Publicado em 19 de janeiro de 2021 às 09:08
- Atualizado Data inválida
A derrota do governo Jair Bolsonaro (sem partido) na queda de braço pelo início da vacinação contra a Covid-19 aumentou o apoio de militares da atual gestão para que o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, se afaste do comando da pasta responsável pelo combate à pandemia. >
Para integrantes de alta patente das Forças Armadas, a vitória do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que conseguiu sair na frente do presidente na imunização, vinculou ao general da ativa uma imagem de negligência com a saúde da população, colocando em risco a aprovação das Forças Armadas.>
Em meio a essa disputa, o presidente Jair Bolsonaro voltou a acenar para sua base ideológica, como em outros momentos de desgaste do governo. Nesta segunda-feira (18), afirmou que "quem decide se um povo vai viver na democracia ou na ditadura são as suas Forças Armadas".>
Militares de alta patente, em diagnóstico feito à reportagem em caráter reservado, acham que o general Eduardo Pazuello, por ter encampado desde o fim do ano passado o discurso negacionista do presidente, compromete a postura institucional de independência do Exército.>
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A avaliação no Exército e de militares que integram o Executivo é que o ministro resolveria a questão passando para a reserva, como os demais militares do primeiro escalão da gestão federal. Ele, assim, teria mais liberdade para defender posições políticas.">
No entanto, desde o ano passado, quando pressionado por não conseguir conter o crescente número de infectados e mortos pela Covid-19, Pazuello tem resistido a essa alternativa. De acordo com assessores do presidente, já disse que prefere deixar o governo a passar para a reserva.>
A postura resoluta faz parte do núcleo verde-oliva considerar que a única alternativa se tornou realmente a saída de Pazuello da pasta.>
O desgaste na imagem do ministro também levou integrantes do centrão a retomar a pressão para uma mudança no comando da Saúde. O bloco de partidos aliado ao governo tem interesse na chefia da pasta.>
Com o aumento da insatisfação, Bolsonaro fez uma reunião de emergência com Pazuello na tarde desta segunda-feira. No encontro, que teve a participação de outros generais do governo, ele disse que, por enquanto, não pretende mudar o comando da Saúde.>
Bolsonaro, no entanto, pontuou que Pazuello precisa melhorar a comunicação das iniciativas da Saúde, dando mais destaque a medidas adotadas pelas Forças Armadas - um dos motivos que tem causado mal-estar entre generais da ativa.>
A avaliação, sobretudo no Ministério da Defesa, é que o ministro precisa fazer uma defesa mais enfática das operações militares de transporte de insumos a cidades em situação de emergência por causa da doença.>
O mal-estar mais recente ocorreu na crise sanitária em Manaus. No dia 8, o Ministério da Defesa iniciou operação de transporte de cilindros de oxigênio para o estado do Amazonas. No dia 11, Pazuello visitou Manaus e, na opinião de militares do governo, não deu o devido destaque à operação iniciada quatro dias antes.>
Para tentar melhorar a imagem do ministro, segundo assessores presidenciais, Bolsonaro escalou o ministro das Comunicações, Fábio Faria, para ajudar a equipe da Saúde a elaborar um novo plano de mídia.>
O primeiro passo para a mudança foi a convocação de uma entrevista do ministro logo após a reunião no Palácio do Planalto. No início de seu discurso, Pazuello citou iniciativas realizadas com o apoio das Forças Armadas, justamente na tentativa de agradar o comando militar.>
O ministro também seguiu o roteiro que aliados do presidente vinham defendendo no fim de semana: enumerar ações do governo federal para afastar do Palácio do Planalto as acusações de omissão.">
Desde o ano passado, ministros palacianos já avaliavam o timing ideal para que Pazuello deixasse a pasta. Segundo relato feito à reportagem, em dezembro, em uma reunião no Palácio do Planalto, o nome do líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), foi defendido para substituir o general no fim do primeiro semestre deste ano.>
Barros já ocupou o cargo, entre 2016 e 2018, no governo do então presidente Michel Temer (MDB).>
A incapacidade do Ministério da Saúde de adquirir doses da vacina e o fracasso da pasta na negociação com a Índia, porém, foram os episódios considerados pelo braço militar a gota d'água para que a mudança no comando da pasta seja antecipada.>
O incômodo é tamanho que militares palacianos costumam se contrariar com reportagens que lembrem da patente militar do ministro da Saúde.>
Para evitar uma vinculação com o Exército, preferem que jornalistas se refiram a Pazuello apenas como ministro, não como general.>
A derrota do último domingo (17) irritou o presidente. Segundo relato feito à reportagem, após Doria aplicar a vacina na primeira imunizada, Bolsonaro se referiu ao tucano como um "moleque" que não medirá esforços para ser candidato à Presidência da República em 2022.>
Insatisfeito, Jair Bolsonaro voltou a fazer um discurso com ameaças à democracia. Em conversa com apoiadores, na entrada do Palácio da Alvorada, ele disse nesta segunda-feira que quem decide se um povo viverá em um Estado democrático ou ditatorial são as Forças Armadas.>
"Por que sucatearam as Forças Armadas ao longo de 20 anos? Porque nós, militares, somos o último obstáculo para o socialismo. Quem decide se um povo vai viver na democracia ou na ditadura são as suas Forças Armadas. Não tem ditadura onde as Forças Armadas não apoiam", disse.>
Em momentos de pressão, como a derrota em relação à vacina, o presidente costuma radicalizar o discurso na tentativa de fidelizar a sua base de apoio mais radical. A frase sobre as Forças Armadas já tinha sido usada por Bolsonaro no início de seu mandato, em março de 2019.>
"A missão será cumprida ao lado das pessoas de bem do nosso Brasil, daqueles que amam a pátria, daqueles que respeitam a família, daqueles que querem aproximação com países que têm ideologia semelhante à nossa, daqueles que amam a democracia. E isso, democracia e liberdade, só existe quando a sua respectiva Força Armada assim o quer", afirmou naquele ano, durante um evento no Rio de Janeiro.>
Em maio do ano passado, o presidente retomou o tema ao declarar: "Nós temos o povo ao nosso lado, nós temos as Forças Armadas ao lado do povo, pela lei, pela ordem, pela democracia, e pela liberdade".>
Um mês depois, durante o velório de um paraquedista do Exército, Bolsonaro disse que "a nossa missão, a missão das Forças Armadas, é defender a pátria, é defender a democracia".>
Um outro episódio do último domingo gerou mais desgaste na imagem de Pazuello. A PGR (Procuradoria-Geral da República) deu 15 dias para o ministro explicar por que não agiu para garantir o fornecimento de oxigênio aos hospitais de Manaus. O pedido foi feito com base em reportagem publicada pelo jornal Folha de S.Paulo no sábado (16).>
Auxiliares civis do presidente e parlamentares do centrão não acreditam em uma troca de ministro agora. Dizem que os militares sempre reclamam, mas que Bolsonaro gosta do perfil "cumpridor de ordens" exibido por Pazuello.>
Em entrevista no domingo, Pazuello mentiu ao afirmar que o governo federal tinha em mãos vacinas do Butantan e da AstraZeneca ao criticar Doria pelo início da vacinação no estado de São Paulo.>
Apesar da pressão de alguns integrantes do centrão, a cúpula do bloco diz ser preferível assumir a pasta depois que o desgaste com o início da campanha de imunização tenha sido superado.>
Para o comando desse grupo de partidos, é mais viável que a troca seja efetuada durante a reforma ministerial aguardada para fevereiro.>
Além de Pazuello, Bolsonaro avalia outras mudanças em sua equipe ministerial depois da eleição para a presidência da Câmara dos Deputados. São discutidas alterações em pastas como Turismo, Educação, Minas e Energia e a Secretaria de Governo.>
Para o lugar do ministro Onyx Lorenzoni, por exemplo, que hoje comanda a Cidadania, a ideia é nomear um indicado do Republicanos, partido ao qual se filiaram dois filhos do presidente: o senador Flávio Bolsonaro (RJ) e o vereador Carlos Bolsonaro, do Rio de Janeiro.>
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