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É advogado previdenciarista do escritório Cheim Jorge & Abelha Rodrigues Advogados Associados

Do campo para o Direito: aposentadoria justa e reconhecimento ao trabalhador rural

Bloco de produtor rural, registros em sindicatos, contratos de arrendamento, certidões que mencionem a profissão de lavrador ou agricultor, histórico escolar em escola rural e declarações de associações são algumas das provas documentais essenciais

  • Wanderson Rangel É advogado previdenciarista do escritório Cheim Jorge & Abelha Rodrigues Advogados Associados
Publicado em 29/05/2025 às 14h15

Cresci no campo e aprendi, desde cedo, que o trabalho rural não conhece descanso: exige esforço diário, cuidado com a terra e uma coragem silenciosa que define a rotina de milhões de brasileiros. Hoje, como advogado, trago comigo o orgulho dessa origem e a responsabilidade de usar o conhecimento jurídico para proteger e valorizar quem dedicou a vida à roça.

Ao celebrar este Dia do Trabalhador Rural, no último dia 25 de maio, é preciso lembrar que a data guarda uma ligação simbólica com a luta por reconhecimento e justiça previdenciária. Remete ao dia do falecimento do ex-deputado Fernando Ferrari, parlamentar engajado na luta dos direitos dos trabalhadores rurais, como o Estatuto do Trabalhador Rural, um dos primeiros instrumentos de proteção social para o homem e a mulher do campo.

Esse legado se reflete no direito à aposentadoria rural, conferido aos segurados especiais: mulheres a partir dos 55 anos e homens aos 60, desde que comprovem 15 anos de atividade rural, ainda que em regime de economia familiar.

Aliás, a legislação também contempla a chamada aposentadoria por idade híbrida, uma modalidade da aposentadoria por idade urbana destinada a quem acumulou tempo de trabalho rural ao longo da vida, pois permite a junção desse tempo rural com o tempo urbano para o alcance dos requisitos legais da aposentaria por idade urbana.

Ou seja, 62 anos para mulheres e 65 para homens, desde que cumpridos 15 anos de contribuição, somando o tempo rural ao urbano, conforme regras para os segurados anteriores à Reforma da Previdência de 2019.

Garantir esses direitos, contudo, exige organização e prova documental robusta. Bloco de produtor rural, registros em sindicatos, contratos de arrendamento, certidões que mencionem a profissão de lavrador ou agricultor, histórico escolar em escola rural e declarações de associações são algumas das provas documentais essenciais para demonstrar a atividade rural, na medida em que a lei não traz um rol fixo de documentos, apenas alguns exemplos.

Esses documentos, porém, revelam uma realidade que vai além dos registros, na medida em que, por décadas, mulheres do campo foram invisibilizadas. Em muitos casos, as certidões identificam apenas o homem como lavrador, enquanto a mulher é registrada como “dona de casa”, apesar de seu trabalho diário e indispensável na roça. Essa desigualdade estrutural impõe desafios ao reconhecimento de seus direitos previdenciários.

Por isso, o Poder Judiciário tem sido orientado a julgar com sensibilidade e justiça. Nesse sentido, com importante aplicação na questão das trabalhadoras rurais, o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, publicado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) após a condenação do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Márcia Barbosa de Souza e outros vs. Brasil, reforça a importância de considerar o contexto histórico e social das mulheres rurais.

Diante de todo esse legado, cada dia de trabalho no campo representa mais do que esforço físico: é a construção silenciosa de um direito legítimo, forjado no suor, na resistência e na dignidade de quem sustenta o país com as próprias mãos.

Colheita do café, agricultura, agronegócio
Colheita do café. Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil

É tempo de afirmar, com clareza, que não há justiça social possível sem justiça previdenciária no campo. Celebrar conquistas históricas, enfrentar desigualdades persistentes e assegurar o futuro exige muito mais do que palavras de homenagem — exige compromisso real com informação, orientação e acesso a direitos.

Honrar o passado, proteger o presente e construir um futuro com dignidade exige mais do que reverência simbólica: exige ação concreta, informação qualificada e compromisso efetivo com o acesso à justice previdenciária.

Porque justiça no campo não é favor — é dever do Estado e direito de quem dedicou a vida à terra.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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