Publicado em 13 de maio de 2025 às 20:38
Na manhã de terça-feira (13/05), a imagem da região da Cracolândia esvaziada chamou a atenção. O cenário era atípico na rua dos Protestantes, na Santa Ifigênia — ponto que concentrava centenas de usuários.>
O esvaziamento da região no centro de São Paulo foi comemorado por autoridades como sinal de avanço nas ações integradas de segurança pública e assistência social.>
O vice-prefeito de São Paulo, Coronel Mello Araújo (PL), fez uma série de publicações no Instagram parabenizando a atuação de agentes da Guarda Civil Metropolitana (GCM) e demais forças de segurança na Cracolândia pela diminuição do "fluxo" de usuários de drogas.>
Nas publicações, o vice-prefeito afirma que "a imprensa está inconformada porque não há dependentes químicos" e que "estamos vencendo essa guerra".>
>
O secretário da Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, também comemorou as imagens nas redes sociais.>
"Quem já viu esse ponto da Rua dos Protestantes antes se impressiona com essa imagem de hoje", afirmou.>
"Prendemos as principais lideranças do tráfico de drogas no centro de São Paulo. Desmascaramos pensões e hotéis que serviam de pontos de distribuição de entorpecentes e para lavagem de dinheiro do PCC, que explorava o vício de dependentes químicos. A droga parou de chegar, fazendo com que o centro de São Paulo deixasse de ser um ponto interessante para a criminalidade." >
Já o prefeito Ricardo Nunes (MDB) se mostrou surpreso com as imagens. Quando questionado pela TV Globo sobre o "sumiço" do fluxo, ele disse que "ainda está tentando entender o episódio" e que não dá para dizer que o problema da Cracolândia está resolvido.>
"Surpreendeu a prefeitura. Mas, obviamente, a gente já vinha reduzindo gradativamente. Todos os dias vinha reduzindo a quantidade de pessoas lá. As pessoas indo para tratamento, voltando para os seus Estados, as pessoas aceitando a internação", diz o prefeito, que também mencionou como possíveis a demolição de imóveis na favela do Moinho.>
>
Movimentos que acompanham a situação da região há anos, como o Craco Resiste, contestam a narrativa oficial.>
O atual "fluxo" ficava em uma área entre as ruas dos Protestantes e dos Gusmões, cercadas por um muro de cerca de 40 metros de extensão, construído pela prefeitura em janeiro deste ano. Na época, a Defensoria Pública afirmou que o local era um "curral humano".>
"Essa história de 'sumiço' é uma grande mentira. O que desapareceu aqui foram os direitos", afirma Marcel Segalla, integrante da Craco Resiste, que respondeu à BBC News Brasil enquanto estava no local. Segundo ele, usuários continuam dispersos na região central.>
"As pessoas estão sendo espancadas e empurradas como animais, de um lado para o outro. Estamos localizando essas pessoas — elas estão nas esquinas, nas calçadas, ainda no território, mas agora apanhando da PM, da GCM e da polícia civil. É muita viatura, muito dinheiro público gasto nesse aparato absurdo de repressão", diz.>
"É uma repetição do que vimos em 2012. A lógica da pancada, que impede as pessoas de dormir, de permanecer, de circular livremente. Isso é violação do direito de ir e vir", afirma. >
A crítica remete a uma operação deflagrada em janeiro de 2012, que ficou conhecida como "Operação Dor e Sofrimento" e também dispersou usuários à força na gestão de Gilberto Kassab.>
"Estamos andando pelas ruas e ouvindo muitos relatos de abusos — agressões com cassetetes no rosto, especialmente pela GCM, que parecem ter recebido orientação para isso. Também chegaram denúncias de internações forçadas, com pessoas sendo colocadas à força em vans e levadas para os Caps AD, sem qualquer consentimento", afirma Segalla.>
Outro relato é que profissionais da assistência social e da saúde não conseguiriam mais localizar pacientes que acompanham. Tratamentos estariam estão interrompidos porque os técnicos não conseguem entregar medicamentos.>
"O Poder Executivo vem fazendo pressão e usando de truculência há muito tempo para dispersar os usuários", afirma a psicóloga Maria Angélica Comis, coordenadora da Rede Brasileira de Redução de Danos e Direitos Humanos.>
"De fato, quando há esse tipo de dispersão fica muito difícil achar as pessoas que dão acompanhadas, então terá grande impacto, principalmente para quem trata tuberculose e HIV." >
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo afirma que tem atuado na região de forma multisecretarial, em conjunto com a Prefeitura, "para combater a criminalidade, principalmente o tráfico de drogas, requalificar vias, e oferecer apoio e uma saída viável aos dependentes químicos".>
"A Polícia Civil realiza investigações constantes que têm resultado na apreensão de entorpecentes e na identificação de integrantes de organizações criminosas. Já a Polícia Militar mantém o policiamento ostensivo com reforço de efetivo e emprego de equipes especializadas, atuando em pontos estratégicos", afirmou a pasta.>
A Secretaria também disse que medidas de segurança são executadas em conjunto com ações da Secretaria Estadual de Saúde e da Secretaria de Desenvolvimento Social.>
"Esse conjunto de ações permitiu a diminuição crescente do número de dependentes químicos na região e a requalificação de vias que antes eram tomadas pelo fluxo", diz a pasta.>
Movimentos contestam a versão oficial. "A narrativa de que o tráfico foi "estrangulado", de que uma ação no Moinho mudou a lógica da distribuição de drogas, também é mentira. As pessoas seguem usando crack nas calçadas. O que houve foi uma dispersão — mais do mesmo", finaliza Segalla.>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta