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É especialista em Segurança Pública

Quando os policiais militares se tornam prisioneiros da repetição

Para os "Sísifos" da segurança pública, mais duro ainda é destinarem hercúleos esforços repetidas vezes detendo os mesmos algozes e ainda serem cobrados por quem não reflete as verdadeiras causas desse caos

  • Sandro Roberto Campos É especialista em Segurança Pública
Publicado em 08/12/2022 às 15h26

O mito de Sísifo constitui uma história da Grécia antiga sobre um castigo aplicado por Hades (Deus dos infernos) a Sísifo por haver fugido de seus calabouços para o mundo dos vivos. O castigo representa o hercúleo esforço do empurrar uma grande e pesada pedra ao gume de uma íngreme montanha. Pouco mais da metade a pedra desce em função de seu peso, e Sísifo repete o feito pela eternidade.

Na segurança pública, os “Sísifos” seriam representados pelos policiais militares, profissionais da polícia ostensiva e que mais se encontram próximos dos conflitos na sociedade e se coincidem com o mesmo drama: mesmos indivíduos sendo encontrados várias vezes, depois de repetidas práticas delituosas e esforços hercúleos para detê-los.

Associado a esse adoecido cenário, acrescentamos a atual pedagogia midiática: divulgações irrefletidas dessas cenas, títulos espetaculosos e cobranças para uma “definitiva” solução por parte da PM. Mas há questões centrais que não são noticiadas de forma mais emblemática: por que estão soltos? Quais os dispositivos legais que os mantêm impunes? As fotos de prisões e apreensões com empenhos gigantescos de um hercúleo aparato policial foram suficientemente eficientes e eficazes?

Sem dúvidas, há um imenso abismo: a alimentação de um cenário irrefletido sobre o qual as PMs do Brasil são máquinas que resolverão o problema. Ledo engano. Essas questões geralmente submergem a uma zona escura e a permanência de uma população desinformada sobre esse sistema ineficiente. Por outro lado, prisões superlotadas não agregam e geram enormes custos estatais.

Data: 22/03/2019- ES - Vitória - Policiais militares no local escolhido para ser a base da PM, que fica na entrada principal do Morro da Piedade - Início das obras da Base da Polícia Militar no Morro da Piedade, em Vitória - Editoria: Polícia - Foto: Fernando Madeira - NA
Policiais militares . Crédito: Fernando Madeira

A situação nos remete enquanto cidadãos a uma escolha: ou construímos mais presídios protegendo as pessoas de bem ou novos tipos punitivos seriamente responsabilizadores devem ser repensados ou ainda continuarmos a política de desencarceramentos protegendo pessoas que lamentavelmente optaram pelas piores alternativas.

As escolhas individuais são pessoais. Para os autores do livro “Bandolatria de Democídio”, Leonardo Giardin de Souza e Diego Pessi: “Deve-se, antes de mais nada, apresentar ao delinquente uma visão realista e acurada dele mesmo, com o objetivo de ensiná-lo a identificar os padrões de pensamento que o levaram a adotar um comportamento criminoso. É fundamental insistir que os criminosos sejam tratados como responsáveis pelos seus atos, e vistos (inclusive por si próprios) não como vítimas, mas vitimadores”.

Entretanto, os desencarcerados em geral permanecem livres cometendo mais e mais delitos sob um manto permissivo legal, irrefletido pela mídia e sua equivocada pedagogia diária se excluindo do problema. Para os "Sísifos", mais duro ainda é destinarem hercúleos esforços repetidas vezes detendo os mesmos algozes e ainda serem cobrados midiaticamente por quem não reflete as verdadeiras causas desse caos. É zona de enlouquecimento, ilusões e infantilizações: é urgente repensar as arquiteturas pedagógicas que mantêm a população fora de um debate mais sério.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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