A sociedade tem assistido perplexa a cenas de truculência envolvendo tripulação e passageiros, inclusive com estes sendo retirados à força de dentro da aeronave. Esses procedimentos estão corretos?
De acordo com o Código Brasileiro de Aeronáutica, o comandante exerce autoridade sobre as pessoas e coisas que se encontrem a bordo da aeronave e pode desembarcar qualquer delas quando comprometa a boa ordem, a disciplina, ponha em risco a segurança da aeronave ou das pessoas e bens a bordo.
De fato, devem ser evitados passageiros ou objetos que possam colocar em perigo a segurança do voo, inclusive aqueles mal acomodados que possam obstruir saídas de emergência ou se tornar perigosos ao serem lançados a esmo dentro da aeronave durante o seu deslocamento.
Mas não se pode considerar que infringe a lei aquele passageiro que age de forma firme para fazer valer os seus direitos. A companhia aérea não pode tirar a pessoa do sério ao desrespeitar os seus direitos para, depois, alegar que o passageiro precisa ser retirado à força por supostamente perturbar a boa ordem.
A retirada compulsória de passageiro da aeronave, sem motivo justo, constitui fato gerador de dano moral. Ademais, a retirada forçada de pessoas da aeronave também pode, em tese, caracterizar crime de abuso de autoridade, caso seja comprovado que a autoridade, no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las, tenha abusado do poder que lhe foi atribuído com a finalidade específica de prejudicar alguém ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfação pessoal.
A própria preterição, que consiste na negativa de embarque do passageiro que compareceu pontual e regularmente para o seu voo, nem sempre ocorre em conformidade com a lei e obriga a companhia aérea a oferecer alternativas de reacomodação, reembolso e execução do serviço por outra modalidade de transporte, a escolha do passageiro, além de assistência material e compensação financeira, nos termos do que estabelece a ANAC.
Vale dizer que tem pairado um ambiente hostil que começa na hora do embarque, especialmente após as companhias aéreas começarem a cobrar pelo despacho de bagagens sob o argumento de que isso reduziria o preço das passagens de quem não as tivesse para despachar (acreditou quem quis). Obviamente, tais medidas induziram mais passageiros a levarem bagagens de mão e, com isso, se o voo estiver lotado, as aeronaves não comportam a bordo as bagagens de todos que têm direito de levá-las.
O consumidor não é obrigado a despachar sua bagagem de mão, sem nenhum critério, se esta foi devidamente contratada – em alguns casos, ela pode até mesmo trazer objetos frágeis ou medicamentos de uso imprescindível durante o voo. Além disso, despachar uma bagagem que não foi planejada para tanto torna o consumidor ainda mais vulnerável a furtos, danificação da mala e dos bens ali contidos, e aos episódios noticiados pela imprensa de introdução de drogas ilícitas em volumes despachados no próprio aeroporto.
A Constituição brasileira assegura a liberdade de ir e vir no território nacional e a companhia aérea deve prestar a devida e adequada prestação de serviços que foi contratada pelo passageiro. Além de a companhia aérea marcar um gol contra, especialmente nos lamentáveis casos de racismo, aporofobia e misoginia, as falhas na prestação dos serviços comprometem não apenas a confiança em uma empresa, mas, infelizmente, em todo o setor aéreo, se os procedimentos não forem aprimorados.
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