> >
Lava Jato teve papel decisivo nas eleições

Lava Jato teve papel decisivo nas eleições

Pesquisador mostra o impacto da operação na escolha do presidente

Publicado em 29 de abril de 2019 às 00:19

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura

Para entender a eleição de 2018, que alçou Jair Bolsonaro (PSL) ao posto de presidente do Brasil, Adriano Oliveira, cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), foi buscar no cruzamento de dados as respostas para montar o quebra-cabeça eleitoral.

Ao comparar pesquisas de opinião pública com a incidência de prisões e de conduções coercitivas da Operação Lava Jato que foram veiculadas na imprensa, o professor confirmou algo sobre o qual muito se discute no meio político, mas que até então não havia sido comprovado matematicamente: o poder de influência da operação anticorrupção sobre o comportamento dos eleitores e, consequentemente, sobre o resultado do pleito.

“O que me surpreendeu foi a intensidade da Lava Jato, como ela moveu uma opinião pública contrária ao PT”, destacou Oliveira.

O contexto que transforma a Lava Jato em um fenômeno chave para o desfecho da eleição passada, no entanto, começa a ser desenhado anos antes. Por isso, a coleta dos dados da pesquisa de Oliveira se inicia em 2014, quando a Lava Jato toma corpo. O resultado das análises deu origem ao livro “Qual Foi a Influência da Lava Jato no Comportamento do Eleitor”, lançado este ano pelo professor. Confira a entrevista sobre a pesquisa.

No livro, o senhor fala de uma taxa de impacto da Lava Jato entre os eleitores com base no que foi publicado na imprensa. Como foi calculada essa taxa e o que foi encontrado?

Eu não podia analisar apenas a eleição de 2018. Porque as primeiras pesquisas de 2018 mostravam a existência de um antilulismo, de um antipetismo, uma queda forte da admiração dos eleitores para com o PT e também um alto percentual de eleitores que se declaravam antilulistas. Eu, como cientista político, tinha que saber como isso foi construído. Fui pesquisar a Lava Jato de 2014 a 2018 e tive a necessidade de matematizar isso, ou seja, mostrar o impacto dela. Para criar o índice de impacto, me veio o insight de somar o número de conduções coercitivas, o número de prisões realizadas por ano, dividido por 365 dias e multiplicado por 100. Aí eu teria uma taxa de impacto. Mas por que essas variáveis? Porque cada prisão e condução coercitiva gerava ampla repercussão na mídia. Soma-se a isso o fato de que, dentro dessa cobertura, havia atores políticos relevantes e isso despertou a atenção da opinião pública. 

Para mostrar que isso, de fato, chamou a atenção da mídia, encontrei um site, um laboratório da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) chamado Manchetômetro, que calcula o número de matérias sobre diversas pessoas num dado período. Alguns dos exemplos são Lula, Dilma Rousseff, Michel Temer, Sergio Moro. Lá, então, averiguei o número de manchetes positivas, negativas e neutras entre 2014 e 2018. Isso mostrou – diante dos fatos – uma cobertura mais negativa em relação a Lula, Dilma e Temer e uma cobertura neutra em relação a Moro.

Esse índice de cobertura da Lava Jato é diretamente proporcional ao crescimento do antilulismo?

Ela contribuiu, mas não há uma intencionalidade da mídia. Havia fatos propícios, eventos produzidos. Se a mídia cobre, por exemplo, a condução coercitiva do ex-presidente Lula, esse assunto vai ser classificado como negativo para ele. Só que paralelo a esses dados, eu busquei os institutos de pesquisa (Ibope, Datafolha e Ipsos), coletei as variáveis de 2014 até 2018, as perguntas feitas sobre a Operação Lava Jato e analisei ano a ano como a opinião pública se manifestou em relação a Lava Jato, lulismo, Dilma Rousseff.

O que encontrou?

Vamos começar pela Lava Jato. Temos uma taxa de impacto muito forte em 2016, ano em que ocorre o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Foi o ano que a Lava Jato mais atuou. Mas existe outro achado: o número de prisões e de conduções coercitivas na Lava Jato é crescente até o processo de impeachment. Quando cessa o processo de impeachment da presidente, há um declínio do número de operações.

Entretanto, eu estou trabalhando também com opinião pública e ali eu mostro como em 2015 e 2016, em virtude da forte atuação da Lava Jato, é criado o antilulismo. Ou seja, a maioria dos eleitores – com exceção do Nordeste e do Norte – é favorável à prisão do Lula, considera a prisão justa, é favorável ao impeachment de Dilma Rousseff, responsabiliza o PT pela crise econômica, diz que é o partido que mais roubou no país. O antilulismo, então, começa a ser construído em 2014.

No momento em que eu mostro essas variáveis, também vou mostrando as intenções de voto. Vou mostrando a diminuição de votos do PT ou a recuperação do Lula, pois em um dado momento Lula se recupera eleitoralmente. Isso ocorre porque em um dado momento, a partir do final de 2017, o eleitor percebe que ele não é o único acusado pela Lava Jato. Da mesma forma que ela contribuía e contribui para o antipetismo, ela também mostrava que todos os políticos eram iguais. Além disso, o governo Temer, ao invés de ter contribuído para o enterro do lulismo, ajudou a recuperá-lo. Seis meses depois do início do governo, quando vem a denúncia contra o governo Temer, o lulismo recupera popularidade.

E onde Bolsonaro aparece nessa equação?

Bolsonaro vai aparecer quando surge o episódio da facada. Até aí Lula está liderando, enquanto os eleitores estão procurando um opositor político, mas ninguém crescia, ninguém despontava. Nesse momento, eu consigo encontrar nos gráficos duas coincidências: a facada e a saída de Lula da disputa. Isso faz com que Bolsonaro saia de 15% para 22% de intenções de voto.

O antilulismo estava à procura de um candidato. O que não era esperado era Bolsonaro ser o candidato desse grupo.

No livro, eu também trago entrevistas dos marqueteiros de Geraldo Alckmin e de Fernando Haddad dizendo o seguinte: “Antes da facada nossa estratégia estava mostrando a queda de Bolsonaro. Depois da facada é que houve a mudança”.

Existe algum ponto que o surpreendeu mais?

O que me surpreendeu foi a intensidade da Lava Jato, de como ela moveu uma opinião pública contrária ao PT. Inclusive, eu busquei um dado muito interessante. Eu verifiquei entre 1989 e 2018 qual era o principal problema do país, que é uma pergunta que Ibope e Datafolha fazem. Eu dividi por eras de presidentes da República. Verifica-se, então, que mesmo na época do mensalão – que foi o primeiro escândalo na era PT – corrupção não era o grande problema, o grande tema. Quando eu chego na segunda era Dilma, a corrupção passa a ser o principal problema do país, desbancando desemprego, saúde e segurança pública. Esse é um achado fundamental. A corrupção passou a existir perante a opinião pública a partir da Lava Jato. Desde o período de redemocratização, a corrupção nunca havia sido considerada em pesquisas de opinião pública como um problema. E mais: quando Dilma sai do poder, qual é o problema que volta? O desemprego.

O futuro da Operação Lava Jato definirá as próximas eleições?

A Lava Jato ocorreu em paralelo a uma grande crise econômica. Se porventura não tivesse ocorrido a crise, a operação teria o impacto que teve? Essa é uma pergunta que não se pode responder. Então, se de repente esse momento de crise se mantiver e se o atual governo for atingido por denúncias de corrupção, o que eu tenho para dizer é que teremos as mesmas consequências que tivemos com o PT. Aí pode haver uma redução do antilulismo, pode haver um questionamento da democracia. Mas eu não tenho essas perspectivas. A Lava Jato é uma operação do passado. Ela vai continuar investigando a era Lula, Temer ou vai adentrar para o futuro?

O que as pesquisas dizem sobre Sergio Moro?

Muito bem avaliado. Mas outra coincidência: ele lidera uma avaliação muito alta; quando Michel Temer assume e surge o primeiro escândalo de corrupção do governo dele, Moro declina nas pesquisas de popularidade e Lula sobe. Aí eu cruzo os dados: quem é morista não é lulista, quem é lulista não é morista. Isso fica muito claro. Moro representava o antilulismo. Não era Bolsonaro, era Moro.

Mas Moro foi o principal tomador de decisão da Operação Lava Jato e, de repente, virou ministro de um candidato eleito que foi beneficiado pela própria Lava Jato. Como ele vai ser visto pela história? Ele pode ser visto como o salvador da pátria se o governo for um sucesso, mas pode ser visto como um oportunista se o governo for uma porcaria. É a história. Não há como dizer agora.

Qual foi a influência da Lava Jato no Comportamento do Eleitor? – Do lulismo ao bolsonarismo

Autor: Adriano Oliveira

Editora: CRV

Páginas: 138

Preço: R$ 29,90

E-book: R$ 25,13

Este vídeo pode te interessar

Site: https://editoracrv.com.br/

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais