Publicado em 28 de maio de 2025 às 12:39
O secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, afirmou nesta quarta-feira (28/5) que restrições de visto serão anunciadas contra autoridades estrangeiras que são "cúmplices de censura a americanos".>
"Por muito tempo, americanos foram multados, assediados e até processados por autoridades estrangeiras por exercerem seu direito à liberdade de expressão", disse Rubio.>
"Estrangeiros que atuam para minar os direitos dos americanos não devem desfrutar do privilégio de viajar para o nosso país. Seja na América Latina, na Europa ou em qualquer outro lugar, os dias de tratamento passivo para aqueles que atentam contra os direitos dos americanos acabaram.">
Até o momento, não foi anunciado quem são estas autoridades, mas, na semana passada, em audiência no Congresso americano, Rubio afirmou que o governo está analisando a possibilidade de aplicar sanções contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), com base na Lei Global Magnitsky.>
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Esta legislação permite punições a autoridades estrangeiras acusadas de corrupção ou graves violações de direitos humanos e tem aplicação global.>
Segundo o texto da própria lei, são consideradas violações graves atos como execuções extrajudiciais, tortura, desaparecimentos forçados e prisões arbitrárias sistemáticas ou por motivação política.>
A afirmação de Rubio veio em resposta a um questionamento feito pelo deputado republicano Cory Mills, da Flórida, sobre o tema. O parlamentar tem articulado com o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que está morando nos EUA.>
O Supremo Tribunal Federal (STF) abriu inquérito nesta segunda-feira, 26, para investigar o parlamentar, depois de a Procuradoria-Geral da República (PGR) enviar um pedido relacionado à sua atuação nos Estados Unidos contra autoridades brasileiras. >
Não há confirmação até o momento de que sanções serão, de fato, impostas contra Moraes. Mas o que elas significariam, na prática? >
Há três consequências principais para quem é colocado dentro da lista de sancionados da Lei Magnitsky:>
Esse último item é o que costuma causar maiores problemas às pessoas sancionadas pelos EUA, afirma Natalia Kubesch, advogada da Redress — entidade britânica que ajuda vítimas de tortura e abusos de direitos humanos em diversas partes do mundo — em entrevista à BBC News Brasil.>
Isso significa, por exemplo, que os cartões de crédito de Moraes podem ser cancelados — mesmo se emitidos por bancos no Brasil — já que as empresas de cartões Visa, MasterCard e American Express são americanas?>
Em tese, sim. Mas não necessariamente. Decisões como essa precisariam ser analisadas caso a caso pelas instituições financeiras. Kubesch afirma que há precedentes em que isso aconteceu.>
"A American Express anunciou no ano passado que havia encerrado contas de clientes [sancionados pela Lei Magnitsky]. Eles provavelmente tinham ligações com o governo do Irã, então a operadora encerrou completamente essas contas de clientes", diz a advogada.>
"Da mesma forma, em 2022, Visa, MasterCard e American Express bloquearam certos bancos russos de suas redes de pagamento após a imposição de sanções.">
E as contas de mídias sociais de Alexandre de Moraes? As sanções americanas poderiam forçar empresas baseadas nos EUA — como Google, Meta e X — a cancelarem as contas do juiz brasileiro?>
Kubesch afirma que existe uma "zona jurídica cinzenta" quanto a isso.>
"Ser sancionado não o proíbe de ter uma conta em uma rede social. E empresas como Twitter e o Facebook não necessariamente violariam as sanções ao permitir que alguém tivesse uma conta", diz a advogada.>
Isso porque vetar o acesso de uma pessoa a uma plataforma de comunicação de massa por causa de sanções seria visto por muitos como uma violação do seu direito à liberdade de expressão, diz Kubesch.>
"Mas existe uma área cinzenta porque contas em redes sociais podem ser usadas para permitir ou facilitar a potencial proibição de uma sanção, ou podem promover sua agenda específica", diz a advogada. >
"Há precedentes em que o Facebook bloqueou em 2017 contas do chefe da República Chechena da Rússia, patrocinado pelo Kremlin, depois que ele foi sancionado", ressalta Kubesch.>
"Há precedentes de plataformas de mídia bloquearam contas após a imposição de sanções, mas isso também pode, às vezes, ser uma abordagem proativa [das empresas de mídias sociais], em vez de ser uma violação direta, resultado da qual eles teriam que agir.">
A advogada diz que a inclusão de pessoas na lista de sanções pela Lei Magnitsky é "semilegal" e "semipolítico".>
"É preciso que a pessoa sancionada esteja envolvida em graves violações de direitos humanos, e esse é um teste legal que precisa ser cumprido. Agora, impor ou não uma sanção, no final das contas, fica a critério das autoridades governamentais relevantes.">
A especialista diz que o possível enquadramento de Alexandre de Moraes nas sanções pela Lei Magnitsky seria incomum, considerando como a lei costuma ser usada.>
"Essa pessoa [Moraes] provavelmente não seria passível de sanções sob as sanções Magnitsky no Reino Unido", diz Kubesch.>
"No Reino Unido, você só pode ser sancionado e sujeito às sanções Magnitsky se estiver envolvido em uma violação grave do direito à vida, do direito de não ser torturado e do direito de não ser escravizado. E nenhum desses casos se aplica aqui em particular, então ele não seria elegível para as sanções Magnitsky sob a lei do Reino Unido.">
Ela aponta que, sob o novo governo de Donald Trump, parece estar havendo mudanças nos critérios de inclusão ou exclusão da lista de sanções americanas.>
Recentemente, o governo americano retirou da lista colonos israelenses na Cisjordânia que estavam implicados em abusos de direitos humanos e uma autoridade do governo da Hungria que havia sido sancionado pelo governo do ex-presidente Joe Biden por corrupção.>
Aprovada durante o governo de Barack Obama, em 2012, a Lei Magnitsky foi criada para punir autoridades russas envolvidas na morte do advogado Sergei Magnitsky, que denunciou um esquema de corrupção estatal e morreu sob custódia em Moscou.>
Inicialmente voltada para os responsáveis por sua morte, a lei teve seu alcance ampliado em 2016, após uma emenda que permitiu a inclusão de qualquer pessoa acusada de corrupção ou de violações de direitos humanos na lista de sanções.>
Desde então, a lei passou a ter aplicação global. Segundo relatório semestral da Humans Rights First, organização sediada em Nova York, 69 pessoas foram sancionadas sob esta legislação no ano passado. A média tem sido de 75 por ano desde sua criação.>
Um estudo publicado em 2023 pelo International Lawyers Project analisou o impacto das 20 primeiras sanções da legislação. A pesquisa categorizou os diferentes tipos de impactos aos sancionados. Dentre eles estão:>
1) congelamento de bens e proibição de viagens nos EUA;>
2) instituições financeiras no exterior encerrando relações comerciais com o indivíduo alvo, mesmo sem uma obrigação legal;>
3) desenvolvimentos na jurisdição de origem, como investigações criminais ou processos judiciais contra o indivíduo mencionado, perda de emprego ou influência política do indivíduo alvo da sanção.>
Para o advogado e professor de direito da pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Jean Menezes de Aguiar, a sanção pode ser considerada "uma severa afetação financeira, já que o mundo ficou menor com a globalização", lembrando que, caso a pessoa punida tenha patrimônio nos EUA, teria que contratar um advogado no país para se defender e tentar reverter a situação, com todos os gastos envolvidos.>
Ele avalia que Moraes não se enquadra juridicamente nas possibilidades da lei e que, mesmo que haja a penalização, isso "em nada impactaria a legitimidade dos processos judiciais que ele é relator, nem daria às defesas qualquer direito de retirar do magistrado a condução dos processos.">
O professor ressaltou também que a lei americana não tem o poder de bloquear bens ou ativos no exterior. "Só quem pode fazer isso é o poder judiciário de cada país.">
Os casos citados pelo International Lawyers Project também apontam para desfechos distintos para os sancionados, nos EUA e em seus países de origem.>
Segundo o documento, a esposa do senador da República Dominicana Felix Ramon Bautista Rosario, sancionado por "envolvimento em atos de corrupção", tinha pelo menos duas empresas atuantes no país. >
Ele alegou, em um processo judicial, que administrar as empresas "tornou-se praticamente impossível em razão do congelamento de bens e da proibição de viagens impostas pelos EUA." Vistos americanos de dois filhos dele também foram cancelados e não renovados.>
Já o vice-presidente do Sudão do Sul Benjamin Bol Mel, sancionado em 2017 por supostos atos de corrupção, não teria sofrido "consequências significativas" em decorrência da punição. >
Segundo o relatório, "ele e empresas a ele relacionadas continuam a receber tratamento preferencial de autoridades de alto escalão do Sudão em um processo não competitivo.">
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