Publicado em 14 de dezembro de 2025 às 07:44
O governo brasileiro teme um recuo da União Europeia a pouco mais de uma semana da data prevista para assinatura do acordo comercial entre o bloco e o Mercosul, previsto para o próximo sábado (20/12), em Foz do Iguaçu, durante a cúpula de chefes-de-Estado do Mercosul.>
A semana que vem será decisiva para o futuro do acordo porque ele precisará ser aprovado em duas votações, uma no Parlamento Europeu e outra no Conselho Europeu. As votações deverão acontecer entre a terça-feira (16/12) e quinta-feira (18/12).>
Duas fontes com conhecimento das negociações disseram à BBC News Brasil que se os europeus não assinarem o acordo agora, isso poderá representar o fim das negociações do tratado que vem sendo discutido há 25 anos.>
Na avaliação de uma delas, se isso acontecer, as chances de uma nova negociação entre os dois blocos é quase zero e o Brasil, maior economia do Mercosul, vai intensificar sua busca por parceiros comerciais na Ásia.>
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O acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia começou a ser discutido em 1999 e prevê a criação de uma área de livre-comércio entre os dois blocos. A ideia é que haja reduções recíprocas nas taxas de importação e exportação de produtos entre ambos, aumentando o fluxo comercial das duas regiões.>
Se concluído e entrar em vigor, o acordo criará uma das maiores áreas de livre-comércio do mundo, com uma população estimada em 718 milhões de pessoas e um produto interno bruto de 22 trilhões de dólares.>
Em 2024, a fase negocial do acordo foi finalizada, mas para começar a funcionar, o acordo ainda precisa passar por diversas fases, entre elas a assinatura, que é a que está prevista para a próxima semana.>
Para que o acordo seja assinado, é preciso que ele seja aprovado, agora, pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho Europeu, órgão que dá autorização à Comissão Europeia para realizar acordos comerciais.>
Na semana passada, a BBC News Brasil conversou com diplomatas europeus em Brasília e eles relataram que a aprovação do acordo pelo Parlamento não deverá encontrar dificuldades pois ela se dá por maioria simples, ou seja, metade dos eurodeputados mais um.>
O problema, eles relataram, está na votação do Conselho Europeu.>
Para que o acordo seja aprovado lá, é preciso maioria qualificada, o que significa ter o aval de pelo menos 15 dos 27 Estados-membros e que eles representem 65% da população do bloco. Atualmente, a população do bloco europeu está estimada em 451 milhões de habitantes.>
Dentro do Mercosul, bloco formado por Brasil, Paraguai, Uruguai, Argentina e Bolívia, há consenso para que o acordo seja assinado. Na Europa, porém, ainda há resistências para que ele seja concluído.>
No bloco, o acordo é fortemente apoiado por países como Alemanha, Espanha, Portugal e República Checa.>
Os principais países se opondo ao acordo atualmente são a França e Polônia, mas também há sinais de contrariedade entre países como a Bélgica e Áustria.>
Os franceses afirmam temer os impactos que o acordo poderia ter para os agricultores do país uma vez que eles sofreriam a concorrência dos produtos agropecuários do bloco sul-americano.>
Para vencer a resistência dos opositores, negociadores europeus criaram salvaguardas para o setor agrícola do bloco. As salvaguardas foram aprovadas no início desta semana Comitê de Comércio Internacional da União Europeia e prevêm que os europeus podem interromper as vantagens tarifárias aos produtos do Mercosul caso haja um aumento de 5% no volume dessas exportações em relação ao ano anterior.>
As salvaguardas também precisam ser votadas na semana que vem pelo Parlamento Europeu.>
O "fiel" da balança, avaliam diplomatas europeus ouvidos pela BBC News Brasil, deverá ser a Itália. O país tem aproximadamente 59 milhões de habitantes e é a terceira maior população do bloco europeu. Os cálculos da diplomacia brasileira e europeia apontam que uma negativa da Itália, somada à rejeição esperada de França e Polônia, poderia enterrar as chances de aprovação do acordo.>
Caso os italianos se juntem à oposição da França e da Polônia, os três países juntos equilavem a aproximadamente 36% da população do bloco, inviabilizando a aprovação do acordo.>
Na segunda-feira (8/12), no entanto, um diplomata italiano disse, durante uma reunião com colegas do bloco em Brasília, que o país iria apoiar a aprovação do acordo, mas o clima entre os demais era de cautela.>
Na avaliação de um auxiliar da Presidência da República ouvido em caráter reservado pela BBC News Brasil, um recuo europeu em relação ao acordo refletiria o que ele classificou como "fragilidade" das lideranças do bloco.>
Ele destacou que o acordo poderia fortalecer comercialmente os dois blocos, especialmente em um ambiente em que o multilateralismo estaria sofrendo ataques de líderes como o norte-americano Donald Trump.>
Ainda de acordo com esta fonte, uma rejeição do acordo pelos europeus também mostraria que eles prefeririam aceitar um acordo considerado por ele como "assimétrico" com os norte-americanos a firmar um tratado de livre-comércio mais favorável a eles com o Mercosul.>
A menção feita por ele foi sobre o acordo firmado entre os Estados Unidos e a União Europeia em agosto, após a imposição de tarifas pelos norte-americanos a produtos europeus, em que o bloco comercial se comprometeu a reduzir taxas para produtos oriundos dos Estados Unidos e ainda se comprometeu a adquirir petróleo, gás natural e produtos de defesa do país governado por Donald Trump.>
Para este membro do governo brasileiro, a saída para o Brasil e para o Mercosul diante do fracasso do acordo com os europeus seria a busca de novas parcerias em regiões como a Ásia.>
De acordo com dados do governo brasileiro, em 2025, a China já comprou US$ 94 bilhões em produtos brasileiros. Esse valor é mais que o dobro dos US$ 45 bilhões comprados pelos países da União Europeia.>
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