Por décadas, a ausência de dados oficiais sobre pessoas com deficiência no Brasil foi um obstáculo silencioso, mas brutal, para a construção de políticas públicas eficazes. Com a divulgação dos dados do Censo 2022 pelo IBGE, o país dá um passo histórico: pela primeira vez, temos um retrato oficial da população com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
Os números não apenas revelam a dimensão da realidade que por tanto tempo ficou invisível, mas também colocam fim a discursos superficiais e preconceituosos que deslegitimam o autismo como “modinha” ou exagero.
De acordo com o levantamento, 14,4 milhões de brasileiros declararam ter algum tipo de deficiência, o equivalente a 6,7% da população nacional. No que se refere ao TEA, o Brasil contabiliza oficialmente uma parcela significativa da população que precisa de acolhimento, inclusão e respeito. Esse marco estatístico é mais do que um dado: é uma convocação à ação.
No Espírito Santo, os dados revelam 268 mil pessoas com deficiência, sendo mais de 51 mil diagnosticadas com autismo. Trata-se de milhares de histórias, famílias, desafios e potências que até então estavam à margem da atenção pública, política e institucional. Agora, com a oficialização desses dados, a invisibilidade não é mais uma desculpa.
Mas, afinal, por que esses números importam tanto?
Porque sem dados, não há política pública possível. Sem diagnóstico preciso da realidade, seguimos planejando no escuro, distribuindo recursos às cegas, sem foco e sem justiça. O dado é o começo de tudo: do planejamento eficiente à garantia de direitos, da cobrança por inclusão à criação de serviços públicos estruturados. Saber quantas pessoas são, onde estão e quais são suas demandas reais é o primeiro passo para transformar vidas.
Para a Federação das Apaes do Espírito Santo (Feapaes-ES), que há anos atua no fortalecimento da rede de apoio à pessoa com deficiência intelectual e múltipla, esses dados vêm como uma conquista coletiva, pois é com informação que se faz política séria, é com números que se constrói justiça social e é com compromisso que se transforma estatística em acolhimento.
O papel da Feapaes-ES, diante desse novo cenário, é claro: seguir como ponte entre os dados e a ação. Isso significa planejar atendimentos com mais precisão, buscar recursos com mais respaldo e exigir políticas públicas com mais contundência. É hora de transformar números em políticas, estatísticas em dignidade, e porcentagens em direitos assegurados.
O momento exige responsabilidade, mas também coragem. Exige que a sociedade pare de relativizar o sofrimento e os desafios enfrentados por pessoas com deficiência e, especialmente, pelas pessoas autistas e suas famílias.
Não se trata apenas de celebrar a existência dos dados, embora esse seja um avanço inegável, trata-se de garantir que eles não sejam engavetados, mas usados como instrumentos de transformação e de impedir que essa população siga sendo negligenciada, tratada como exceção ou problema. São milhões de brasileiros que pedem apenas o básico: respeito, acesso, oportunidades.
A invisibilidade agora tem número e a inclusão começa quando a invisibilidade termina.
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