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Emiliana Emery: primeira mulher capixaba a conquistar o direito ao voto

Emiliana Emery: primeira mulher capixaba a conquistar o direito ao voto

Emiliana Emery conseguiu na Justiça o direito de votar, em 1929. Ela foi a terceira mulher do país a possuir um título de eleitor

Publicado em 5 de março de 2020 às 12:53

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Emiliana foi a primeira capixaba a obter o título eleitor feminino no ES. (Reprodução/Jornal O Cruzeiro)

Foi na pequena cidade de Guaçuí, ainda distrito de Alegre, no Sul do Espírito Santo, que a luta pela emancipação feminina encontrou sua maior representante no Estado. 

Aos 55 anos, a empresária Emiliana Emery Viana conquistava na Justiça o direito ao voto. Em uma sentença histórica, ela se tornava a primeira mulher capixaba a obter um título de eleitor, em 1929.

Esta é uma das matérias da série que conta as histórias das mulheres que foram pioneiras no Espírito Santo em diversas áreas. O material faz parte das publicações da semana em que se celebra o Dia Internacional da Mulher, em 8 de março, próximo domingo.

Veja abaixo trecho da sentença que deu o direito a Emiliana de votar.

Alegre, 16 de Julho de 1929

“Na época de agora, em que vemos o direito, a regra jurídica ir sendo absorvida pela regra moral, não é possível que se negue à mulher essa infiltração tão precisa a um renascimento para melhores dias na nossa democracia republicana. No Estado, particularmente, é questão vencida a admissão da mulher como eleitora [...] A Constituição não distingue na palavra cidadãos o homem da mulher, tanto assim que elas não foram taxativamente enumeradas nas exceções abertas no passo constitucional. Assim, mando que a requerente seja admitida como eleitora”  

Reprodução da Sentença

Aloysio Aderito de Menezes

A história de Emiliana foi noticiada nos jornais de todo país. Ela era a terceira brasileira a obter o direito de votar. Naquela época, a Constituição não proibia mulheres de irem às urnas, mas também não assegurava a elas este direito. Para se tornar eleitor, era preciso que os cidadãos solicitassem o alistamento eleitoral na Justiça. E foi isso que Emiliana fez. 

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Todos os chefes de família de Guaçuí votavam, inclusive aqueles com quem Emiliana discutia política. Ela pensou: 'eu faço tudo o que eles fazem, também quero meu direito a voto'.

Luiz Moulin
Historiador
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LUTA PELA IGUALDADE

Mas a busca da jovem guaçuiense pela igualdade de gênero começou muito antes da conquista do voto. De família tradicional, Emiliana nasceu em 1874, durante o Império brasileiro; um período marcado pela submissão e opressão feminina. 

Assim como a maioria das mulheres da época, as quais cabia apenas o papel de boa esposa e mãe, Emiliana casou-se nova, aos 13 anos e teve sete filhos. Aos 20, porém, ficou viúva, e para sustentar a família, começou a trabalhar fora.

Em reportagem publicada na época, Emiliana aparece com uma das netas. (Reprodução/Jornal O Cruzeiro)

Durante a construção da Ferrovia Leopoldina, a jovem percebeu a necessidade atender aos trabalhadores do local. Montou então uma padaria e passou a vender pães na cidade, sendo pioneira no empreendedorismo feminino no município. Anos depois, Emiliana se tornou empresária ao abrir um hotel. O local foi palco de discussões políticas da época.  

Emiliana desafiou também os espaços onde predominavam homens. Percebendo a falta de alfaiates em Guaçuí, foi a primeira mulher a se aventurar na profissão. 

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Ela conta que foi um escândalo, porque mulher nenhuma colocava a mão em homem. Mas ela não ligava para críticas. Era independente, defendia o direito da mulher de trabalhar fora, achava que elas tinham que ir à luta, estudar, ocupar espaços

Lúcia Emery Cade
Neta de Emiliana
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POLÍTICA E FUNDAÇÃO DO HOTEL EM GUAÇUÍ

A jovem guaçuiense sempre teve gosto por política. Filha de chefe político e irmã de Geraldo Viana, que posteriormente se tornou deputado, Emiliana era contra regimes ditatoriais. Em entrevistas, costumava frisar a importância do Estado democrático. "Eu gosto de eleições, elas me dão uma sensação fora do comum. E quanto mais luta, melhor", disse ao Jornal O Cruzeiro, em 1950.

Hotel de Emiliana Emery, palco de reuniões e discussões políticas em Guaçuí. (Arquivo Pessoal/Reprodução Instituto Histórico e Geográfico de Guaçuí)

Foi no hotel de Dona Emiliana onde aconteceram reuniões políticas importantes da cidade. O local era frequentado por homens poderosos, entre eles, Nestor Gomes, presidente de Estado do Espírito Santo - cargo que existia na época. Segundo Moulin, ele gostava de ouvir a opinião firme da guaçuiense.

Na época, Emiliana liderava um movimento de emancipação de Guaçuí, então distrito de Veado, e pertencente a Alegre.  Para isso, viajou à capital para encontros políticos, com demandas de sua terra.

Aspas de citação

Ela foi mãe da independência de Guaçuí. Participou ativamente do processo, promoveu debates, encaminhou pedidos, fez reuniões

Luiz Moulin
Historiador
Aspas de citação

Em um destes encontros, Nestor Gomes garantiu que daria liberdade ao município. E deu. A emancipação veio em 1928, um ano antes de Emiliana conquistar o direito de voto.

Emiliana Emery recebendo o governador de São Paulo, Ademar de Barros, em Guaçuí. (Arquivo Pessoal/Reprodução Instituto Histórico e Geográfico de Guaçuí)

DIREITO A VOTO

Emiliana nunca aceitou ter mais obrigações do que direitos. Por isso, o fato de não poder votar a incomodava. "Ela falava que só seria uma cidadã completa com o título de eleitor na mão", lembra Lucia Emery, neta de Emiliana.

O sufrágio (direito de votar) feminino já tinha sido aprovado em outros países, mas no Brasil, o direito ao voto ainda fazia parte das demandas das mulheres. Em 1929, Emiliana se tornou a terceira mulher brasileira e primeira capixaba a conquistar, na Justiça, o título de eleitora.

A conquista deu força aos movimentos feministas da época. Três anos depois, a legislação brasileira passou a assegurar o voto feminino. O Código Eleitoral de 1932, elaborado por Getúlio Vargas, dava o direito de votar a "todos os cidadãos maiores de 21 anos, sem distinção de sexo". Um marco na luta das mulheres, que finalmente se tornavam cidadãs pela lei. 

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