Publicado em 30 de março de 2025 às 21:44
Sentado em uma cafeteria na baía de Marfa, em Malta, Colin Backhouse observa um pedaço de terra minúsculo no horizonte.>
Trata-se da ilhota de Comino, uma laje rochosa de 3 km por 5 km cozida pelo sol, rodeada pelo mar cintilante, com coloração que varia do azul-marinho até o brilhante turquesa.>
Antigamente, Comino era um paraíso quase vazio. Agora, é um dos destinos turísticos mais disputados do arquipélago maltês.>
Com mais de 51 mil seguidores na sua página popular no Facebook, Malta Holiday Experiences, Backhouse dedica seu tempo a recomendar os melhores pontos para explorar pelas ilhas maltesas. Mas existe um lugar que ele se recusa a indicar.>
>
"É maravilhoso nesta época do ano", afirma ele, apontando para a ilhota sem carros, localizada entre Malta e a ilha de Gozo. "Mas no verão? Não tem dinheiro que me pague para chegar perto. É o inferno na Terra.">
A Lagoa Azul de Comino atrai dezenas de milhares de visitantes de todo o mundo, todos os anos. O local é o sonho dos fotógrafos e um dos destinos mais espetaculares do Mediterrâneo.>
O tom vívido da baía, gerado pela luz solar que reflete o leito marinho de calcário branco, cintila sob o sol do Mediterrâneo, formando uma paisagem perfeita para fotos exuberantes.>
Na baixa estação de dezembro a fevereiro, as águas da baía permanecem pouco agitadas, exceto pelo suave murmúrio das gaivotas aterrissando. A costa é silenciosa e intocada.>
Mas, no verão, a história é outra. Multidões disputam ombro a ombro os espaços disponíveis. Os resíduos transbordam dos cestos de lixo superlotados e ficam emaranhados entre os arbustos de roseiras pisoteados. Barcos a motor saem lançando músicas ao vento, queimando gasolina e deixando para trás um rastro de danos ambientais.>
Backhouse relembra o tempo em que Comino parecia um refúgio isolado.>
"Visitei pela primeira vez em 1980", ele conta. "Naquela época, você conseguia ter todo o lugar para si próprio. Infelizmente, observei pessoalmente a destruição ao longo das décadas. Realmente, não sei por que as pessoas ainda se importam com a ilha.">
E Backhouse não é o único a manifestar este sentimento. A frustração com o turismo excessivo em Comino vem crescendo há anos e alguns visitantes desiludidos chegam a chamar a viagem de um dia a partir de Malta de scam (golpe).>
Os barcos superlotados, poucas diversões e a degradação ambiental cada vez maior aumentaram as pressões para que as autoridades tomassem providências.>
Em resposta, surgiram os ativistas.>
Em 2022, um grupo local chamado Moviment Graffitti tomou para si o desafio, retirando da ilha suas cadeiras de praia e espreguiçadeiras. Eles protestavam contra o que consideravam exploração do espaço público para lucro privado.>
Sua mensagem era clara: Comino deveria ser protegida e não usurpada.>
A ascensão da ilha para se tornar um destino dos sonhos é um processo interessante.>
Comino serviu de cenário para filmes e séries como O Conde de Monte Cristo (2002), Troia (2004) e rapidamente em Game of Thrones (2011-2019). Com isso, a Lagoa Azul passou a ser uma conhecida joia cinematográfica.>
Mas as redes sociais fizeram a popularidade da ilha disparar. Suas águas cintilantes e surreais começaram a atrair visitantes de todo o mundo, em busca da foto perfeita.>
"Ela está no topo da lista de desejos de muitos visitantes que chegam às ilhas maltesas", conta Rebecca Millo, chefe de marketing e comunicação corporativa da companhia aérea nacional KM Malta. "Muitas pessoas simplesmente querem ir direto para lá.">
Mas as mudanças, finalmente, estão chegando.>
Comino foi incluída na rede de áreas protegidas da União Europeia chamada Natura 2000. E, neste ano, em uma medida para frear o turismo de massa e aliviar a pressão sobre a ilha, as autoridades maltesas estão fixando um limite diário de visitantes.>
O número de visitantes de barco será reduzido de 10 mil para 5 mil por dia. Este é um passo significativo na direção certa. Mas, para ativistas ambientais como Mark Sultana, CEO (diretor-executivo) da organização BirdLife Malta, é uma solução apenas parcial.>
Para ele, "limitar os números é um bom começo. Mas precisamos de um plano público de sustentabilidade que não se concentre apenas no controle das multidões, mas sim na preservação do frágil ecossistema de Comino.">
"Defendemos que é preciso haver um sistema de controle de ingressos que permita apenas a emissão de um número limitado de bilhetes diários", destaca Sultana.>
Este tipo de dificuldade não é exclusivo de Comino. Em todo o Mediterrâneo, os governos estão restringindo as regulamentações para combater o turismo excessivo.>
Veneza, na Itália, começou a cobrar entrada de turistas de um dia e Atenas, na Grécia, impôs limites ao número diário de visitantes na Acrópole. Estas medidas sinalizam uma mudança mais ampla rumo a um turismo mais sustentável.>
A guia de turismo Joanne Gatt, da Seasoned Malta, ouve uma queixa recorrente dos turistas: visitar a ilha minúscula não é a experiência que eles contrataram.>
"Eles vão para Comino esperando o paraíso e saem de lá decepcionados", ela conta. "Superlotada e caótica. Tomara que o limite de visitantes faça realmente a diferença.">
Com as novas regulamentações em vigor, a esperança é que Comino possa recuperar parte do seu charme perdido, oferecendo uma experiência mais agradável e protegendo seu ecossistema. Mas algumas pessoas acham que o dano já está feito.>
"Com tantas pessoas deteriorando a ilha, ano após ano, só espero que sobre alguma coisa para as gerações futuras poderem desfrutar", conclui Gatt.>
Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Travel.>
>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta