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Um ano depois da delação da JBS, governo trava luta pela sobrevivência

Um ano depois da delação da JBS, governo trava luta pela sobrevivência

Corrupção exposta por empresário mudou agenda de Temer, que se viu obrigado a gastar seu capital político para barrar série de denúncias

Publicado em 17 de maio de 2018 às 10:16

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O presidente Michel Temer. (Alan Santos/PR)

Na noite do dia 17 de maio do ano passado, o presidente Michel Temer e o ministro Antonio Imbassahy (Secretaria de Governo) discutiam com governadores do Nordeste um alívio na dívida dos estados em troca de ajuda na conquista de votos para a reforma da Previdência. Foi quando dois assessores presidenciais entraram abruptamente na sala.

Geralmente discretos, o secretário de comunicação, Márcio de Freitas, e o secretário de imprensa, Luciano Suassuna, acenavam de forma insistente para Imbassahy. Contrariado, o ministro foi até os assessores, que lhe mostraram a notícia publicada às 19h30m no site do GLOBO, em reportagem de Lauro Jardim e Guilherme Amado. Imbassahy, então, deu a volta na mesa e cochichou no ouvido do presidente:

— A reunião tem que acabar agora! — alertou.

Temendo não ter sido compreendido, fez questão de repetir a frase. Temer compreendeu que algo grave se passava. O presidente encaminhou o fim da conversa. Foram quase dez minutos ainda entre despedidas e fotos com os governadores. Já sem a presença dos convidados, Temer finalmente foi apresentado às acusações que mudaria o rumo do governo.

Ali começava a nova jornada. A gravidade dos fatos revelados pela reportagem fez com que o Planalto passasse a travar uma luta pela sobrevivência, que perdura até hoje. O primeiro ato foi rememorar o encontro com o empresário Joesley Batista no Jaburu. Visivelmente transtornado, Temer garantia que jamais dera aval a uma “compra” do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha e dizia lembrar, vagamente, que tinha se falado algo sobre a família do ex-parlamentar.

Duas horas após a notícia, Temer divulgou uma nota curta negando ter solicitado pagamentos a Cunha. No meio da tarde do dia 18, fez seu primeiro pronunciamento.

— Não renunciarei — bradou o presidente, alvo de duas denúncias, uma por corrupção e outra, por obstrução de Justiça e organização criminosa.

A partir daquele momento, o capital político do presidente, fortalecido pela liderança na articulação para depor Dilma Rousseff, passou a ter outra função. Imagens divulgadas do seu ex-assessor, o deputado Rocha Loures, correndo com uma mala de dinheiro nas ruas de São Paulo agravaram ainda mais o cenário.

Antes dedicado integralmente à agenda das reformas, Temer passou a ser consumido pela busca de votos para enterrar as denúncias de corrupção no plenário. Na semana anterior à revelação das gravações de Joesley, o presidente celebrava um ano de governo. Tentava vender uma imagem de “reformista”. O foco era todo voltado para a economia. O governo tinha conseguido aprovar a PEC do Teto, limitando o crescimento dos gastos públicos. A reforma trabalhista já tinha passado pela Câmara e avançava no Senado. A reforma da Previdência tinha superado a comissão especial, e o calendário previa votação em junho.

CARGOS, OBRAS E EMENDAS

A sobrevivência virou pauta única. Presidente da Câmara por três vezes, Temer conhece o Legislativo como poucos. Sabia que precisava atuar em dois campos para conseguir evitar que 342 deputados votassem para autorizar o Supremo a processá-lo. O discurso da continuidade era necessário. Mas o essencial era manter a base satisfeita com a moeda típica da coalizão: cargos, emendas e obras nas bases dos parlamentares.

— Paralisou tudo. Eu compreendi, de imediato, que a negociação da reforma da Previdência acabou. Só voltei a tratar alguma coisa de reforma de novo depois da segunda denúncia — reconheceu o deputado Beto Mansur (PRB-SP), um dos mais relevantes articuladores de Temer na Câmara.

O cenário era extremo. Dois ministros chegaram a sondar um cacique do PSDB com a ideia de derrubar Temer. Abatidos pelas fortes acusações contra Aécio Neves (PSDB-MG), os tucanos mais graúdos resistiram. Com o tempo, o partido rachou. Legendas balançaram. A estratégia do grupo de Temer foi atuar no varejo e conquistar o coração do baixo clero.

Vendo o governo nas cordas, os deputados enxergaram uma oportunidade de conseguir benesses na véspera do ano eleitoral. Um ministro conta que, entre as demandas, houve quem solicitasse a aprovação de uma obra de R$ 300 milhões.

— Teve muito pedido fora da realidade. E a gente tinha que ir contornando — conta, sob a condição do anonimato.

Os ministros políticos pressionavam a área técnica pela liberação de emendas. Em junho e julho foram empenhados R$ 4,2 bilhões, mais de 60% do previsto para o ano. O ritmo caiu em agosto para R$ 200 milhões, depois que, no dia 2 daquele mês, Temer venceu a primeira batalha. Entre setembro e outubro, quando a segunda acusação foi rejeitada no dia 25, o governo empenhou mais R$ 900 milhões.

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Vencidas as duas batalhas, Temer já havia empenhado capital político demais para exigir do Congresso a aprovação da impopular reforma da Previdência. Houve até articulações para tentar ressuscitar o tema. Mas com a intervenção do Rio, o assunto foi sepultado. Só as investigações que não sucumbiram.

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