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É professor mestre em Matemática

Matemática foi criada ou descoberta? É humana ou divina?

Não é a primeira vez que este “bode” entra na sala. Filósofos, desde Pitágoras, passando por Platão e Aristóteles, já se debruçaram sobre esse dilema e chegaram à mesma conclusão

  • Filipe Pinel Berbert Bermudes É professor mestre em Matemática
Publicado em 24/05/2022 às 02h01

Desde que Alan Turing desenvolveu uma máquina capaz de decifrar o “Enigma”, código utilizado pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial, o que não só deu a vitória aos aliados sobre os alemães como também inaugurou a era digital que respiramos, pouca coisa realmente nova havia surgido no campo da Matemática até agora.

Digo até agora porque estamos testemunhando (embora ignorando) o surgimento de uma nova Matemática: a "Matemática Humana". Pois é, aquela Matemática que atravessou milênios como o único absoluto dentre todas as ciências não é mais a mesma nos tempos atuais da "pós-verdade". Sua autoridade tem se dissolvido na liquidez da modernidade. Mas o que mudou? Por certo não foi a Matemática.

Lembro-me do impacto que senti quando, pela primeira vez, ouvi alguém, um erudito, defendendo a ideia de que a Matemática era a mais humana das áreas de conhecimento, uma vez que o único lugar em que ela habita é a mente humana. A pergunta que resume e simplifica o entendimento da questão é: a Matemática que conhecemos foi criada ou descoberta?

Antes que você se arrependa de ter iniciado essa leitura que acaba de desaguar em uma questão “irrelevante”, permita-me explicar o que está realmente em jogo. Se a Matemática é resultado da criatividade humana, o universo é um mero acidente de percurso. Entretanto, se a Matemática é transcendente, existe uma mente, maior que a humana, por trás de tudo.

Não é a primeira vez que este “bode” entra na sala. Filósofos, desde Pitágoras, passando por Platão e Aristóteles, já se debruçaram sobre esse dilema e chegaram à mesma conclusão: a Matemática não depende do homem para existir. Não temos qualquer autonomia sobre suas leis. Uma vez descobertas (e provadas), só nos cabe decidir que notação vamos adotar para materializar suas vozes.

Por isso, povos antigos e globalmente opostos como os babilônios e astecas, por exemplo, partilhavam das mesmas concepções aritméticas. Por isso, equações químicas estão se balanceando freneticamente sem nos pedir licença. Por isso, o comprimento de uma circunferência dividido por seu diâmetro é sempre pi (3,14...), quer gostemos quer não.

Não quero especular sobre os motivos que levam filósofos e matemáticos modernos a reabrirem um debate já tão assentado. Mas posso expor alguns dos desdobramentos lógicos que decorrem da conclusão de que a Matemática não é produto da mente humana.

É assombroso observar a “inexplicável” efetividade da Matemática sobre as leis que regem o cosmos. Da maçã que cai à Lua que nos rodeia, todos obedecemos à mesma pequena equação de Newton. E o que dizer sobre as quatro belas e sucintas equações de Maxwell, que descrevem com exatidão todos os fenômenos elétricos, magnéticos e luminosos? Por que tanta harmonia, proporcionalidade e simetria no Universo quando o natural seria o caos? Se formos intelectualmente honestos só nos restará concordar com Galileu Galilei: “A Matemática é o alfabeto com o qual Deus escreveu o Universo”.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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