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Após 122 dias internada, aluna baleada em ataque em Aracruz recebe alta

Após 122 dias internada, aluna baleada em ataque em Aracruz recebe alta

Thaís Pessotti é a última sobrevivente de ataque que matou 4 pessoas a ter alta; a mãe dela é professora e viu a filha ser socorrida

Publicado em 30 de março de 2023 às 10:26

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Após 122 dias de internação, a adolescente Thais Pessotti da Silva, de 14 anos, baleada na cabeça no ataque a duas escolas em Aracruz, no Norte do Espírito Santo, deixou o hospital na última segunda-feira (27) e passou a se recuperar em casa com a família. Thaís era a última vítima do atentado, que matou quatro pessoas e feriu outras doze, que permanecia internada.

Pela primeira vez, Juliana Pessotti Ribeiro, mãe da adolescente, falou com exclusividade ao g1 ES sobre o dia do atentado e o processo de recuperação da filha. Professora, ela lecionava na mesma escola particular que Thais estudava e viu a filha ser socorrida.

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É o recomeço. É como se eu tivesse recebendo a Thais de novo. Ela tem um dano grande, mas graças a Deus surpreende a todos e vai surpreender ainda mais

Juliana Pessotti Ribeiro
Professora, mãe de Thais
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"A expectativa é de que a Thais se recupere plenamente e retome a rotina dela, que ela realize os sonhos dela, que ela tenha uma vida linda pela frente e que nós enquanto família estaremos sempre aqui pra apoiar, pra cuidar, pra fazer com que tudo isso aconteça, porque é um direito dela", disse a mãe.

Em um vídeo gravado pela família no carnaval, Thais aparece com fantasia de anjo e dá os primeiros passos durante a reabilitação no hospital. Na data da publicação desta reportagem, a adolescente já conseguia se locomover com ajuda de muleta.

O pai de Thais, o técnico de pesquisa Almir Rogério da Silva lembrou como foi a chegada da filha em casa. "Quando tive a notícia da alta foi uma festa para todos nós, mas a espera até segunda foi longa, muitas incertezas e preocupações", disse o pai.

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A chegada em casa foi uma festa. O sorriso no rosto dela e a alegria foram bem gratificantes. Agradeço primeiramente a Deus. Thais lutou pela vida desde o dia do atentado, e agora pela reabilitação

Almir Rogério da Silva
Técnico de pesquisa, pai de Thais
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"A chegada em casa foi uma festa. O sorriso no rosto dela e a alegria foram bem gratificantes. Agradeço primeiramente a Deus. Thais lutou pela vida desde o dia do atentado, e agora pela reabilitação", completou.

Com o apoio de amigos, a família montou uma estrutura em casa com banheiro acessível, quarto adaptado com ar-condicionado, televisão mais moderna e ajustes nas portas.

Thaís Pessotti é última sobrevivente de ataque em Aracruz que matou 4 a ter alta
Thaís Pessotti é última sobrevivente de ataque em Aracruz que matou 4 a ter alta. (Acervo pessoal)

Bala ficou alojada na cabeça

Juliana contou que a filha continua com a bala alojada na cabeça e, em casa, segue com o tratamento pelo plano de saúde da empresa onde o pai da Thais trabalha, com um time de profissionais, entre eles, terapeutas, fisioterapeutas, fonoaudiólogo, nutricionista e psicólogo, para restabelecer os movimentos e a fala.

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Tudo que podia ser feito foi feito, mas a bala não foi possível retirar. [A bala] está atrás do olho esquerdo e atingiu uma região que compromete a fala e a compreensão. Thais está falando algumas palavrinhas e relembrando os conteúdos de escola, leitura e escrita

Juliana Pessotti Ribeiro
Professora, mãe de Thais
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"É todo um processo. É como se tivesse zerado tudo. Ela está começando tudo de novo. Essas informações estão ali, o que precisa agora é restabelecer as conexões para que isso vá voltando aos poucos. Ela tem mobilidade, está conseguindo andar com muleta, com apoio, mas o lado direito ainda precisa ser mais fortalecido", disse Juliana.

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Ela está reaprendendo a fazer tudo com a mão esquerda [mão não dominante] e graças está indo muito bem. Ela come com a mão esquerda, escova os dentes, penteia o cabelo, faz skincare. Thaís é sinônimo de força e determinação. É uma menina que surpreende a todos que se aproximam dela. Ela é luz. Ela é amor. Ela é alegria. Ela é a nossa alegria

Juliana Pessotti Ribeiro
Professora, mãe de Thais
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Para ajudar a filha durante o tempo de internação e agora no retorno ao lar, a mãe disse que teve que deixar de lado toda a carga negativa do atentado.

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Tive que me esvaziar de todo o sentimento ruim, de revolta, de tudo aquilo que é ruim para poder me concentrar no que é melhor para Thais, no amor para Thais, no que eu podia fazer pela Thais. Então, os meus dias foram centralizados nisso.

Juliana Pessotti Ribeiro
Professora, mãe de Thais
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"A determinação dela, a cada dia, é algo assim surpreendente. Ela é muito disciplinada nas terapias, ela quer muito voltar, quer muito se recuperar. Então isso faz e fez toda a diferença durante as terapias e o tratamento dela", contou a mãe.

Mãe viu a filha baleada

No dia do atentado, Juliana e Thais estavam na escola particular. Na conversa com o g1, a professora lembrou que um pouco antes da invasão do assassino, ela estava no recreio com os alunos do 5º ano, quando ligou para a filha porque não viu Thais no primeiro pavimento da escola.

A adolescente disse para a mãe que permaneceria no segundo piso porque ia ficar na sala estudando com os colegas para a prova de geometria.

"O recreio dura uma hora. Ela quis aproveitar e estudar com os colegas para ajudar eles. Ela estava graças a Deus indo muito bem na escola, tirando notas boas e estava preocupada com os colegas que estavam com dificuldade. E aí ficou ela, pelo que entendi, e mais oito crianças na sala de aula estudando", disse a mãe.

Foi no momento que foi encher a garrafinha de água que Juliana ouviu um estouro.

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Corri e falei 'meu Deus do céu, o que é isso?' Vi uma pessoa subindo a rampa com uma coisa brilhosa na mão e um chapéu e saí correndo. Identifiquei que era uma arma e aí as pessoas começaram a correr

Juliana Pessotti Ribeiro
Professora, mãe de Thais
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Juliana contou ainda que quando viu o assassino subir a rampa lembrou da filha que estava no segundo andar estudando com os colegas.

Escola Primo Bitti, em Aracruz, reformada após o ataque
Escola Primo Bitti, em Aracruz, reformada após o ataque. (Divulgação/Sedu)

"Como vi ele subindo a rampa, lembrei logo da Thais, mas não consegui ir lá e corri em direção ao pátio da escola e a gente foi direcionando as crianças para um anexo da área da escola e comecei mandar mensagem", contou a mãe.

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Mandava mensagem pro celular dela: 'Thais, cadê você Thais? Fala comigo Thais'. Daí a pouco eu recebi um áudio da colega que estava com ela: 'tia, ajuda a gente, a Thais se machucou, ela foi atingida, ela está sangrando muito. Entrei em desespero

Juliana Pessotti Ribeiro
Professora, mãe de Thais
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A mãe tentou chegar até a filha, mas não conseguiu. Thais foi socorrida por policiais que entraram na escola e a mãe viu o momento que a filha era carregada pela rampa da unidade.

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Foi o pior dia da minha vida. É uma dor que não dá pra descrever. Ela não me respondia, mas ela respirava. Não abriu os olhos, não expressou nenhuma reação. Não conseguia acreditar no que eu estava vendo e no que estava acontecendo

Juliana Pessotti Ribeiro
Professora, mãe de Thais
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Chegando ao Hospital São Camilo, no Centro de Aracruz, a adolescente recebeu os primeiros socorros e foi levada por uma equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) para o Hospital Infantil de Vitória e depois transferida para um hospital particular, onde permaneceu até o dia da alta.

Recomeço

Com a evolução na recuperação de Thais, a família está confiante que em breve ela vai retomar a rotina.

Almir disse que a família tenta agora uma vaga para Thais na rede Sarah, referência nacional em reabilitação, e agradeceu o apoio de todos que torceram e ainda torcem pela filha.

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Sabemos que ainda temos uma longa caminhada na reabilitação e cremos que Thais tem muito a evoluir

Almir Rogério da Silva
Técnico de pesquisa, pai de Thais
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"As expectativas sempre são as melhores possíveis e, com fé em Deus e a dedicação dela no tratamento, vamos conseguir avançar cada dia mais em sua reabilitação plena. Agradeço a todos que de alguma forma ajudaram, rezaram e tiveram pensamentos positivos e a Suzano pelo apoio que vem prestando a Thais e a toda nossa família", falou Almir.

A mãe Juliana disse que quer voltar a lecionar e espera que a filha também volte logo a estudar.

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Não consigo desistir da educação. É a minha vida. Quero muito voltar com a Thais pra escola. A gente precisa voltar, a gente quer muito isso, a gente quer ressignificar tudo isso. Fazer a diferença no meio e mostrar para as pessoas que o amor vence também

Juliana Pessotti Ribeiro
Professora, mãe de Thais
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A professora também disse que estar presente na vida dos filhos é um papel importante de todos os pais.

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A gente só precisa dar um pouquinho mais de atenção pra nossa família, pros nossos filhos, observar o que eles estão fazendo. Os filhos estão dentro de casa, mas eles não estão sós. Eles estão nas redes sociais. Eu diria que hoje o maior desafio é estar presente na vida dos filhos

Juliana Pessotti Ribeiro
Professora, mãe de Thais
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Assassino cumpre internação

O g1 apurou que, até a data da publicação desta reportagem, o assassino, condenado, desde o dia 4 de dezembro, a cumprir até três anos de internação, seguia internado no Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases).

O tempo é o limite máximo estabelecido como medida socioeducativa para adolescentes pela lei.

Procurado, o Iases informou que não poderia "divulgar informações sobre adolescentes que ingressam, cumprem e/ou cumpriram medida socioeducativa de internação nas unidades do Instituto, tendo em vista que esta publicidade viola o princípio da proteção integral, previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)".

O ataque

No dia 25 de novembro de 2022, um ataque a duas escolas deixou quatro mortos e outros 12 feridos em Aracruz, no Norte do Espírito Santo.

Os disparos aconteceram por volta das 9h30 na Escola Estadual Primo Bitti e em uma escola particular que fica na mesma via, em Praia de Coqueiral, a 22 km do centro do município. Aracruz, onde o ataque aconteceu, fica a 85 km ao norte da capital.

Segundo a Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social, o assassino invadiu a escola estadual com uma pistola e fez vários disparos assim que entrou no estabelecimento de ensino. Depois, foi até a sala dos professores e fez novos disparos. Na unidade, duas professoras foram mortas.

Na sequência, o atirador deixou o local em um carro e seguiu para a escola particular Centro Educacional Praia de Coqueiral, que fica na região. Na unidade, uma aluna foi morta.

Após o segundo ataque, o assassino fugiu em um carro. Ele foi apreendido ainda na tarde do ataque.

No dia seguinte, sábado (26), a Polícia Civil informou que o criminoso iria responder por ato infracional análogo a três homicídios e a 10 tentativas de homicídio qualificadas. Também no sábado, uma professora baleada que estava internada morreu.

No dia 4 de dezembro, o assassino foi condenado a cumprir até três anos de internação. O tempo é o limite máximo estabelecido de medida socioeducativa para adolescentes pela lei.

*Com informações de Juirana Nobres e Fabiana Oliveira

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