Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

Hollywood lida com o #metoo à sua maneira: capitalizando

Filmes e séries sobre assédio mostram como a indústria lida com seus monstros no armário

Publicado em 18/01/2020 às 04h58
Atualizado em 18/01/2020 às 04h58
The Morning Show. Crédito: AppleTV/Divulgação
The Morning Show. Crédito: AppleTV/Divulgação

Em outubro de 2017, quando a atriz Alyssa Milano, em meio às acusações de agressão sexual contra o poderoso produtor Harvey Weinstein, convocou mulheres a escrever “me too” (“eu também”) em suas redes sociais se já tivessem sofrido assédio, ela resgatou o movimento iniciado em 2006 pela ativista Tarana Burke e o levou a outro patamar, como diria o Bruno Henrique (desculpem, não consigo resistir).

O movimento logo saiu do espectro de Harvey Weinstein - que recebeu mais de 90 denúncias - e alcançou números exorbitantes: segundo o site “Vox”, desde abril de 2017, 263 empresários, políticos e celebridades foram acusados de algum tipo de conduta sexual inadequada.

Outros nomes fortes em Hollywood caíram. Kevin Spacey, Bryan Singer, Jeffrey Tambor, Louis C. K., Asia Argento etc.. O #MeToo mexeu profundamente nas estruturas da sociedade americana.

 Crédito: Paris Filmes/Divulgação
Crédito: Paris Filmes/Divulgação

Como sempre acontece nesses casos, a indústria cinematográfica dá um jeito de controlar a narrativa e agora os primeiros produtos relevantes sobre o movimento começam a ganhar destaque. “O Escândalo”, indicado a três Oscar (mais sobre o filme na página 52), e a minissérie “The Loudest Voice”, do Showtime, falam sobre o escândalo da Fox News, cada uma à sua maneira.

A série, protagonizada por Russell Crowe e Naomi Watts, tem seu foco em Roger Ailes e todas as atrocidades cometidas por ele - por mais que funcione, o roteiro passa muito tempo falando sobre Roger, sua carreira política (foi conselheiro de todos os presidentes republicanos), sua influência na mídia… É mais uma história sobre ele do que sobre o caso.

The Morning show

É aí que entra “The Morning Show”, uma das apostas da AppleTV+. A série se baseia em casos reais, mas não leva nenhum deles para a tela. Ela tem início quando um jornal publica acusações de assédio contra Mitch Kessler (Steve Carell), o âncora mais popular da TV americana. A acusação pega todo mundo de surpresa e deixa sua parceira de bancada, Alex Levy (Jennifer Aniston), sem chão. Logo surge uma nova jornalista, Bradley Jackson (Reese Witherspoon), para assumir o posto deixado por Kessler, mas cabe a todos lidar com o caso: seria a emissora parte do problema?.

Com um elenco impecável, “The Morning Show” explora melhor as relações humanas. Mitch, por exemplo, não se vê como um “predador”, não consegue enxergar o que fez de errado. O mérito da série é tratar o assédio não apenas como os atos sexuais, mas mostrar que existe uma relação de poder envolvida, uma permissividade no ambiente, na cultura da empresa.

Steve Carell é ótimo ator, simpático, charmoso e carrega consigo o carisma de papéis em “The Office”, “O Virgem de 40 Anos”, “Meu Malvado Favorito” e por aí vai. Assim, o espectador até se questiona sobre a veracidade das acusações. Como, afinal, um cara tão bacana e adorado por todos no trabalho faria aquilo? “The Morning Show” ainda tem a sacada de mostrar uma relação “normal” dentro do mesmo ambiente e de cravar as diferenças entre os comportamentos.

Vale ressaltar que a série foi criada por uma mulher (Kerry Ehrin), tem uma mulher como produtora executiva (Mimi Ledger), tem sete dos 10 episódios dirigidos por mulheres e que elas também são metade do time de roteiristas. Pode parecer besteira, mas a visão feminina nesses casos é fundamental para entendê-los.

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