Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

"Amigas Para Sempre", da Netflix, é melodrama de altos e baixos

"Amigas Para Sempre" leva para as telas da Netflix o livro homônimo de Kristin Hannah. Trama acompanha a amizade de duas amigas através de décadas

Vitória
Publicado em 06/02/2021 às 15h19
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Série "Amigas Para Sempre", da Netflix. Crédito: Netflix/Divulgação

Na construção de sua popularidade, a Netflix investiu pesado em produtos voltados para o público jovem. Pode ter sido o algoritmo ou uma estratégia de mercado, pouco importa. Mas com um catálogo já carregado de obras desse nicho, a gigante do streaming começa a olhar para outras possibilidades. O melodrama para adultos, por exemplo, não era bem explorado até recentemente, mas agora tem em séries como “Doces Magnólias” e “Virgin River” bons representantes. A esse time se junta “Amigas Para Sempre”, que chegou à plataforma na última semana.

Adaptado do livro homônimo de Kristin Hannah, a série acompanha a história da amizade de Tully e Kate, duas mulheres na casa dos 40 anos. Amigas desde a adolescência, as duas sonharam juntas, mas tiveram caminhos bem diferentes na vida. Enquanto Tully (Katherine Heigl, na fase adulta) se tornou uma estrela de televisão, Kate (Sarah Clarke, na fase adulta) se casou, teve uma filha e se dedicou à criação dela. Agora, passando por uma separação, Kate decide voltar ao mercado de trabalho comandado por pessoas muito mais jovens e em transformação.

“Amigas Para Sempre” é construída sobre uma narrativa não-linear que a aproxima de “This is Us”. Aos poucos, a série vai apresentado acontecimentos futuros e depois voltando no tempo para mostrar como a história chegou até ali. Nessas idas e vindas, conhecemos as jovens Tully e Kate, interpretadas, respectivamente, por Ali Skovbye e Roan Curtis, e as acompanhamos desde quando se encontram pela primeira vez na Alameda dos Vagalumes, a Firefly Lane do título original do livro e da série.

Os 10 episódios nos permitem conhecer bem as protagonistas. É interessante ver como a amizade delas é construída e sustentada, sempre numa relação de codependência, de realização pelos sonhos uma da outra. Tully sofre por nunca ter tido uma família estável e considera a família de Kate como sendo a sua. Kate, por sua vez, se vê frustrada por não possuir uma carreira como a da amiga. É interessante, ainda, ver como elas se projetam uma na outra, aspecto reforçadíssimo pelas atuações de Heigl e Clarke.

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Série "Amigas Para Sempre", da Netflix. Crédito: Netflix/Divulgação

A dupla de protagonistas se despe de algumas vaidades para viver mulheres em suas faixas etárias - é, sim, meio ridículo vê-las 20 anos “mais novas”, quando começavam juntas suas vidas profissionais, mas isso pode ser relevado se pensarmos em uma história contada via oral e como forma de paródia aos anos 1980.

Tendo iniciado a série sem ter visto trailer nenhum ou lido o livro, fui surpreendido com algumas boas surpresas, principalmente após os primeiros dois episódios. O problema é que “Amigas Para Sempre” se estende mais do que deveria - com 10 episódios de 50 minutos, a série deixa a impressão de enrolar o espectador durante alguns episódios apenas para apresentar um acontecimento importante na última cena.

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Série "Amigas Para Sempre", da Netflix. Crédito: Netflix/Divulgação

O público-alvo de “Amigas Para Sempre” é bem definido: mulheres na casa dos 30 ou 40 anos. O roteiro (e o livro) explora, por dois ângulos diferentes, questões como maternidade, mercado de trabalho, casamento e menopausa, mas a série funciona também para outros públicos quando analisada sob o prisma da reinvenção e da amizade. Kate e Tully se reinventam a partir das dores e dos prazeres que a vida lhes oferece; e enquanto tudo se transforma, o amor das duas permanece igual mesmo entre idas e vindas ao longo de décadas. Claro que uma relação tão duradoura também tem suas brigas que servem, claro, para potencializar a capacidade dramática do texto.

As diferentes linhas do tempo nem sempre funcionam bem, com algumas conexões forçadas entre si nas narrativas. A série é mais forte quando centrada na linha mais recente, em 2003, ou na primeira delas, em 1974. O problema é que o texto não resiste em explicar tudo o que é mostrado em tela; se uma personagem tem uma cicatriz, logo voltaremos ao momento daquele machucado; se uma diz que odeia mentiras, volta-se ao passado para uma situação onde ela diz “odeio mentiras”, e por aí vai.

Na reta final da temporada, descobrimos o verdadeiro arco dramático de “Amigas Para Sempre”. A história é bonita, com boas atuações de Katherine Heigl e Sarah Clarke, que nos fazem comprar a amizade das duas, mas é uma trama que não engrena.

“Amigas Para Sempre” é uma história de afeto que se perde um pouco nas idas e vindas e no didatismo; uma trama que é melhor quando investe nas personalidades de Kate e Tully e na relação de codependência que desenvolveram. As questões que aborda na linha temporal principal são capazes de emocionar, mas poderiam se mais bem desenvolvidas; todos os traços marcantes de personalidade são justificados, a passividade de Kate e o sentimento de posse e controle de Tully, mas pouco explorados pelo texto além de um ou outro momento.

A série da Netflix aborda apenas parte da jornada de Kate e Tully nos livros de Kristin Hannah (além do homônimo, há a continuação, “Fly Away”, não lançada no Brasil), o que significa que ainda há arcos a serem explorados, como fica claro no final do décimo episódio.

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