O presidente da República sancionou no final do ano passado a Lei 14.786/2023, instituindo o protocolo "Não é Não", para combater o constrangimento e a violência contra as mulheres. Penso que a lei representa um grande avanço, num país com histórico de machismo e de violência de gênero.
A nova lei não criou crimes e nem aumentou penas. Em resumo, ela protege mulheres em espaços de diversão, em ambientes como casas noturnas, bares, restaurantes e espetáculos musicais, mirando dois tipos de agressões: o constrangimento, com insistência física ou verbal mesmo depois de a mulher mostrar que não quer a interação, e a violência física, com uso da força que resulte em lesão ou até morte.
Os estabelecimentos deverão estar preparados para cumprir o protocolo, com profissionais devidamente orientados e com a afixação, em local visível, por exemplo, de telefones da PM e da Central de Atendimento à Mulher, além de detalhes sobre como pedir ajuda.
O protocolo é o resultado da evolução natural do Direito Penal, que ao longo da história sempre passou por transformações, respondendo às demandas e às mudanças sociais da humanidade. Outro marco importante na defesa da mulher é a Lei n. 11.340, de agosto de 2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha, que foi resultado de um amplo debate nacional para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
O Direito Penal está em constante mudança: desde os primórdios da civilização, as sociedades desenvolveram diferentes formas de punições para controlar o que é considerado o comportamento desviante, para manter a ordem social. No Direito Penal Primitivo, a punição era baseada em princípios religiosos e na vingança privada: os indivíduos tinham a liberdade para aplicar punições aos infratores e as penas eram geralmente retributivas, buscando compensar danos causados à vítima ou à comunidade.
Na antiguidade, por volta do ano 4.000 a.C., surgem as primeiras civilizações com organização sócio-política-econômica, e em 1.770 a.C., o Rei Hamurabi compila as leis no código que leva seu nome, instituindo a punição do crime de acordo com a sua gravidade, na mesma proporção – era o chamado olho por olho.
Somente com o Código Napoleônico, promulgado no início do século 19 na França, houve a busca pela uniformidade e padronização das penas, com a aplicação de princípios como o conceito de legalidade e a humanização das punições.
Na virada do século 19 para o século 20, houve diversas reformas moderadoras nas leis penais, principalmente em países europeus. As reformas visavam reduzir a pena de morte, humanizar as condições carcerárias e focar na ressocialização dos infratores.
Atualmente, o Direito Penal é influenciado por diferentes correntes de pensamento, como o garantismo, o funcionalismo penal e a teoria crítica do Direito. De maneira geral, busca-se um equilíbrio entre a proteção dos direitos individuais e a proteção da sociedade como um todo.
Interessante considerar também o princípio da intervenção mínima do Direito Penal, que é um dos fundamentos do sistema penal contemporâneo. Esse princípio estabelece que o Direito Penal deve ser utilizado como último recurso, somente em casos extremos, quando as demais formas de controle social e prevenção de delitos se mostrarem insuficientes.
O objetivo principal é limitar a intervenção do Estado na esfera individual, evitando a criminalização excessiva de condutas e a imposição de penas severas. A intervenção penal deve ser restrita aos casos em que se demonstra realmente necessária para a proteção dos bens jurídicos fundamentais.
O protocolo "Não é Não", portanto, segue a tendência de transformações do Direito Penal ao longo dos séculos, como resultado das mudanças sociais e culturais da humanidade, buscando sempre a evolução e o acompanhamento das demandas sociais.
O Direito Penal especificamente continuará sempre sendo objeto de debates e reflexões constantes, visto que a sociedade está em constante mudança e novos desafios surgem regularmente.
Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.