Há vinte anos, quando comecei a projetar, arquitetura era essencialmente sobre forma e função. A planta precisava ser eficiente, o layout coerente e o resultado visualmente agradável. Com o tempo, percebi que isso era apenas a superfície. O verdadeiro desafio estava em algo invisível: como criar espaços que fizessem as pessoas se sentirem em casa e, mais do que isso, felizes.
O que torna um ambiente realmente especial não são os acabamentos nobres, mas as sensações que ele desperta. É o cheiro do café na cozinha de manhã, a luz que entra pela janela num fim de tarde, o canto preferido para descansar depois de um dia intenso. São detalhes que não aparecem em catálogos, mas que definem o conforto de um lar.
Vivemos tempos em que a casa ganhou novos significados. Ela deixou de ser apenas um refúgio e se tornou extensão da nossa rotina. É escritório, escola, academia e, às vezes, o único lugar onde conseguimos respirar. Essa mudança escancarou uma necessidade antiga: a de morar em espaços que tenham sentido. E isso não se compra pronto. Constrói-se aos poucos, com escolhas que carregam afeto e autenticidade.
Projetar um espaço com alma é, antes de tudo, ouvir. Ouvir o que o cliente sonha, o que ele teme e o que ele valoriza. Não existe um projeto igual ao outro, porque não existem pessoas iguais. Há quem precise de silêncio e amplitude. Há quem busque cor e movimento. O papel do arquiteto é traduzir essas emoções em forma, luz e textura. Quando o projeto acerta esse tom, o resultado é natural: o morador se reconhece no espaço e é nesse reconhecimento que mora a felicidade.
A arquitetura também amadurece com o tempo. A tendência mais duradoura é aquela que respeita a história de quem vive ali. Um ambiente atemporal é aquele que evolui com as pessoas, não o que tenta congelar uma estética.
“Espaço com alma” não é sobre nostalgia, e sim sobre presença. É o equilíbrio entre o que nos traz memória e o que nos faz sentir bem hoje. Um quadro herdado, uma planta que cresce na janela, um sofá onde cabem as visitas e as conversas longas. Tudo isso compõe a arquitetura do sentir. E, quando o sentir guia o fazer, a casa deixa de ser cenário e se transforma em abrigo.
Acredito que a felicidade mora nos detalhes simples: na luz natural bem pensada, na textura que convida ao toque, na disposição dos móveis que favorece o encontro. Cada escolha de projeto é uma oportunidade de despertar emoções. Por isso, meu olhar hoje é menos técnico e mais humano. Aprendi que desenhar um espaço bonito é fácil; o difícil é projetar um lugar que tenha alma, e é isso que dá sentido a esses 20 anos de trajetória.
No fim, a arquitetura é sobre pessoas. É sobre criar lugares que acolham, inspirem e contem histórias. E talvez a maior prova de que um espaço tem alma seja justamente o silêncio bom que se instala quando tudo está no lugar certo, seja fora ou dentro da gente.
Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.