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Chuva no ES: solidariedade faz a vida possível em um mundo de carências

Capixaba mais uma vez se mobilizou diante da tragédia das chuvas no Sul do Estado. Nós brasileiros não temos muito desenvolvido o amor-próprio. Não nos elogiamos como povo.  Isso me parece injusto

  • João Gualberto
Publicado em 22/01/2020 às 11h21
Atualizado em 22/01/2020 às 11h53
A menininha levando doação de rodos para o caminhão em frente à Assembleia. Crédito: Reprodução de vídeo
A menininha levando doação de rodos para o caminhão em frente à Assembleia. Crédito: Reprodução de vídeo

A maior tragédia climática que presenciei no Espírito Santo foram as enchentes que ocorreram em 1979, nessa mesma época do ano. Baixo Guandu, Linhares e Colatina, no Vale do Rio Doce, foram as cidades mais atingidas. Mas as enchentes também chegaram à bacia do Rio Itapemirim, atingindo cidades como Cachoeiro e Castelo.

Cariê Lindenberg dedicou um de seus livros, "Pingos e Respingos", de 2005, à descrição da tragédia. Mas ele trouxe à luz também a enorme rede de solidariedade que se construiu em torno do episódio.

É dessa época a frase memorável do nosso então arcebispo, Dom João Batista: só o povo salva o povo. Em 2013, quando fortes chuvas também se abateram sobre nós, mais uma vez lá estava a população capixaba disposta ajudar, sendo solidária com os atingidos.

Nesse momento, vivenciamos mais uma vez o mesmo processo. Aí estão as fortes chuvas, o despreparo das cidades para lidar com elas, os alagamentos, os desabrigados, a dor. Mas também aí estão os voluntários, os abnegados de sempre com suas redes de ajuda. Nesses momentos trágicos surge sempre essa solidariedade forte, que também é marca desses eventos trágicos.

Nós brasileiros não temos muito desenvolvido o amor-próprio. Não nos elogiamos como povo. Antes, pelo contrário, gostamos de nos menosprezar e de nos sentir menos potentes do que somos. Isso me parece injusto.

Acho que nossa solidariedade nasce do mundo dos pobres, daqueles que não tem ao seu lado um Estado potente e preparado para ajudar a vencer as dificuldades do dia a dia. Existem redes inteiras de ajudas coletivas. As igrejas trabalham muito esse elemento.

Acredito que, sem o sentimento de solidariedade e de compartilhamento, a vida dos desfavorecidos pela fortuna no Brasil seria muito mais dura.

Nossas redes de solidariedade nascem desse sentimento profundo, se alimentam nesse imaginário das dificuldades compartilhadas. Por isso a vida se faz possível  em um universo de carências. Assim temos nosso sentido de coletividade alimentado. Assim somos brasileiros. Assim somos capixabas. Solidários.

O autor é doutor em Sociologia Política

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