusive americanas, que destacam a cultura coreana. Há desde remakes de “Suits” e “Designated Survivor” a séries originais como “Kingdom”. A Netflix, vale ressaltar, já havia apostado em Bong Joon Ho no original “Okja”, um dos primeiros filmes originais do serviço a colocá-la como um estúdio produtor de conteúdo.

A Coreia do Sul é a bola da vez na cultura, e não é por acaso.

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