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Naufrágio: réus atacam principal prova da operação no 1° dia de julgamento

Naufrágio: réus atacam principal prova da operação no 1º dia de julgamento

Quatorze advogados foram ouvidos nesta quarta-feira (21) durante sessão no STJ; julgamento do maior escândalo da Justiça do ES havia sido adiado 27 vezes

Publicado em 21 de maio de 2025 às 22:33

Sessão da Corte Especial do STJ, durante julgamento da Operação Naufrágio
Sessão da Corte Especial do STJ, durante julgamento da Operação Naufrágio Crédito: Reprodução/ YouTube STJ

Quatorze advogados foram ouvidos no primeiro dia de julgamento da Operação Naufrágio, na Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), nesta quarta-feira (21). Foram pouco mais de seis horas de sessão com a apresentação das defesas dos 15 réus na Ação Penal 623, que trata os fatos apurados durante a operação deflagrada no Espírito Santo em novembro de 2008 e considerada o maior escândalo de corrupção registrado no âmbito do Poder Judiciário capixaba.

São 16 anos transcorridos desde o início das investigações, que envolveram desembargadores, juízes, advogados e empresários do Estado. Nesse período, o julgamento foi adiado 27 vezes, de acordo com levantamento de A Gazeta

O julgamento começou por volta das 10h30, com intervalo entre meio-dia e 14h30. A defesa dos acusados compareceram à sessão plenária de maneira presencial e virtual. De maneira praticamente unânime, os advogados lançaram fortes críticas à principal prova juntada pela Polícia Federal (PF) e pelo Ministério Público Federal (MPF) nos autos: interceptações telefônicas que revelariam um suposto esquema de negociação de decisões judiciais, fraude em concurso público e loteamento de cartórios.

Na época das investigações, as escutas foram autorizadas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). As gravações, que se tornaram conhecidas, mostraram, por exemplo, diálogos em que um dos desembargadores presos receberia dinheiro para beneficiar um prefeito do interior, tratamento entre os envolvidos como "papa", "cardeal" e "Deus" e uma citação a "98 pedaços de bolo". Na denúncia, o Ministério Público Federal identificou os “pedaços de bolo” como referência a pagamento de vantagens indevidas.

A última sustentação oral que seria feita antes da leitura do voto do ministro Francisco Falcão, relator do processo, foi remarcada para a sessão de 4 de junho. O motivo foi o "cansaço" alegado pelos ministros do STJ.

Após 16 anos e mais de 20 adiamentos, caso tem 15 réus e começou a ser julgado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) no dia 21 de maio

NAUFRÁGIO | ENTENDA AQUI TUDO SOBRE A OPERAÇÃO 

Quem abriu a fase de sustentações no plenário do STJ foi o defensor público da União Felipe Dezorzi, representando o réu Jonhnny Estefano Ramos. Ele é apontado pelo Ministério Público Federal (MPF) como integrante do grupo de advogados que negociava decisões no Judiciário mediante o pagamento de vantagens indevidas.

O defensor disse entender que as provas juntadas ao processo baseiam-se unicamente em interceptações telefônicas incapazes de comprovar a participação do advogado no suposto esquema denunciado na Operação Naufrágio. 

"Muito embora a acusação tenha ressaltado a existência de provas documentais, na verdade tudo se baseia em interceptações telefônicas, que são um meio de investigação e não um fim em si. A interpretação de conversas telefônicas é uma tarefa repleta de subjetividade. A ausência de elementos visuais ampliam a possibilidade de erros interpretativos e flerta com a condenação com uma mera suposição", alegou.

Na sequência, a defesa de Larissa Pignaton Pimentel, atualmente juíza aposentada do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), fez sua sustentação afirmando que a ex-magistrada, nem sequer é citada de maneira clara na denúncia. Ela é acusada no processo de integrar um esquema de corrupção conduzido pela família de Frederico Pimentel, então presidente do TJES e também investigado na operação, com quem era casada. 

"Venho a essa tribuna com o peso de defender uma mulher acusada de crimes que cometeu, em uma ação penal com base em suposições frágeis", disse o advogado Valter Ferreira Xavier.

O advogado Eugênio Aragão, que faz a defesa de Larissa  Schaider Pimentel Cortes, disse no plenário do STJ que a ré sempre teve conduta ilibada e a denúncia do MPF possui elementos frágeis para servirem como prova de ilícitos supostamente praticados por sua cliente. Ela, que é servidora do TJES, é apontada como integrante do suposto esquema conduzido por seu pai, Frederico Pimentel. 

"Ela não pode ser acusada somente pelo fato de ser Pimentel. A peça documental é extremamente frágil, baseada apenas em dois diálogos", alegou Aragão.

Cláudio Rodrigues Neto fez sustentação oral em defesa do também advogado Felipe Sardenberg Machado. Na ação, é informado que Machado foi designado titular do Cartório do 1º Ofício de Cariacica por meio de suposto pagamento de vantagens indevidas. Em troca, teria permitido que a família Pimentel tivesse o controle da contabilidade e rateio dos lucros, à época.

Segundo a defesa de Felipe Machado, no entanto, seu cliente não teria corrompido ninguém visando à troca de favores pessoais. Rodrigues também criticou as interceptações juntadas pelo MPF como prova no processo. "Contra o Felipe não há qualquer prova de que ele tenha oferecido valores para assumir o cargo", disse.

A sustentação oral em defesa dos empresários Pedro Scopel e Adriano Scopel, pai e filho, respectivamente, foi feita pelos advogados Henrique Zumak, Marco Antônio Gama e Marcelo Leal. Eles falaram em plenário durante 1h30. Na ação, os empresários são acusados de oferecerem vantagens indevidas a magistrados capixabas em troca de decisões judiciais. 

Para a banca de advogados que defende os empresários, "a acusação contra eles está baseada exclusivamente em interceptações telefônicas interpretadas de maneira enviesada".

O mesmo apontou o advogado Carlos Guilherme Macedo Pagiola, que fez a defesa de Bárbara Pignaton Sarcinelli, ex-servidora do TJES acusada de manipular sorteio de distribuição de processos no tribunal capixaba. O objetivo, de acordo com o MPF, seria direcionar as ações a magistrados que pudessem proferir decisões de casos previamente negociados. Diretora do setor de processos da Corte estadual, ela foi demitida do cargo em 2009.

Durante a sustentação oral, Carlos Guilherme afirmou que as interceptações telefônicas juntadas ao processo pelo MPF estão repletas de "interpretações tendenciosas. Também acrescentou não haver na denúncia nada que comprove conduta ilícita de Bárbara. 

As interceptações feitas pela PF e usadas na denúncia pelo MPF também foram alvo de críticas da defesa do casal Dione Schaider Pimentel Arruda e Henrique Rocha Martins Arruda. Filha de Frederico Pimentel, Dione e o marido são acusados de integrar o esquema que beneficiava a família do ex-presidente do TJES, por meio da criação viciada de serventias judiciais. "Nas interceptações não há nada que ligue a Dione ou o Henrique à criação de cartórios", disse defesa dos réus.

Frederico Luis Schaider Pimentel fez defesa própria no plenário do STJ. Ex-juiz e advogado, ele também é filho de Frederico. Acusado de interferir na distribuição de processos na Corte estadual em troca de vantagens pessoais, ele afirmou, nesta quarta-feira (21), que a denúncia não traz elementos suficientes para comprovar sua participação em atos de corrupção.

O mesmo discurso com críticas ao uso de interceptações telefônicas como prova na ação foi usado pelas defesas do desembargador Robson Luiz Albanez, do advogado Gilson Letaif Mansur e do ex-servidor do TJES Leandro Sá Fortes.

VEJA ABAIXO OS RÉUS NA AÇÃO E AS ACUSAÇÕES QUE PESAM CONTRA ELES:

A defesa de Gilson Letaif, apontado como integrante do grupo de advogados que supostamente usava de influência para negociar decisões no TJES, disse durante a sustentação, que o réu não tinha poder de influenciar em quaisquer decisões da Corte, uma vez que à época dos fatos era recém-formado. “Não há ligação entre Gilson e o juiz Robson. Ele era apenas um advogado ordinário (comum), sem poder de decisão”, disse o advogado Felipe Fernandes Carvalho. 

A advogada Maria Patrícia Vanzolini defende Leandro Sá Fortes, acusado de integrar esquema conduzido pela família Pimentel. Em sua fala em plenário, ela sustentou que Leandro não cometeu as ilegalidades citadas na denúncia do MPF, bem como “as provas baseadas em interceptações são frágeis” para manter as acusações.

O advogado de Paulo Duque, Hércules Cipriano Pessini, alegou que as provas juntadas na denúncia não são, segundo ele, suficientes para culpar o também advogado, filho do então desembargador Elpídio Duque, da prática de negociação de decisões judiciais. “Não há provas contra ele”, afirmou.

O advogado Délio Fortes Lins, que defende o desembargador do TJES Robson Luis Albanez, acusado de negociar decisão judicial em troca de influência para ascender ao posto de membro do Pleno da Corte estadual, afirmou que as acusações contra ele são “são um arremedo de situações jogadas no mesmo balaio”.

A defesa da ex-servidora do TJES Roberta Schneider Pimentel não fez sustentação oral. Filha de Frederico Pimentel, ela é acusada de receber parte dos lucros com a criação irregular do Cartório do 1º Ofício de Cariacica.

O Ministério Público Federal foi procurado pela reportagem de A Gazeta, mas informou que vai se posicionar apenas por meio da ação penal. A Polícia Federal também foi procurada para responder às críticas às interceptações telefônicas, mas não houve retorno.

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