Publicado em 30 de maio de 2025 às 08:39
A secretária de Justiça do Reino Unido, Shabana Mahmood, está estudando uma possível "implementação nacional" da castração química para criminosos sexuais. Este procedimento reduz os níveis de testosterona com a intenção de reduzir a libido.>
A proposta é uma das recomendações apresentadas na recente revisão independente sobre condenações que foi encomendada para investigar a superlotação das prisões e considerar alternativas ao encarceramento.>
A análise constatou que 21% dos adultos que cumprem pena atrás das grades foram condenados por crimes sexuais, o que os torna uma proporção significativa da população carcerária. A ideia parece ser a de que a castração química tornaria a libertação dos infratores da prisão menos perigosa para a população.>
Um programa piloto de castração química voluntária já está em andamento — e prestes a ser ampliado para 20 prisões britânicas. Mas, embora a revisão tenha enfatizado que o consentimento é um princípio fundamental da legislação médica, Mahmood estaria investigando se a castração química pode ser obrigatória. Isso levanta importantes questões éticas e jurídicas.>
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A castração química é uma intervenção com dupla finalidade. Ela pode ser usada tanto para beneficiar aqueles que recebem substâncias redutoras de testosterona — os agressores sexuais podem achar que seus desejos sexuais são um problema, e querer, portanto, ter sua intensidade reduzida por meios médicos —, quanto para proteger a população.>
Uma questão fundamental, então, é o que pretendemos alcançar com um programa de castração química na população carcerária. A castração química pode reduzir o risco de reincidência, mas não melhorar a vida de um agressor sexual. E pode fazer o oposto — melhorar seu bem-estar sem proteger o público de suas ações. Qual é o objetivo que estamos buscando?>
Isso é importante porque a legitimidade ética da castração química está diretamente relacionada à sua finalidade. As intervenções médicas padrão são normalmente admissíveis do ponto de vista ético quando — e porque — se espera que elas beneficiem os receptores que consentem de forma considerada válida.>
Se o objetivo não for beneficiar o receptor, mas proteger o público, a questão é mais complicada. Normalmente, não temos que dar consentimento para ser encarcerados ou colocados em quarentena, por exemplo. Estas são situações impostas pelo Estado. Então, será que podemos ignorar o consentimento no caso da castração química para pessoas que estão presas?>
E, embora alguns criminosos possam preferir que seus desejos sexuais problemáticos sejam suprimidos, a castração química pode ter efeitos colaterais significativos, incluindo ganho de peso e mudanças de humor.>
Se a castração química de fato reduzir os desejos problemáticos, os agressores sexuais podem se beneficiar dela, apesar dos efeitos colaterais.>
Mas não está claro exatamente como esse "benefício" em potencial deve ser entendido. É benéfico para os agressores sexuais ter seus desejos sexuais atenuados? Evitar punições futuras conta como um benefício? Também pode ser benéfico para os criminosos que não consentirem com a intervenção? E será que é eticamente admissível fornecer castração química sem benefício para o receptor?>
Precisamos de uma compreensão mais claramente articulada do benefício, e da sua relação com o consentimento, para determinar quando a castração química é eticamente admissível.>
A finalidade também é importante para a justificativa legal. As intervenções que usam meios médicos — como a castração química — geralmente são legais, mais uma vez, porque se espera que beneficiem os receptores. Portanto, novamente, a falta de clareza sobre quem "se beneficia" e como o benefício deve ser entendido é um problema.>
Minha análise do arcabouço legal na Inglaterra e no País de Gales mostra que fornecer castração química a agressores sexuais pode ser consistente com as obrigações impostas às autoridades públicas do Reino Unido de acordo com a Convenção Europeia de Direitos Humanos (por meio da Lei de Direitos Humanos de 1998).>
Esse pode ser o caso mesmo sem o consentimento dos receptores, especialmente quando o objetivo é a proteção pública. Mas aqui também é necessário esclarecer como o benefício ou o dano estão relacionados ao consentimento.>
A implantação da castração química para agressores sexuais — seja voluntária ou obrigatória — também levanta dilemas éticos e legais para as pessoas que administram o programa.>
O psiquiatra forense Don Grubin disse que a administração da castração química é "a respeito de médicos tratando pacientes, em vez de médicos fazendo um trabalho para as agências de justiça criminal, mas um efeito colateral é que a reincidência provavelmente vai ser reduzida".>
No entanto, não está claro que a castração química deva ser sempre entendida sobretudo como "médicos tratando pacientes" da maneira que normalmente esperamos nas intervenções terapêuticas.>
A ideia de que os médicos, ao administrar a castração química, estão sempre agindo principalmente para beneficiar o receptor, e que a proteção pública na forma de redução do risco de reincidência é um mero efeito colateral, obscurece as questões éticas e legais em jogo.>
Uma abordagem melhor é esclarecer os diferentes valores e deveres em jogo — e como os médicos e outras pessoas envolvidas na prestação deste serviço devem colocá-los na balança.>
A castração química vai gerar, com frequência, deveres conflitantes, com os quais precisamos encontrar maneiras de lidar. É compatível com as obrigações profissionais realizar intervenções que não sejam do interesse clínico dos receptores, se isso beneficiar outras pessoas? As obrigações profissionais variam de acordo com a finalidade da intervenção?>
A castração química expõe tensões nas obrigações éticas e legais que os provedores individuais e institucionais têm com os receptores e com a sociedade.>
Estou analisando estas questões em uma pesquisa que investiga como devemos entender, avaliar e regulamentar intervenções com dupla finalidade. Estas são questões que o governo e aqueles que estão envolvidos na castração química de criminosos sexuais também precisam encarar de frente.>
* Lisa Forsberg é pesquisadora no Uehiro Oxford Institute, na Universidade de Oxford, no Reino Unido.>
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).>
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