Nessa coluna, Nanda Perim fala de sua experiência como psicóloga e educadora parental, dando seu parecer sobre questões atuais da educação infantil, trazendo dicas, humor e muita novidade boa!

O outro lado das cólicas do seu bebê

Em momento algum digo que as cólicas não existem, mas preciso explicar o conceito da "Sombra da Maternidade", o que faz com que muitas mães projetem no bebê sua própria sombra, aquelas partes de si mesma que ficam tão evidentes no pós-parto

Publicado em 23/07/2020 às 09h01
Atualizado em 23/07/2020 às 09h44
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Shutterstock. Crédito: Nem sempre o choro do bebê é cólica, mas muitas mães insistem em não enxergar isso

Para você, que tem bebê em casa, vamos falar das temidas cólicas. Primeiramente, eu acho importante esclarecer que cada caso é um caso, que deve ser avaliado de maneira individual. Outro aspecto é que em momento algum eu digo que as cólicas não existem. E, para finalizar essa introdução, lembre que sombra chama sombra por que é o sombrio, o que não queremos ver. Portanto, é claro que passa despercebido ou pode causar negação. Então sugiro ler esse texto se, e somente se, sua proposta for a de maior conscientização, de mente aberta e vontade verdadeira de voltar o olhar para si e fazer análise.

Primeiro vou te explicar o conceito de sombra e o porquê de Laura Gutman falar do encontro, e muitas vezes da projeção da sombra na maternidade em seu magnífico livro “A Maternidade e o encontro com a própria sombra”. O bebê tem uma fusão emocional com a mãe em seus primeiros dois anos de vida, uma vez que ainda está formando seu conceito de "eu" e desenvolvendo sua psique e estrutura emocional. Dessa forma, muito facilmente, em sua experiência única, a mãe acaba por projetar no bebê sua própria sombra, aquelas partes de si mesma que no pós-parto ficam tão evidentes, que é quando menos queremos vê-las. E para suprimir esse “encontro”, muitas vezes a reação primeira é de projetá-los nos bebês. Ou seja, ao invés de admitir, por exemplo, que você está sem paciência, você diz: “esse bebê chora demais”. A mãe acaba por nomear essas projeções em características e aspectos do bebê como forma de se liberar de enfrentar essas manifestações de sombra.

Pois bem, então onde entra a cólica aí?

É muito comum ouvir em nossa sociedade que “junto com a mãe nasce a culpa”, não é mesmo? E, além disso, ouvimos também inúmeros motivos para nos fazer sentir culpa. Os famosos “pitacos” e comentários são uma das primeiras experiências que as recém mães vivem. Ainda no hospital e às vezes até durante a gravidez. E eles são a primeira fonte de culpa, uma lista infindável de coisas erradas que você está fazendo e não deveria fazer. Já perceberam? E, nessa lista, muitas vezes se encontram comidas que não deve comer, bebidas que não deve tomar, entre outras proibições que outrora faziam parte do seu dia a dia e dos pequenos prazeres aos quais você se rendia .

Pois bem, esses desejos persistem por todas essas coisas, mais agora eles vêm embalados no pacote da culpa porque você não deveria estar comendo aquelas coisas. Então não é raro vermos mães temerosas de consumir qualquer alimento que seja durante a amamentação, evitando inclusive alimentos que não estão na lista da culpa, mas que, ainda assim, “dão cólicas” no bebê.

Mas o que vejo são muitos alimentos que não fazem a mínima diferença no sistema digestivo do bebê. O que faz essa "cólica" parecer que apareceu é, na verdade, a culpa. Porque, tomadas pela culpa, qualquer choro do bebê toma a dimensão de cólica. Qualquer força, qualquer ruído vira som de cólica.

Vejo, também, mães que não amamentaram mudando o tipo de leite o tempo inteiro por manifestações do bebê, que os médicos não conseguem definir o que é, mas que, ao analisar de forma profunda, também são projeções dessa culpa, ou de outros sentimentos que são, para essas mães (e somente para elas) consequência da falta de amamentação. Como não amamentar aquele bebê é uma sombra que a acompanha no dia a dia, algo que ela ainda não processou bem, ela não aceita ou nega. Incomodar se torna um tema pendente e inconscientemente constante em sua vida.

Da mesma forma, algumas mulheres que tiveram esses aspectos trabalhados mostraram uma mudança significativa na interpretação dos choros de seus bebês, e perceberam que chamavam de cólicas manifestações normais e diárias. “Mas meu bebê tem crise de cólica e chora demais, não pára de chorar. E do mesmo jeito que vem, vai embora, do nada”.

O interessante, quando analisamos por essa perspectiva, é perceber que essas “crises de cólica” podem ter vários motivos. Aí vão alguns deles:

  • O bebê tem outras necessidades pelas quais está chorando, mas a culpa só deixa a mãe enxergar cólicas. Ela entra em desespero, dá remédio, banho quente, tenta de tudo, mas o bebê continua chorando. Ele ainda chora porque o verdadeiro motivo pelo qual está chorando, a verdadeira demanda, ainda não foi atendida, uma vez que a culpa a ofusca. Acaba sendo enxergada apenas a cólica e mais nada. Às vezes era frio, fome, sede, sono, etc...
  •  O bebê segue o ritmo da mãe. Acostumado com a frequência respiratória dela, acompanhando seu humor desde a barriga, ele a conhece como ninguém. Quando a culpa a faz ver cólicas e isso a altera, sua frequência respiratória muda e seu humor também. O bebê sente e segue o embalo. Quando a mãe já está desesperada sem saber o que fazer porque o bebê não pára de chorar “por causa das cólicas”, ele também se mantém desesperado porque acompanha a mãe. Por isso que muitas vezes a cólica vai embora “do nada”. Porque depois de tentar tudo, a mãe desiste e se acalma. O bebê, exausto, se acalma também e dorme
  • As crises têm alguma função e por isso surgem, às vezes, até com hora marcada (todo dia no mesmo horário). Um exemplo que posso citar é o de uma mãe que o bebê tinha cólicas à noite, todo dia. A mãe, já exausta, ao fazer intensa análise percebeu que era o horário que ela recebia as visitas da família e que, com as crises de cólica, eles pararam de ir visitá-los. Resultado: finalmente ela tinha um motivo para acabar com as visitas constantes que a estavam incomodando demais. No entanto, as crises do bebê se mantiveram, uma vez que se elas passassem, no imaginário da mãe, as visitas voltariam no dia seguinte. Isso se chama projeção de sombra.
  • “A hora da bruxa” geralmente não é cólica, são Hiperestímulos. Os pais acreditam que a criança está com cólicas quando, na verdade, ela está hiperestimulada. Por volta das 18h a criança está cansadinha, o pai chega em casa do trabalho e a esposa - de licença maternidade - passou o dia sozinha com o bebê. Eles acendem as luzes, ligam TV, começam a conversar sobre o dia. Sons, vozes, luzes, agitação... A criança ficar hiperestimulada, não consegue dormir, descansar, nem relaxar. E, por fim, acaba tendo uma explosão por conta da quantidade de cortisol e adrenalina que se acumularam para lidar. 

Da mesma forma, podemos analisar vários aspectos do dia a dia dos bebês: bebê que chora “demais”, que mama “demais”, que acorda “muito” à noite, etc... Fica, então, a sugestão de análise.

Esse texto foi feito com muito carinho, e faço questão de insistir que não é uma análise fácil de fazer. Muitas vezes só a vontade de fazê-la não é o suficiente para que se consiga. Por isso temos o suporte profissional para tal.

Além disso, os motivos verdadeiros podem (e muitas vezes são) bem mais profundos e internos, enraizados e oriundos de nossas infâncias e não são assim tão fáceis de alcançar. Exemplifique aqui com casos mais simples para fim de compreensão.

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