Publicado em 29 de abril de 2025 às 18:38
Alguns meses atrás, no meu novo apartamento em Berlim, na Alemanha, meu vaso sanitário e eu entramos em guerra.>
Por mais que eu esfregasse, não havia produto de limpeza que conseguisse eliminar aquela camada de calcário acumulada dentro dele.>
Frustrada depois de tantas tentativas, recorri ao Google até encontrar uma página que recomendava o uso de vinagre – que, por sinal, o morador anterior havia deixado no apartamento em grande quantidade.>
Coloquei no vaso duas colheres de sopa cheias de Essigessenz (basicamente, vinagre concentrado) e mantive em repouso por meia hora. Esfreguei em seguida e a sujeira saiu instantaneamente.>
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Daquele dia em diante, passei a usar vinagre entusiasticamente para livrar meu mundo do calcário. Percebi até que ele é mais eficiente que o meu spray de limpeza habitual da cozinha para deixar minha pia brilhando.>
Faço o mesmo na torneira, que deixo embrulhada em papel-toalha embebido em vinagre, no lugar do meu spray de limpeza habitual.>
E, em vez de comprar pastilhas especiais para retirar a camada de calcário da minha chaleira de vidro, simplesmente despejo duas colheres de sopa de vinagre concentrado e coloco no fogo até ferver. Um agradável som escaldante acompanha os estalos dos resíduos no seu interior.>
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Fiquei imaginando se o vinagre teria outras vantagens. Será que ele também mata as bactérias e outros germes? E, o mais importante, um produto tão simples e natural como este seria melhor para o meio ambiente e para minha saúde do que os produtos de limpeza comuns?>
A internet está repleta de influenciadores especializados em sustentabilidade e blogs de limpeza verde que anunciam o vinagre como "pau para toda obra" – uma alternativa "verde" aos produtos de limpeza "tóxicos".>
As promessas parecem fazer sentido. Afinal, o vinagre é simplesmente álcool fermentado, usado há muito tempo para conservar alimentos, temperar saladas e na limpeza doméstica. Mas eu queria as evidências.>
Para isso, entrevistei três especialistas. E aprendi que algumas das orientações são corretas, mas os benefícios do vinagre dependem muito da forma de uso e do tipo de sujeira que você quer eliminar.>
O engenheiro químico Eric Beckman é professor emérito da Universidade de Pittsburgh, na Pensilvânia (Estados Unidos).>
Ele me tranquiliza, informando que o melhor emprego do ácido acético (o principal componente do vinagre) na limpeza é exatamente aquele para o qual venho usando: como desincrustante.>
O professor explica que o calcário – da mesma forma que a corrosão – consiste de certos íons que se dissolvem mais facilmente em líquidos ácidos, como vinagre. Beckman usa o vinagre para retirar calcário de espelhos.>
Já o microbiólogo Dirk Bockmühl, da Universidade de Ciências Aplicadas Rhine-Waal, na Alemanha, prefere usar suco de limão, que contém ácido cítrico. Ele defende que o limão é mais eficiente e seu aroma é melhor.>
Mas o vinagre não funciona bem para tudo.>
Beckman afirma que o sabão funciona melhor para remover o óleo dos pratos e o bicarbonato de sódio é eficaz para limpar os óleos processados que aderem às superfícies durante a preparação dos alimentos.>
Mas Beckman demonstra sua irritação quando o assunto é uma solução popular que mistura vinagre e bicarbonato de sódio. A mistura é quimicamente inútil, segundo ele, pois o ácido do vinagre e a base do bicarbonato, na verdade, cancelam um ao outro.>
"Uso os dois produtos, mas não juntos", explica Beckman. "Juntos, eles não resultam em nada.">
Embora o vinagre seja frequentemente indicado como poderoso antimicrobiano, a realidade não é tão clara assim, segundo Bockmühl.>
Em um estudo de 2020, ele e seus colegas testaram o vinagre contra uma série de bactérias, vírus e fungos causadores de doenças.>
Muitas recomendações na internet sugerem a adição de uma pequena quantidade de vinagre a um balde de água para limpeza. Mas Bockmühl descobriu que seus efeitos antimicrobianos só começam na concentração de 5% de ácido acético – a mesma do vinagre puro.>
Sua eficácia total só é atingida em concentrações destiladas de 10%, que receberam a adição de uma pequena quantidade de ácido cítrico pelos pesquisadores.>
Nestas condições, o produto eliminou cinco bactérias comuns (incluindo Escherichia coli e Staphylococcus aureus, além de um fungo, uma levedura e uma linhagem enfraquecida do vírus Vaccinia.>
Outros estudos também demonstraram que concentrações similares são eficazes contra o Sars-CoV-2, o vírus causador da covid-19.>
Mas mesmo estas concentrações não funcionaram contra a bactéria MRSA, uma linhagem especialmente persistente de Staphylococcus aureus, que resiste a certos antibióticos.>
Inúmeras outras bactérias ainda não foram testadas – e muitas delas se multiplicam em ácidos, segundo Beckman, incluindo as responsáveis pela fermentação de álcool para transformá-lo em vinagre.>
"Elas dizem 'oba, vinagre!'", destaca ele.>
Existem também fungos resistentes ao ácido acético e Bockmühl suspeita que também haja vírus resistentes ao vinagre, como os norovírus.>
Beckman afirma que o sabão é mais eficiente contra as bactérias e os desinfetantes padrão funcionam melhor contra vírus e fungos. E produtos agressivos, como a água sanitária, certamente matam de tudo, segundo ele, mas podem ser inseguros, se empregados de forma incorreta.>
Bockmühl destaca que, mesmo para os germes resistentes ao vinagre, é necessário aplicar concentração relativamente alta do produto.>
A concentração será insuficiente "se você simplesmente acrescentar uma colher de chá de vinagre à sua solução de limpeza", explica ele.>
Mas, quanto mais alta for a dose de ácido acético, mais irritação ele pode causar à pele, segundo o microbiólogo. E a substância é prejudicial em contato com os olhos.>
As superfícies também podem ser danificadas. O vinagre corrói a pedra natural e metais como cobre, bronze e latão, segundo o livro The Science of Cleaning ("A ciência da limpeza", em tradução livre), do químico italiano Dario Bressanini.>
Nas máquinas de lavar louças ou roupas, o vinagre pode danificar as borrachas usadas na vedação dos aparelhos. E também pode avariar cafeteiras e retirar o revestimento e o reboco dos ladrilhos, escreve Bressanini.>
Mas Bockmühl assegura que o vinagre pode ser usado em vidro e superfícies cerâmicas, como a do meu vaso sanitário, além de pias de aço inoxidável.>
Para ele, o problema de usar produtos de limpeza domésticos é que eles não vêm com instruções ou recomendações de segurança.>
"Eles podem ser seguros se você souber o que está fazendo", explica Bockmühl, "mas existem muitas recomendações realmente estúpidas e absurdas na internet.">
Para aprender mais sobre os riscos do vinagre à saúde, em comparação com os produtos de limpeza convencionais, entrei em contato com a professora de química aérea em ambientes internos Nicola Carslaw, da Universidade de York, no Reino Unido.>
Ela estuda como os produtos de limpeza prejudicam o ar nas nossas casas e construções.>
Sabemos que os profissionais de limpeza doméstica costumam sofrer maior incidência de asma do que outros grupos ocupacionais, mas é comprovadamente difícil indicar qualquer produto ou ingrediente isolado como responsável.>
Em um estudo recente, Carslaw e seus colegas testaram 23 produtos de limpeza diferentes, incluindo sabão líquido para máquina de lavar louças, detergente líquido e produtos em spray. Eles descobriram que muitos deles liberam compostos orgânicos voláteis (VOCs, na sigla em inglês).>
Alguns destes compostos, como terpenos, são frequentemente acrescentados para fornecer aromas agradáveis, como lavanda ou óleo de pinho. Mas eles são altamente reativos na atmosfera.>
Os terpenos, por exemplo, reagem facilmente com o ozônio do ar, criando partículas minúsculas. Geralmente, a inalação de partículas deste tamanho foi relacionada a doenças cardíacas e pulmonares.>
"O seu nariz é um filtro muito bom para as partículas grandes, mas as menores podem chegar aos seus pulmões e à corrente sanguínea", explica Carslaw.>
Curiosamente, ela concluiu no seu estudo que os produtos de limpeza vendidos como "naturais" ou "verdes" não parecem mais saudáveis neste particular.>
"Os produtos naturais/verdes continham a mesma quantidade de VOCs, ou até mais, que os limpadores padrão", segundo a professora. "E, em muitos casos, eles eram mais reativos.">
Já o vinagre consiste apenas de água e ácido acético, além de algumas outras substâncias que marcam a diferença entre o vinagre branco e o tinto, por exemplo. Por isso, "ele não será quimicamente tão reativo", explica Carslaw.>
Ela destaca que outra vantagem do vinagre é que ele é normalmente aplicado a um pano para esfregar as superfícies e não na forma de spray. E pesquisas demonstram que os produtos de limpeza aplicados na forma de spray podem causar mais efeitos prejudiciais para o sistema respiratório do que os líquidos e toalhas.>
"Quando você pulveriza algo, você transforma a substância em uma forma que é muito mais facilmente inspirada do que o líquido", afirma a professora.>
Por isso, ela sempre aconselha a usar luvas quando existe risco de contato com a pele, manter boa ventilação e evitar o excesso de limpeza, seja qual for o produto utilizado.>
Tudo isso me deixou com uma última pergunta: o vinagre é mais ecológico que os produtos de limpeza convencionais?>
Para Beckman, é difícil responder esta questão.>
Idealmente, deveria haver análises do ciclo de vida dos produtos de limpeza que acompanhassem os impactos da produção até o descarte, rastreando cada ingrediente até a sua fonte, como ele é produzido, transportado, embalado e eventualmente descartado.>
Mas muito poucas empresas fazem isso com cuidado, mesmo quando seus produtos são rotulados como "verdes", segundo Beckman. "Mas eu diria, sobre o vinagre, o seguinte: a força está na simplicidade.">
Os produtos de limpeza convencionais podem ser compostos de mais de uma dúzia de ingredientes diferentes. Muitos deles, segundo o professor, são fabricados de forma industrial, em processos que consomem energia.>
Já o ácido acético nasce da fermentação natural de álcool por leveduras. Este, por sua vez, vem da fermentação natural de açúcar.>
O maior impacto ambiental da produção de vinagre é a origem do açúcar – uvas, maçãs, cereais, batatas ou arroz. Ou seja, em grande parte, recursos renováveis.>
Bockmühl ressalta que isso se aplica apenas aos vinagres de fermentação natural, tipicamente vendidos como produtos alimentícios. Existem também vinagres sintéticos derivados de combustíveis fósseis, que trazem todo o impacto prejudicial ao meio ambiente da extração de petróleo e gás.>
Mesmo no final da sua vida útil, o vinagre causa poucos impactos.>
Muitos ingredientes do sabão são moléculas resistentes, que não sofrem biodegradação com facilidade. Às vezes, elas continuam a matar organismos no meio ambiente. Mas o vinagre se decompõe com rapidez, segundo Beckman.>
"O vinagre é aprovado em qualquer escala de sustentabilidade porque é simples e degradável", segundo ele.>
Depois de descobrir tudo isso, eu me sinto ainda melhor com o uso do vinagre.>
Provavelmente não vou ficar dependendo dele para livrar as superfícies de casa dos germes, mas vou continuar usando para remover depósitos de calcário – e estou ansiosa para testar no próximo objeto corroído que encontrar.>
Passei a tolerar o cheiro de vinagre com alegria, sabendo que estou usando um produto sustentável, provavelmente melhor para minha saúde.>
Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Innovation.>
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