
Imagine você em um dia normal de trabalho. De repente, sofre um acidente de trânsito e acaba ficando em um hospital, por meses. Quando finalmente tem alta, sai em uma cadeira de rodas. Pouco depois, a renda da sua família desaparece e vocês se veem obrigados a deixar a casa alugada. Sem ter para onde ir, o novo endereço é um viaduto. Pois esta é a exata situação enfrentada por Angela Aparecida Ferreira, de 52 anos.
Há cerca de uma semana, ela passou a morar embaixo do Viaduto Engenheiro Manoel dos Passos Barros, que fica perto da Central de Abastecimento do Espírito Santo (Ceasa), em Cariacica – um trecho da BR 262 muito movimentado, no qual o barulho do trânsito quase impede a história dela ser notada.

Em um vídeo feito pelo fotógrafo Fernando Madeira, de A Gazeta, ela volta no tempo e desabafa sobre a dura reviravolta da vida. Tudo mudou em um intervalo de apenas três anos, a partir de uma batida entre motocicletas, enquanto ela estava na garupa, realizando a entrega dos salgados que ela mesmo produzia.
Com o fêmur quebrado, Angela não esquece: precisou ficar internada dois meses e 24 dias, com o uso de fraldas. "As minhas nádegas, depois de rasparem no asfalto quente das 14h, queimaram e ficaram em carne viva", relembra. Ainda hoje, depois de três cirurgias e próxima da quarta, ela ainda não consegue andar.
História da cadeirante que foi morar embaixo de viaduto em Cariacica
Até pouco tempo, o filho Luan, de 25 anos, era atendente em uma lanchonete e ajudava no que fosse preciso. O emprego, porém, lhe escapou. Com toda essa situação, Angela afirma que teve o auxílio doença negado quatro vezes pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Assim, as contas foram ficando em atraso, incluindo o aluguel da casa no Parque Gramando.
Ângela Aparecida Ferreira
Salgadeira
"Eu fui despejada da casa onde eu morava, a mulher não me quis mais lá. Estava indo na porta, ligando, me humilhando. Se vou ser humilhada, eu venho para debaixo da ponte, porque aqui, pelo menos, eu sou ajudada"
Recentemente, ela recebeu do médico um laudo de "cadeirante definitiva" e sabe que corre o risco de ter a perna amputada. A quinta perícia junto ao INSS está marcada para o início de fevereiro. Enquanto isso, ela precisa contar com a solidariedade das pessoas para sobreviver.
Por outro lado, há quem pareça não ter coração dentro do peito. Nessa semana em que passou a viver embaixo do viaduto, ela já foi roubada duas vezes: levaram a televisão e um botijão de gás. A história completa da Angela Aparecida Ferreira, você assiste no vídeo abaixo:
O QUE DIZEM OS CITADOS
Na manhã desta quarta-feira (19), a Prefeitura de Cariacica explicou que o Serviço Especializado em Abordagem Social (Seas) foi acionado na última segunda-feira (17), quando realizou a primeira intervenção no caso. "Foi ofertado o Serviço de Acolhimento Institucional para Adultos em Situação de Rua, além dos serviços ofertados pelo Centro Pop, porém a família não aceitou", informou.
Ainda segundo a prefeitura, a família não aceitou ser acolhida no abrigo, pois não haveria um lugar para guardar todos os móveis que possui. Assim, a Secretaria de Habitação foi acionada para concessão do aluguel social. O município afirmou que o processo já foi iniciado e que a vaga em abrigo continua à disposição.
Em casos semelhantes a esse, os cidadãos podem acionar o Seas por meio do telefone (27) 9 8875-1261.
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) enviou nota, afirmando que Angela efetuou a última contribuição em janeiro de 2010 e que não possuía a qualidade de contribuinte do órgão quando o acidente ocorreu em 2019. Confira a nota:
"A Sra. ANGELA APARECIDA FERREIRA efetuou a sua última contribuição no INSS em janeiro de 2010.
Conforme relatado pela interessada, o acidente ocorreu no ano de 2019 e, na data do acidente, ela não possuía a qualidade de segurada, ou seja, não contribuía para o INSS. Ressaltamos que o INSS funciona com um seguro e as contribuições é que garantem os direitos do segurado.
A interessada esteve protegida até 15/02/2011. No entanto, após a perda da qualidade de segurada não efetuou nenhuma contribuição, mesmo tendo informado na reportagem que exercia a atividade autônoma de fazer salgados para revenda.
Ela requereu um Auxílio doença em 07/10/2020, e a enfermidade foi reconhecida com isenção de carência pela perícia médica por ser tratar de um acidente ; entretanto, o benefício foi negado por perda da qualidade de segurada, já que não havia contribuições para o INSS naquele período.
Após a negativa do auxílio doença, a reclamante requereu um Benefício Assistencial à Pessoa com Deficiência, o BPC. Este tipo de benefício, por ser assistencial, não requer contribuição prévia. No entanto, possui como requisitos as condições de renda per capita de 1/4 do salário mínimo por pessoa do grupo familiar e ser portador de deficiência física permanente.
Conforme disposto no §2º do Art. 20 da Lei nº 8.742 de 07/12/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), considera-se "pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas".
A reclamante requereu um Benefício Assistencial à Pessoa com Deficiência , em 16/11/2020 , que foi indeferido em decorrência de sua incapacidade porque não atende os critérios de deficiência para o benefício LOAS/BPC.
Atualmente, ela possui outro requerimento de Benefício Assistencial à Pessoa com deficiência, protocolado em 03/01/2022, que se encontra em análise aguardando a realização da perícia médica em 02/2022.
Diante do exposto, informamos que por inexistência da qualidade de segurada e por não atender aos critérios de deficiência exigidos para a obtenção do direito ao LOAS/BPC é que a reclamante vem obtendo os indeferimentos nos pedidos de benefícios formalizados no INSS."
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