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Decisão do TCU pode atrasar investimentos em nova ferrovia no ES

Decisão do TCU pode atrasar investimentos em nova ferrovia no ES

Parecer técnico apontou falhas graves de metodologia nos cálculos de tarifa de transportes na renovação antecipada da Estrada de Ferro Vitória a Minas, que prevê, como contrapartida da Vale, construção de malha férrea entre Cariacica e Anchieta

Publicado em 14 de julho de 2020 às 05:02

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Trem de Passageiros da Estrada de Ferro Vitória a Minas Novo trem, implantado em 2014
Trem de Passageiros da Estrada de Ferro Vitória a Minas. (Gabriel Lordêllo/ Mosaico Imagem/Agência Vale)

A área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) deu parecer desfavorável à antecipação da renovação da concessão da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM). Em relatório de maio deste ano foram apontadas "irregularidades e falhas metodológicas graves" na proposta feita entre o governo federal e a Vale, que hoje tem a concessão da ferrovia. A renovação  ainda precisará ser apreciada pelo relator, o Ministro Bruno Dantas, e votada em plenário.

A decisão do TCU, se seguir a mesma linha do parecer, pode também atrasar um novo empreendimento crucial para a retomada da economia do Estado: a ferrovia EF 118, no trecho entre Cariacica e Anchieta, um investimento de R$ 3 bilhões.

A EF 118, também conhecida como ferrovia Vitória-Rio, é muito esperada pelo setor produtivo do Estado e pode consolidar o Espírito Santo como referência logística. Isso porque, mesmo que seja construído pela Vale, o ramal será concedido e poderá trasportar outros tipos de produtos e não apenas o minério de ferro.

O projeto é ainda mais importante tendo em vista o iminente retorno das operações da Samarco, já previsto para dezembro deste ano. A EF 118 ligaria a sede da Vale no Estado ao Porto de Ubu, em Anchieta, estreitando a ligação entre as duas empresas. Também aumenta a viabilidade de negócios no Porto Central, quando no futuro o ramal for estendido até Presidente Kennedy.

A proposta é que EF 118 chegue até a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, passando por diversos portos até lá, transformado os dois Estados em um grande corredor logístico, abrindo oportunidades para transporte de cargas importadas e exportadas por todo o país.

O projeto de engenharia de toda a malha férrea também é uma das contrapartidas da Vale, de acordo com as determinações feitas pela Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT). Após a conclusão do trecho até Ubu, o governo pretende fazer um leilão para que a empresa que arrematar a linha de ferro e operar a estrutura conclua as obras.

TCU QUESTIONA CÁLCULO DE TARIFAS

No relatório, um dos principais pontos de questionamento da área técnica da Corte de Contas diz respeito à metodologia para definição da tarifa de transportes de cargas usada nos estudos para a prorrogação. Esse dado é importante, pois como a Vale carrega produto próprio (minério de ferro) para portos também próprios, é difícil isolar o preço do transporte.  Para os analistas do TCU, foi usado um método de cálculo diferente daquele já avaliado pelo Conselho Administrativa de Defesa da Concorrência (Cade).

O Ministério da Infraestrutura e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) deverão prestar esclarecimentos sobre esse e outros pontos levantados no relatório, antes que este possa avançar.

VAI E VEM DO PROCESSO

A Vale tem a concessão da ferrovia Vitória a Minas até 2026. Contudo, a mineradora e o governo tentam, desde 2016, antecipar a renovação desse contrato. Nesse caso, ao invés de pagar ao governo federal o valor pela outorga, como ocorreria com o vencedor de um leilão,  a empresa se compromete a fazer investimentos. 

Inicialmente, a proposta era de que a compensação fosse feita sob a forma da construção de um trecho da ferrovia Vitória-Rio (EF 118) entre Cariacica e Presidente Kennedy, de 160 km. Porém, após um imbróglio com o governo federal em que o Espírito Santo quase ficou de fora do acordo, parte desse investimento foi transferido para a Ferrovia da Integração do Centro-Oeste (Fico).

O acordo atual, que só poderá ser assinado com aval do TCU, prevê que a Vale, além da Fico,  pague o projeto de toda a ferrovia EF 118, mas execute apenas o trecho entre Cariacica e Anchieta, com 72 km de extensão. O investimento seria de R$ 3 bilhões. Outros R$ 8,8 bilhões seriam aplicados na melhoria da malha já existente pelos próximos 30 anos, que é a duração do novo contrato.

DECISÃO AINDA SEM PRAZO

Em junho deste ano, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, disse que a renovação deve sair no segundo semestre deste ano, o que permitiria o início das obras no final de 2021 ou início de 2022. 

Já na última sexta-feira (10), Freitas afirmou ao Estadão que já enviou ao TCU explicações a respeito da metodologia da tarifa de transporte.

Segundo ele, o ministério já apresentou argumentos ao tribunal para mostrar que não faz sentido usar a metodologia do Cade, porque geraria “valores muito fora da realidade" dos preços máximos definidos pelo governo. “Então estamos bem tranquilos sobre a metodologia estimada”, disse. A expectativa de Freitas é de que o TCU delibere sobre o assunto em 30 ou 45 dias.

Questionado por A Gazeta, o TCU afirmou que ainda não há prazo para deliberação ou apreciação da proposta em plenário.

O Ministério da Infraestrutura disse, em nota, que tem mantido diálogo com o TCU e que a maior vantagem do projeto está na realização da obra da Fico, "empreendimento priorizado no Plano Nacional de Logística como alternativa ao modal rodoviário para uma das maiores regiões produtoras de soja do país."

OS CAPÍTULOS DA NOVELA DA EF 118

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    Em 2016, a Vale propõe ao Ministério da Infraestrutura e à ANTT a construção do trecho da EF 118 entre Cariacica e Presidente Kennedy, de 160 km, como contrapartida pela renovação antecipada por mais 30 anos do contrato de concessão da ferrovia Vitória-Minas.

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    Em meados de 2018, o governo federal tira o Espírito Santo do acordo e decide que os investimentos compensatórios da Vale sejam destinados para a construção da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico), entre Água Boa, no Mato Grosso, e Campinorte, Goiás.  A mudança, que na época pegou políticos e empresários de surpresa, foi justificada pelo governo federal como uma priorização no escoamento de grãos.

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    No mesmo ano, para garantir os investimentos no Estado, o governo do Espírito Santo ajuizou uma Ação Civil Pública (ACP) contra a União requerendo a suspensão do processo de renovação antecipada da concessão da EFVM.

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    Após negociações, o governo federal concordou, em agosto de 2018, autorizar que a Vale amplie a Estrada de Ferro Vitória-Minas (EFVM) até Ubu, Anchieta. Na ocasião, ficou acordado com o então governador Paulo Hartung que os recursos viriam dos créditos de ICMS que a Vale tem com o Estado, no valor de aproximadamente R$ 1,8 bilhão.

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    Porém, após as eleições, em outubro em 2018, o governador Renato Casagrande disse que era contra a utilização dos créditos de ICMS para esse fim e que só liberaria os recursos se houvesse garantia de uma compensação da União.

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    Quase um ano depois, em junho de 2019, a ANTT conseguiu aprovar o processo de antecipação da concessão da EFVM. No documento, estava descrito que o trecho entre Cariacica e Anchieta seria construído pela Vale como uma das contrapartidas à manutenção do contrato de concessão por mais 30 anos.

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    Desde março, a proposta formada entre a Vale, o Mistério da Infraestrutura e a ANTT está em análise no TCU. É preciso que a Corte de contas aprove o documento, para que seja firmado um novo contrato. O parecer da área técnica em maio deste ano, contudo, foi pela não aprovação do acordo.

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