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É também conhecido como Caboclo de Cobre, faz parte do Circuito Areté

Herança dos povos indígenas do Brasil não pode ser invisibilizada

Congelar a imagem do indígena no século XVI é uma tentativa de transformar culturas vivas em meras peças de exposição, perpetuando a invisibilização nas instituições de ensino e negando o direito de evoluir e confluir como qualquer outra cultura

  • Itupynijú É também conhecido como Caboclo de Cobre, faz parte do Circuito Areté
Publicado em 12/08/2024 às 15h07

O dia 9 de agosto é marcado pela celebração do Dia Internacional dos Povos Indígenas, uma data que nos convida a refletir sobre a ancestralidade que habita cada brasileiro. Nesse contexto, o Circuito Areté surge em uma iniciativa que chega a Vitória para destacar a importância dessa herança ancestral, que é parte intrínseca da identidade brasileira.

Somos herdeiros de um legado complexo, tecendo nossas identidades a partir de múltiplos ecos de Brasis que se espalham por cada canto desse território Pindorama.

A tentativa de compreender a vida pela lente da fé e da dor dos povos originários em confluência nos leva a questionar: o que significa ser brasileiro? Qual é a origem de nosso destino como nação, gestado em um ventre acobreado que nos deu forma e significado? Essas questões, porém, não exigem respostas definitivas, mas sim uma caminhada reflexiva que nos permita reconhecer o processo contínuo de invisibilização da herança e da contribuição dos povos indígenas para o Brasil e para o mundo.

Teatro
O espetáculo “Pindorama, Antes de Chamar Brasil” será apresentado no Teatro Sesi. Crédito: Ana Luiza Abreu

A invisibilização, um processo histórico e deliberado, buscou e ainda busca empurrar os povos originários para a margem da sociedade. Esse processo, que transcende o simples apagamento cultural, resulta em traumas, genocídios e extinções étnicas. O que vemos hoje é um reflexo de séculos de opressão, com a contribuição indígena para atenuar as violências aos corpos negros em diáspora africana no Brasil sendo sistematicamente ignorada.

Os povos de Pindorama foram submetidos a um processo cruel de desterritorialização, começando com trocas culturais e intelectuais, passando pela invasão, subjugo, genocídio e escravização. Essa metodologia de opressão não apenas despojou os povos originários de seus direitos humanos, culturais e religiosos, mas também os transformou em folclore, demonizando suas práticas e submetendo-os a adoecimento psíquico e à tortura. Esse processo culminou na morte física e no apagamento de fragmentos da história desses povos, além da apropriação cultural e mercantilização de seus saberes.

A reconstrução da autoestima e do empoderamento étnico dos povos originários passa, em grande parte, pela recuperação de sua estética, que desperta uma consciência ancestral e promove a produção de conhecimento. A troca de informações, fundamental nas culturas tradicionais, é um passo crucial para a reterritorialização e resistência dessas comunidades. Não há luta contra-colonial eficaz sem estratégias que devolvam a esses povos o direito ao seu território e à sua identidade.

Este chão em que pisamos, conhecido por muitos nomes dados por nossos ancestrais milênios antes da invasão europeia, é também Pindorama. Solo que acolheu a África em sua chegada, oferecendo cura e sustento para que a cultura africana se sentisse em casa neste Kanzuá.

Congelar a imagem do indígena no século XVI é uma tentativa de transformar culturas vivas em meras peças de exposição, perpetuando a invisibilização nas instituições de ensino e negando a esses povos o direito de evoluir e confluir como qualquer outra cultura.

Esse congelamento é uma das maiores barreiras à legitimidade das lutas por direitos territoriais e à reconstrução étnica dos povos indígenas. Ele também alimenta práticas racistas sofisticadas, que se refletem no embranquecimento até de elementos tão básicos como o açúcar, o sal e o arroz, em um processo de colonização que permeou todos os aspectos da vida.

Pouco se fala sobre o racismo estrutural aplicado aos povos originários, mas ele é um fato histórico. Desde as primeiras invasões, o plano de imposição de um imperialismo baseado na hegemonia da raça branca e na subserviência e escravização das outras não se restringiu às comunidades africanas.

Kaká Werá Jecupé, em seu livro “A Terra dos Mil Povos - História Indígena do Brasil Contada por um Índio”, nos lembra da expressão "negros da terra", utilizada para descrever os indígenas, evidenciando como o racismo estrutural foi aplicado tanto aos povos africanos quanto aos indígenas de cá.

É urgente que enxerguemos o que de vermelho ficou em nós, o sangue e a resistência dos povos originários que ainda pulsam em nossa identidade. O reconhecimento dessa herança e a luta pela visibilidade são passos fundamentais para a construção de uma sociedade mais justa e plural, onde todos os povos que compõem o Brasil sejam valorizados e respeitados.

A população da Grande Vitória e arredores está convidada para conhecer o projeto “Circuito Areté - Tempo de Festa”, que acontece de 21 a 25 de agosto. Uma série de atividades serão realizadas de forma gratuita para toda a população.

Idealizado pela Aldeia Coletivo em parceria com a Giro Planejamento Cultural, de Salvador (BA), o circuito busca celebrar a cultura cabocla e promover a memória dos povos originários do Nordeste do Brasil. Na Capital duas frentes de ações serão realizadas: em escolas públicas, com foco em alunos da rede de ensino, e também no Teatro do Sesi, com o circuito aberto ao público. E como pilar da inclusão na proposta, toda a programação contará com intérprete de libras.

Ações abertas ao público

  • 24.08 (sábado) às 16h: Apresentação do espetáculo infanto juvenil “Pindorama, Antes de Chamar Brasil”
  • 24.08 (sábado) às 20h: Show da banda “Cabokaji” com participações
  • 25.08 (domingo) às 16h: Apresentação do espetáculo infanto juvenil “Ypupyara”
  • 25.08 (domingo) às 19h: Show da banda “Cabokaji” com participações

Onde: Teatro Sesi,  Rua Tupinambás, 240 - Jardim da Penha, Vitória

Gratuito e aberto ao público: https://www.instagram.com/aldeiacoletivo/

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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