Mariana Reis é administradora de empresas e educadora física. É pós-graduada em Gestão Estratégica com Pessoas e em Prescrição do Exercício Físico para Saúde. Atua como consultora em acessibilidade e gestora na construção e efetivação das políticas públicas para a pessoa com deficiência em Vitória

Que nada nos limite

A invisibilidade que conhecemos e usamos para nos referir à falta de acesso, jamais será fatal como a invisibilidade de um vírus que está entre nós

Publicado em 28/07/2020 às 17h57
Caminhada Nacional da Luta dos Direitos das Pessoas com Deficiência, em Brasí­lia
É preciso cobrar da OMS a inclusão de pessoas com deficiência como grupo de risco, já que demandamos mais contato para nos locomover. Crédito: Marcello Casal Jr/ Agência Brasil

Um arrepio me vem de mansinho da espinha à nuca toda vez que escuto alguém com deficiência dizer que já entendia da quarentena muito antes de ela chegar. E para o meu arrepio tomar-me por inteira, quem profere essa pérola se refere a todas as pessoas com deficiência. Nesse momento a cabrita montanhesa que habita em mim avança e se rebela. Como assim?

Durante os meus quatro meses de isolamento social li e escutei muitas vezes de algumas pessoas que, acomodadas no discurso da quarentena, justificam suas próprias limitações. Não quero aqui afrouxar a responsabilidade do Governo em contemplar em suas políticas públicas à pessoa com deficiência em todos os sistemas gerais da sociedade. É uma luta que temos e que resistimos mesmo diante dos dados que insistem em se apagar diante de tantas incertezas. Afinal, somos 46 milhões de pessoas com deficiência espalhadas por esse Brasil que, mesmo sem acesso, encaram a vida para serem, em primeiro lugar, pessoas.

A luta começa no café da manhã

Essa absurda comparação me deixa em alerta. Assustada, para dizer o mínimo, porque estamos num momento pandêmico e as lutas internas e pessoais jamais vão podem ser comparadas às lutas coletivas contra um vírus que é letal a todos - com ou sem deficiência. As pessoas que fazem essa comparação são justamente as que poderiam reforçar o time para aumentar as contratações no mercado de trabalho, compreender e praticar a mudança de conceitos, participar ou ajudar a formar os Conselhos, lutar para que as escolas não rejeitem nossas matrículas, exigir que 100% da frota de ônibus seja acessível, cobrar da OMS nossa inclusão como grupo de risco, já que demandamos mais contato para nos locomover. E seria justo termos atendimento prioritário diante da situações provocadas pela covid-19.

Desafio invisível

Nunca na história da nossa geração vivenciamos um isolamento social onde o abraço nos foi retirado. Onde receber um amigo em casa virou um risco de contágio. Essa falta de acesso ao carinho e ao encontro dos nossos sentimentos nos foi excluído sem nossa permissão. A invisibilidade que conhecemos e usamos para nos referir à falta de acesso, jamais será fatal como a invisibilidade de um vírus que está entre nós. Ainda está.

A acessibilidade é muito importante mas não é o grande desafio. Ela é uma questão técnica que se resolve de várias maneiras. O grande desafio hoje é escapar do invisível sem ser infectado. Eu quero ser incluída quando a comparação for feita entre os que conseguiram sair dessa com a vida preservada e os que batalham para que o viver seja - ainda que nos falte acesso, mas nunca coragem - um lugar onde se acredita, exista respeito, que seja digno, um lugar que se construa cidadania, onde a gente lute por direitos e que possamos ser felizes.

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