Publicado em 11 de dezembro de 2019 às 20:55
A Justiça Federal proibiu, nesta quarta-feira (11), a realização de novas eleições antecipadas para a Mesa Diretora da Assembleia Legislativa do Espírito Santo. >
"Entendo por deferir o pedido de tutela de urgência, para, de forma concreta, determinar que não sejam convocadas novas eleições da Mesa Diretora da ALES para o biênio 2021/2022, até o julgamento de mérito da presente demanda, vedando-se, ao menos por ora, a antecipação das eleições, pois, ao menos a princípio, e em análise perfunctória, que a Emenda Constitucional nº 113/2019 padece de vícios materiais em face da Constituição Federal", registra a decisão do juiz Aylton Bonomo Junior, da 3ª Vara Federal Cível de Vitória.>
A ação civil pública foi movida pela Ordem dos Advogados do Brasil - seccional Espírito Santo (OAB-ES) depois que o presidente da Assembleia, Erick Musso (Republicanos), foi reeleito para comandar a Casa com 14 meses de antecedência. Originalmente, a Constituição Estadual determinava que o pleito ocorresse somente em 1º de fevereiro de 2021. Mas a Assembleia mudou a Constituição com a aprovação de uma emenda. >
A chapa encabeçada por Erick, eleita no último dia 27, já renunciou e não vai mais tomar posse. Mas outra eleição antecipada poderia ocorrer a qualquer momento. Nesta quarta, o Tribunal de Justiça já havia suspendido provisoriamente os efeitos da emenda, também impedindo a realização de novas eleições antecipadas.>
>
A OAB-ES alegou, entre outros pontos, que a tramitação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que originou a Emenda 113/2019 não seguiu o caminho correto, uma vez que foi a proposta foi analisada por uma comissão especial da Assembleia e não passou pela Comissão de Constituição e Justiça separadamente. A Justiça Federal, num primeiro momento, no entanto, considerou que isso não é um problema porque o regimento interno da Assembleia prevê que comissões especiais sejam convocadas em alguns casos.>
"Não obstante, o art. 57, inciso II, também do Regimento Interno da Assembleia, prevê que será possível constituir Comissão Especial para dar parecer sobre 'análise, apreciação e oferecimento de parecer quanto à constitucionalidade, juridicidade, legalidade, técnica legislativa e mérito de proposições consideradas de relevante interesse público, para efeito de posterior discussão e votação do Plenário'", citou o magistrado. >
A OAB-ES entende que antecipar a eleição da Mesa Diretora não é de relevante interesse público e, por isso, a PEC não se enquadraria no previsto nesse artigo do regimento. >
O juiz Aylton Bonomo Junior, no entanto, fez uma observação. Se a tramitação não ocorreu de forma errada regimentalmente e nem contrariou a Constituição no que se refere ao passo a passo que a PEC deve seguir na Assembleia, há outra questão, também alegada pela OAB-ES: a eleição antecipada pode ter violado princípios democráticos. >
"Prosseguindo, no caso em análise, em análise superficial, me parece que a EC 113/2019 afronta, de fato, princípios constitucionais previstos na Carta Magna de 1988, sobretudo os constantes em seu art. 1º, caput (regime democrático) e inciso V (pluralismo político), em seu art. 5º, caput (igualdade), e em seu art. 37, caput (impessoalidade e publicidade), além dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade", registrou Bonomo Junior. >
"Em primeiro lugar, a aludida EC 113/2019 me parece inconstitucional materialmente por antecipar de forma exagerada o tempo da eleição, sendo irrazoável e desproporcional essa medida se considerado o extenso lapso temporal entre a data a eleição e a data do início do mandato da Mesa Diretora da Assembleia, afrontando, assim, o espírito do regime democrático (art. 1º, caput, CF). Como é cediço, a política, como a arte ou ciência da organização, direção e administração do ente federado, naturalmente muda de rumo ao longo do tempo, pois acompanha as mudanças sociais, econômicas, éticas, filosóficas, culturais, religiosas, etc., da sociedade.">
"Daí porque, quando do exercício da democracia representativa (eleição), a Constituição Federal determina que entre a eleição dos cargos para o Poder Legislativo Federal e Poder Executivo Federal, Estadual e Municipal, e o início do exercício efetivo do mandato (a posse), não decorra prazo irrazoável e desproporcional, sob pena de, no inicio do mandato, aquele candidato eleito não representar mais a vontade popular do momento da eleição, em razão das mudanças da sociedade ocorridos pelo largo espaço de tempo entre a eleição e o mandato, o que, indiretamente, violaria o regime democrático (a vontade do povo).">
Parece até uma coisa meio óbvia, entende o juiz: >
Aylton Bonomo Junior
Juiz federalPor isso, concluiu: "No caso em tela, como há alegação de violação de direitos fundamentais e das regras do jogo democrático, afigura-se possível, ao menos em tese, a atuação do Poder Judiciário".>
Assim, a Assembleia fica proibida de realizar novas eleições antecipadas até que a Justiça Federal decida se a Emenda aprovada é ou não inconstitucional. >
A decisão da Justiça Federal mostra que a OAB-ES assumiu o caminho correto em questionar uma atitude antidemocrática e ilegal da Assembleia Legislativa. A Ordem exerceu o papel que a população capixaba espera da nossa entidade. Trabalhamos em prol da sociedade, afirmou, nesta quarta, o presidente da OAB-ES, José Carlos Rizk Filho. >
Procurada por A Gazeta, a Assembleia informou que ainda não foi notificada sobre a decisão da Justiça Federal e tampouco da do Tribunal de Justiça do Espírito Santo. Em pronunciamento no plenário da Casa, na última terça-feira, Erick Musso defendeu a eleição antecipada, embora tenha recuado após uma série de pressões e críticas. >
À Justiça Federal, a Assembleia alegou, entre outras questões, que já publicou um ato que tornou sem efeito a eleição da Mesa Diretora realizada no dia 27 e também que "se aproxima o recesso parlamentar (de 23.12.2019 a 02.02.2020), de forma que a última sessão ordinária do ano ocorrerá em 18.12.2019 e entre a data presente e ela haverá apenas mais quatro sessões ordinárias". Assim, não haveria nem tempo para outra eleição surpresa. >
Quanto ao prejuízo de deputados que não puderam inscrever chapas para disputar com a de Erick Musso - foi concedido um prazo de apenas cinco minutos no meio da sessão da eleição para isso - a Assembleia apontou que na eleição da Mesa Diretora da ALES não há, nem nunca houve, registro prévio de chapas, que são apresentadas sempre a partir do início da sessão". >
Entre os argumentos da Assembleia também está que a "concessão da medida liminar traria grande insegurança jurídica e repercussão indesejada, estimulando a propositura de outras ações, como de fato já ocorreu". Mas, mesmo assim, o juiz proferiu a liminar (decisão provisória).>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta