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Publicado em 25 de julho de 2021 às 13:46
O envolvimento de funcionários homens em violência doméstica, principalmente quando o caso tem repercussão, vira polêmica e conta com ocorrência policial, tem levado empresas a decidirem pela demissão do agressor como forma de puni-lo economicamente pelo crime contra a vida de uma mulher.>
Embora não haja uma legislação específica, que permita a dispensa por esse motivo, as organizações preferem desligar esses empregados para não terem em seus quadros pessoas com condutas reprováveis e como forma também de passar a mensagem de que não vai mais tolerar ter colaboradores com perfil misógino e machista.>
As demissões, nesses casos, ocorrem sem justa causa, ou seja, sem que as empresas informem os reais motivos da dispensa, mesmo ficando subentendido que o desligamento ocorreu por conta do episódio de agressão a uma mulher com que mantém um vínculo, como esposa, namorada, amiga, familiares ou mesmo alguém desconhecido.>
Foi o que aconteceu com o DJ Ivis, demitido da produtora onde trabalhava após a divulgação de vídeos dele agredindo a ex-mulher, Pamella Holanda. As agressões ocorreram em frente a filha recém-nascida e de um outro homem, amigo do DJ. As consequências foram ainda maiores, como a suspensão do uso das músicas dele em rádios, boicote aderido, inclusive, pela Rede Gazeta (leia abaixo sobre isso).>
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"Não admito nem compactuo com nenhum tipo de violência, ainda mais com uma mulher. Nada explica, não tem explicação. Como todo mundo sabe o DJ faz parte da Vybbe, infelizmente, não tem como continuar com ele na nossa empresa”, afirmou o cantor Xand Avião. Além disso, plataformas de streaming retiraram os trabalhos de Ivis de suas programações. O músico está preso. >
O superintendente Regional do Trabalho no Espírito Santo, Alcimar Candeias, lembra que quando a empresa declara o motivo da dispensa, em caso de demissão sem justa causa, abre precedente para que esse trabalhador entre na Justiça pedindo indenização por dano moral. Com isso, geralmente, o motivo é velado, ou seja, o empregador prefere não esclarecer ao funcionário a real causa do fim do contrato.>
Alcimar Candeias
Superintendente Regional do Trabalho no Espírito SantoA juíza do trabalho Germana Morelo explica que não há punição na lei trabalhista relacionada à vida particular do empregado, incluindo casos de violência doméstica. A prática só é prevista, se o agressor for preso, e o processo já tiver sido trânsitado em julgado, não cabendo mais recurso. Sem ter condições de exercer suas atividades laborais, o homem pode ser desligado por justa causa, conforme explica a magistrada. >
“As empresas têm responsabilidade social e precisam desenvolver canais de conscientização para que mulheres que sofrem com a violência doméstica possam pedir ajuda ou fazer denúncia contra o agressor”, explica.>
de mulheres sofreram violência física, psicológica ou sexual em 2020
Por se tratar de demissão sem justa causa, não há estatísticas sobre a quantidade de homens despedidos por conta da violência. No entanto, o que se pode constatar é que esta tem sido uma conduta cada vez mais adotada pelas empresas país afora. A decisão pode estar atrelada a campanhas para a redução de índices de violência e de desigualdades de gênero.>
De maneira geral, os homens lideram o ranking de demissões pelo país. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia, mostram que dos 1.268.049 desligamentos, registrados na amostra de maio de 2021, 794.286 eram homens e 473.763 mulheres. No Espírito Santo, das 25.928 demissões, 17.221 eram de pessoas do sexo masculino. >
A presidente da Associação Brasileiras de Recursos Humanos, seccional Espírito Santo (ABRH-ES), Kátia Vasconcelos, avalia que as decisões das empresas são tomadas com bases éticas. Ela lembra que comportamentos comuns no passado, como a violência doméstica e o racismo, passam a não ser mais tolerados pelas organizações em tempo atuais, mesmo fora do ambiente corporativo. >
Kátia Vasconcelos
Presidente da ABRH-ESO advogado especialista em Direito Trabalhista, Guilherme Machado, complementa que a demissão de um agressor ocorre porque ele infringe uma cláusula social que está ligada à imagem da empresa. “Resumidamente, as organizações cobram de forma expressa no contrato de trabalho, um padrão de civilidade exigível e compatível ao cargo”, avalia.>
Já o advogado trabalhista Marcio Dell’Santo, do escritório Genelhu Advogados, acredita que a demissão por conta da violência doméstica não deve provocar um aumento das agressões domésticas. “Na verdade, o que se quer demonstrar com iniciativas como a adotada pela gravadora é justamente o contrário: o ato é tão reprovável que, além dos reflexos na esfera criminal, também podem atingir a vida profissional do agressor”, avalia.>
Dell’Santo pontua que existem dois projetos de lei em trâmite no Congresso Nacional, que visam, justamente, à alteração da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), para prever a demissão por justa causa em casos de prática de atos de violência contra a mulher.>
Um desses projetos é de autoria da senadora Rose de Freitas (PMDB-ES). A proposta da parlamentar, por meio do Projeto de Lei 96/2017, estabelece a demissão de condenados pelo crime de violência doméstica e familiar que reincidirem nesta prática. A iniciativa modifica o Código Penal, além das regras do trabalho.>
Dos agressores eram íntimos das vítimas
O empregado demitido por justo motivo não tem direito de receber o 13º salário, as férias proporcionais, o saque do FGTS, além da indenização da multa de 40% sobre o valor depositado no Fundo de Garantia, obrigatória em demissões sem justa causa. A legislação trabalhista também não garante o seguro-desemprego nesse tipo de demissão. >
“Creio que atingindo a atividade laborativa, levando ao reincidente a perda do emprego, do cargo ou da função pública levará ao agressor a refletir mais antes de praticar qualquer ato de violência”, reitera a senadora. >
O advogado trabalhista Felipe Loureiro acredita que a demissão de um homem violento pode ser tratada como uma lição perante à sociedade, principalmente em casos de grande repercussão. “A justa causa só pode ocorrer por má conduta dentro da empresa. O que acontece fora do ambiente corporativo vai depender de cada caso”, afirma Loureiro. >
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