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No menu da crise alimentar: menos carne, mais insetos e muito alarde

O problema não é a ideia da inserção de insetos na alimentação das pessoas, até porque muitos grupos já os consomem. A questão é a atuação de organizações globais como veículos imperativos de propagação de “verdades absolutas”

  • Juliana Maia Bravo Klotz É associada I do Instituto Líderes do Amanhã
Publicado em 28/09/2022 às 10h00

Medidas de fechamento do comércio advindas da pandemia de Covid-19, transição para energia verde e sanções ocidentais contra a Rússia desempenharam papéis significativos nos mercados globais de alimentos e das respectivas cadeias de suprimentos. Em maio de 2022, dados da Organização das Nações Unidas indicaram que, em relação aos doze meses anteriores, o preço do trigo aumentou 56%, o dos cereais, quase 30% e o dos óleos vegetais, 45%.

Nesse cenário, o Banco Mundial prevê o crescimento da insegurança alimentar, que pode empurrar muitas pessoas para a linha da pobreza extrema. Na análise, observou-se que a guerra na Ucrânia alterou os padrões globais de comércio, produção e consumo de commodities, de maneira que os preços ficarão muito elevados até o final de 2024. Corroborando esse ponto de vista, a Bayer, empresa alemã de produtos químicos e farmacêuticos, projetou que a insegurança alimentar afetará até 1,9 bilhão de pessoas até novembro de 2022, o que poderia levar a um "furacão de fome".

Também em maio de 2022, no encontro realizado em Davos, o Fórum Econômico Mundial (FEM) divulgou um comunicado à imprensa afirmando que “existe o risco de que os esforços de curto prazo para combater a escassez de alimentos possam prejudicar o cumprimento das metas climáticas e de sustentabilidade, dada a interconexão entre agricultura e mudanças climáticas. A produção global de alimentos contribui com mais de um terço das emissões de gases de efeito estufa, e os esforços para aumentar a oferta de alimentos podem piorar as emissões e a dependência de combustíveis fósseis”.

A verdade é que o FEM não apoia esforços para encontrar soluções imediatas para a atual crise alimentar, em vez disso, concentra-se em fazer mudanças radicais na produção de alimentos e nos hábitos de consumo dos seres humanos para as próximas décadas. Já em 2018, o Fórum declarou que alimentar o mundo em 2050 exigirá um aumento de 70% na produção geral de alimentos devido ao crescimento populacional e às mudanças no consumo impulsionadas por uma classe média em expansão, com a demanda por carne vermelha e laticínios aumentando em até 80%.

Comida
Insetos usados na alimentação. Crédito: Pixabay

Isso mostra que transformar a indústria de alimentos já estava na agenda do FEM antes mesmo do surgimento da Covid-19 e do início das hostilidades na Ucrânia, fato ainda mais evidenciado quando, em junho de 2020, poucos meses após a declaração da pandemia, a organização já gritava aos quatro ventos que haveria necessidade urgente de representantes de todos os setores da economia se unirem para planejar um novo sistema alimentar.

Você pode estar se perguntando: e como seria esse sistema? Bem, a ideia deles é participar da agenda da indústria agrícola no sentido de uma transição alimentar que caminhe para o cultivo de plantas que imitem o perfil sensorial da carne, o uso de biotecnologias para produção de proteína animal em laboratórios e a inserção de insetos comestíveis na dieta das pessoas. A principal justificativa para essa mudança é a redução na emissão de gases de efeito estufa (atribuídos à criação de gado) e, consequentemente, uma compensação às mudanças climáticas.

Para incentivar as pessoas a aceitarem insetos em suas dietas, o FEM vem divulgando alguns de seus benefícios, que vão de maiores valores nutricionais ao paladar agradável de muitos deles. Surfando a mesma onda, o Banco Mundial já demonstrou apoio a esses planos e argumentou que a criação de insetos, "tanto para alimentação humana quanto para alimentação animal, tem o potencial de aumentar o acesso a alimentos nutritivos, ao mesmo tempo em que cria milhões de empregos, melhorando o clima e o meio ambiente e fortalecendo as economias nacionais".

Algumas pequenas associações de defensores da produção e do consumo em massa de produtos alimentares alternativos estão plenamente conscientes de que coagir a população mundial a aceitar essa transformação distópica da indústria provavelmente destruirá os meios de subsistência de bilhões de pessoas que dependem da agricultura convencional, o que poderá levar a uma pobreza sem precedentes, particularmente entre as classes baixa e média.

Nesse contexto, as organizações internacionais mencionadas parecem desprezar um fato muito relevante: a liberdade individual. Nem todas as pessoas farão voluntariamente mudanças tão drásticas em suas dietas. E, precisamente por esse desprezo, o FEM, em 2019, afirmou que existe uma "política emocional e cultural única de alimentos, particularmente de carne", que demanda "esforços público-privados coordenados e engajamento intergovernamental" na próxima década para desenvolver "uma narrativa global sobre a transição de proteínas" para "superar as barreiras culturais e emocionais críticas que podem estar no caminho de uma transformação holística". Em outras palavras, a transformação nos moldes desejados provavelmente imporá algum grau de força, de censura e de criação de narrativas impulsionadas pela mídia e por políticos de índole duvidosa.

Acaso os planos de mudança na indústria de alimentos logrem êxito, é preciso fazer uma reflexão também sobre sua interferência em práticas culturais e tradicionais de muitos grupos distintos. Ao longo da história, alimentos e refeições foram aspectos importantes do patrimônio cultural e têm significado nacional, ritualístico e religioso em praticamente todas as sociedades.

Para quem defende a liberdade, esses planos – pelo menos como descritos – são um prenúncio de violações a direitos individuais encobertos por um véu catastrofista que, certamente, será utilizado por ideólogos e engenheiros sociais sob o pretexto do bem-estar social. Pensar em soluções e desenvolver estratégias de eliminação de problemas faz parte da evolução do ser humano.

O problema não é a ideia da inserção de insetos na alimentação das pessoas, até porque muitos grupos já os consomem. A questão é a atuação de organizações globais como veículos imperativos de propagação de “verdades absolutas”, incitando tributações sobre alimentos “sujos” e retirando do indivíduo aspectos importantes da sua condição natural de ser independente, pensante e responsável pelas próprias escolhas.

Tanto no evento de Davos de 2022, quanto na Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2021 (COP26), os participantes desfrutaram de pratos repletos de ingredientes de origem animal. Convenientemente, cactos, algas e insetos não estavam no menu oferecido às autoridades, mas apenas nos discursos fervorosos de como nós – sim, você também – devemos consumir alimentos de perfil negativo em carbono.

Caro leitor, será que esse movimento pretende realmente salvar o planeta ou há outras intenções – talvez uma nova indústria para subsidiar e fazer lobby - por debaixo de camadas e camadas da propaganda “eat clean”? Sem medo de soar conspiracionista, eu fico com a segunda opção, até porque, como já disse Thomas Sowell, “a liberdade custou muito sangue e sofrimento para ser renunciada por uma retórica tão barata”.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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