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É auditor-fiscal da Receita Federal do Brasil. Delegado da Alfândega do Porto de Vitória - ALF/VIT

Brasil e México: caminhos opostos na produção de petróleo

Novos e significativos investimentos estrangeiros têm aportado no litoral brasileiro. Hoje as águas oceânicas do Brasil estão entre as mais ativas do mundo em projetos de exploração de petróleo e gás, em total contraste com o México

  • Douglas Costa Koehler É auditor-fiscal da Receita Federal do Brasil. Delegado da Alfândega do Porto de Vitória - ALF/VIT
Publicado em 09/01/2024 às 11h37

A política energética tem sido vista pelos observadores como um dos grandes diferenciais para o futuro das nações neste século. E o Brasil e o México, as duas maiores economias da América Latina, são encarados como paradigmas inversos quando se trata do assunto. Ao menos para o período de 2018 a 2022. Vejamos a história recente.

O México, apesar das suas enormes reservas, tornou-se um grande importador de gás dos Estados Unidos. Cerca de 60% do gás e 65% da gasolina consumidos vêm do vizinho ao norte. No passado os norte-americanos é que importavam petróleo do México.

O principal marco da política energética mexicana no século XX ocorreu em 1938, com a nacionalização da indústria petrolífera, tornada monopólio do Estado, único administrador do setor, que não só recebia os rendimentos do petróleo, mas também autorizava e controlava os investimentos e os níveis de endividamento da estatal Pemex.

As receitas geradas com esse único produto chegaram a responder por mais de 30% do orçamento, numa época em que o país era um dos maiores produtores mundiais. Hoje a produção está em queda. A indústria sofre com a falta de tecnologia, grandes déficits de investimento, alto endividamento, rigidez burocrática e o domínio de um sindicato com aversão a mudanças. O mais grave é que não se conseguia levantar investimentos para atingir níveis mais altos de competitividade.

Um bom exemplo se vê nas águas do Golfo do México. Na área norte-americana há uma profusão de empresas offshore produzindo grande quantidade de petróleo. Já no lado mexicano – geologicamente idêntico – quase nada era produzido. A Pemex não tinha caixa nem tecnologia para a exploração de águas profundas no Golfo, nem mesmo para desenvolver completamente suas reservas em águas rasas. A mesma coisa se pode dizer das promissoras reservas de xisto mexicanas.

O Partido Revolucionário Institucional dominou a política mexicana durante quase todo o século XX. Seus cânones políticos sempre foram uma mescla de nacionalismo e socialismo. Foi durante seu longo domínio que se estatizou a indústria petrolífera. Mas diante dos entraves insolúveis, o presidente Enrique Peña Nieto tentou estabelecer um consenso sobre a necessidade de reforma do setor.

Uma emenda constitucional de 2013 abria a possibilidade de investimento por empresas privadas mexicanas e estrangeiras. Seria o fim do monopólio da Pemex. Outras leis permitiram a competição pela perfuração de novos poços.

O resultado foi um influxo de investimentos e tecnologia. Iniciou-se a construção de novos dutos e usinas de energia. Começava a redução do custo da eletricidade, alavancando a competitividade do país.

Mas não foi o que aconteceu.

O crítico mais ferrenho das reformas era Andrés López Obrador, um conhecido ativista adversário de tudo que lembrasse liberalismo. Na sua terceira tentativa foi eleito presidente do México. Sua posse para um mandato de seis anos ocorreu um mês antes da de Jair Bolsonaro no Brasil.

A campanha eleitoral de Obrador criticava a “dependência”, slogan caro ao populismo latino-americano. Nos seus ataques contra a integração da economia global havia ecos dos anos 30 e da nacionalização original da indústria petrolífera. Décadas de crescimento baixo e alta inflação na América Latina eram esquecidos em prol de denúncias contra a globalização.

A sua principal meta era reverter a reforma energética. Para ele, a Pemex e a sua nacionalização são símbolos da soberania do país. Os investimentos já planejados de empresas locais e estrangeiras seriam “revisados” e o fluxo de novos projetos foi cortado. Outra mostra de seu estilo está em que a Pemex acrescentasse ao seu logo oficial a expressão “pelo resgate da soberania”.

Em contraste com o declínio mexicano, a produção de petróleo do Brasil mais que dobrou desde 2000, muito devido ao pré-sal. A legislação exigia que a Petrobras fosse a única operadora no pré-sal. Em contraste com a mexicana, a empresa brasileira tem muita experiência com águas profundas. Mas ainda assim seria uma meta muito ambiciosa a exploração exclusiva de todas as reservas do pré-sal. Uma tentativa solitária de exploração dispararia o endividamento da companhia.

Anna Nery
Navio-plataforma Anna Nery da Petrobras na Bacia de Campos. Crédito: Carlos Alberto Silva

Após 2016 o governo do Brasil mudou de direção quanto à política energética. Deu início a grandes reformas permitindo a empresas estrangeiras concorrerem para a operação no pré-sal. Como efeito, registrou-se um grande influxo de ideias, tecnologias e investimentos.

Reformou-se a previdência e abriu-se mais o país aos investimentos externos. A perspectiva de contas públicas relativamente saneadas e de novos marcos legais deram maior confiança no futuro econômico do Brasil.

No entanto, também vieram problemas. A dificuldade de aprovar legislação num Congresso dividido entre mais de 20 partidos e a pandemia, que atingiu o Brasil com uma força acima da média mundial, piorou muito o ambiente político. As dificuldades de compor blocos políticos e a crise provocada pela Covid-19 tornaram muito difícil levar adiante mais reformas no setor energético.

Contudo, ainda assim, novos e significativos investimentos estrangeiros têm aportado no litoral brasileiro. Hoje as águas oceânicas do Brasil estão entre as mais ativas do mundo em projetos de exploração de petróleo e gás, em total contraste com o México.

Como bem lembra Daniel Yergon em seu brilhante "O Novo Mapa", “quando se trata de política energética, o Brasil e o México são como dois navios que se cruzam na noite. A produção mexicana recuou ao nível de 1979, enquanto a brasileira está 80% maior do que a do México - e continua a crescer.” E acrescento, em 2023 a estatal mexicana contava com 126 mil empregados contra 45 mil da brasileira

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