Aquiles Reis é músico e vocalista do MPB4. Nascido em Niterói, em 1948, viu a música correr em suas veias em 1965, quando o grupo se profissionalizou. Há quinze anos Aquiles passou a escrever sobre música em jornais. Neste mesmo período, lançou o livro "O Gogó de Aquiles" (Editora A Girafa)

"Vivemos" mostra Ana de Hollanda como uma mulher inteira na música

Sua voz é como seu rosto, leve. E "Vivemos" é um álbum reservado aos significados pessoais da cantora

Publicado em 28/12/2021 às 06h00
A cantora Ana de Hollanda
A cantora Ana de Hollanda. Crédito: Leo Aversa

Em setembro de 2009, comentei o CD "Só na canção", no qual Ana de Hollanda se revelava uma boa letrista. Ouvi-lo, então, foi como receber uma carta de delicado amor – carente, às vezes; sentimental, noutras; emocionada, sempre.

Confesso que me surpreendi: Ana de Hollanda tem um fio de voz. Todavia, antes como hoje, seus agudos e seus falsetes soam nítidos e afinados, como por exemplo em “O Que Deixei Cair” (Ana de Hollanda e Nilson Chaves)...

E também na comovente “Berço Vazio” (Ana de Hollanda e Leandro Braga): “(...) Vento que sopra e rasga/ O peito vazio, braços vazios/ Desgarrados, então/ Cara entregue ao golpe/ Fica a chorar e fica a chamar/ Menino, alegria distante/ Distante, distante, distante (...)”.

Se no álbum anterior ela se revelara boa letrista, agora em "Vivemos" (Biscoito Fino), ela ajuntou tal predicado ao de cantora e compositora diferençadas. Autoral, esse seu quinto álbum agrega gêneros como bolero, toada, canções, criados com parceiros variados. E assim, Ana de Hollanda acrescenta virtude às músicas que cria e (en)canta, e também aos versos que sua voz lança ao ar.

Algumas músicas têm melodias e arranjos ad libitum (sem restrições ou limites). Deixar Ana disponível para cantar, tendo liberdade para cuidar das divisões rítmicas e da adequada afinação, pareceu uma decisão acertada, cujo resultado agrada os ouvidos.

Ana é emoção! E o som de um disco tão bem gravado quanto o anterior deixa isso claro. Mesmo com sua voz em primeiro plano, algo adequado e recomendável, os instrumentos mereceram relevo na boa mixagem de Lucas Ariel e Jerônimo Orselli, responsáveis também pela gravação e masterização do álbum.

Por outro lado, as divisões rítmicas são sempre providas de apropriadas intenções, não estivesse Ana cantando versos criados com parceiros e expondo sua veia musical. E como são bonitos os momentos em que ela canta apenas com um instrumento a acompanhá-la, seja o violão ou o piano!

Quem ouve Ana de Holanda, tão doce, tão afetuosa, pode até não se dar conta da mulher forte que ela é. Fazendo valer seu papel de cidadã, Ana carrega em si o engajamento que faz de seu canto um poderoso instrumento na defesa da soberania popular: da igualdade racial, de gênero e social.

"Vivemos" é um álbum reservado aos significados pessoais dela. Todos eles realçam movimentos que chamam a atenção para a busca incessante e ininterrupta por um mundo sem preconceitos: aí está a música exercendo o papel de conscientização, quando a generosidade pode ser vista como amorosamente revolucionária.

A capacidade de recrutar amigos, arranjadores e instrumentistas virtuosos, para com eles iniciar uma nova jornada, demonstra a força coletiva que os rege. A sensibilidade e o carinho que Leandro Braga e Cristovão Bastos (pianistas), João Lyra (violão, violas e guitarra) e Zé Leal (percussionista) devotam a Ana de Hollanda é notória. Vem deste quinteto a notável exatidão impressa nas composições que criam, cantam e tocam.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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