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Publicado em 13 de junho de 2025 às 12:08
Pelo menos três mulheres são assassinadas todos os meses no Espírito Santo. Conforme dados do Mapa da Segurança Pública 2025, foram registrados 39 feminicídios ao longo do ano passado, o que equivale a uma taxa de 1,94 por 100 mil habitantes. Esse indicador coloca o Estado em 6º lugar no ranking nacional de casos, considerando o tamanho da população. É uma taxa, inclusive, superior à do Brasil — de 1,34. >
Divulgado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Mapa mostra, ainda, que houve um crescimento de pouco mais de 11% em números absolutos de feminicídio no Espírito Santo em 2024, quando comparados aos 35 casos contabilizados no ano anterior. Mas não se tratam apenas de números. São histórias interrompidas, como a de Iris, grávida de oito meses; de Natália, morta na frente da filha; e de Jacilene, atacada pelo próprio marido. >
"Esses dados mostram para nós a dificuldade que o Brasil e, particularmente, o Espírito Santo têm no enfrentamento à violência contra a mulher. É um grande desafio mudar a cultura existente na nossa sociedade", pontua a delegada Michelle Meira, da Gerência de Proteção à Mulher da Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp).>
Para ela, o país já conquistou alguns avanços, como uma discussão mais aberta sobre violência de gênero. Porém, ainda se mostra insuficiente diante das dezenas de casos registrados em cada Estado. >
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Regina Célia Almeida, cofundadora e vice-presidente do Instituto Maria da Penha (IMP) — organização nacional que atua no enfrentamento à violência contra a mulher —, avalia a necessidade de mudanças mais profundas, sobretudo porque, na maioria das vezes, o debate sobre essa prática criminosa se limita às capitais e regiões metropolitanas. E mais do que isso: ainda que as pessoas discutam o assunto, no dia a dia, persistem condutas que favorecem a violência doméstica e de gênero. >
O problema é crônico, cultural e, como observa Regina Célia, está até nas raízes de documentos jurídicos da história do Brasil. Por aqui, já se permitiu ao homem matar uma mulher, caso suspeitasse de traição. Pode-se dizer que se trata de uma legislação antiga, datada do século XVII, mas outra, de caráter semelhante, que falava em legítima defesa da honra, esteve em vigor até 2023.>
Regina Célia lembra ainda que a violência contra a mulher já foi considerada um crime de menor poder ofensivo e, numa legislação de 1995, quando a Lei Maria da Penha já estava em vigor, permitia que atos dessa natureza fossem punidos com penas alternativas em vez da prisão. Apesar de mudanças legislativas recentes, a ideia da mulher como propriedade do homem e, portanto, sem direitos está presente em diversos estratos da sociedade.>
"Outra coisa é o seguinte: temos a banalização dos crimes de violência contra a mulher por parte de gestores públicos, somada à mentalidade do machismo estrutural. Muitos gestores não contratam equipes técnicas que sejam hábeis no processo de atendimento, acolhimento e acompanhamento das mulheres em situação de violência nem dos autores do crime", ressalta. >
Na avaliação da vice-presidente do IMP, é preciso maior articulação dos diversos entes públicos — Estado, municípios, Judiciário, Ministério Público, Defensoria — para que o enfrentamento à violência contra a mulher, que numa escala de gravidade chega ao feminicídio, seja efetivo. Regina Célia diz que, se as ações não forem integradas, será difícil conseguir a redução dos indicadores, ou melhor, de vítimas. >
Outra ação indispensável é dentro das escolas. "São espaços fundamentais para a gente trabalhar a desconstrução desse machismo estrutural", frisa Regina Célia, acrescentando que essa é uma prática ainda pouco difundida nas unidades de ensino. Ela conta que, entre mais de 178 mil escolas públicas do país, menos de 1% têm iniciativas para discutir questões de gênero e violência. >
Para mudar essa cultura, que subjuga mulheres aos homens, a delegada Michelle Meira defende que estruturas, tanto públicas quanto privadas, mobilizem-se para a redução da violência. >
De iniciativas do poder público, a delegada destaca, entre outras ações, a patrulha Maria da Penha, que realiza visitas tranquilizadoras a mulheres em situação de violência; as Salas Maria, que contempla serviços sociais; e mutirões nas delegacias especializadas, para dar mais celeridade às investigações para punir agressores. Para eles também há uma estratégia, chamada "Homem que é Homem", visando conter a reincidência da violência de gênero. >
Vale observar que, nos cinco primeiros meses de 2025, houve uma oscilação para baixo nos feminicídios no Espírito Santo, com 14 ocorrências, enquanto no ano passado foram 15 no mesmo período, conforme dados do Observatório da Sesp. Nesse levantamento local, aparecem 38 feminicídios em 2024, um a menos que o Mapa devido a uma reclassificação da tipificação do crime praticado.>
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