Julgamento do STF: fim da prisão em 2ª instância é retrocesso

Com votação em Plenário, STF tem a chance de acabar com uma instabilidade jurídica que dá carona a casuísmos políticos e enfraquece o combate à corrupção

Publicado em 17/10/2019 às 06h00
Atualizado em 17/10/2019 às 06h00
A Justiça, escultura de Alfredo Ceschiatti na fachada do Supremo Tribunal Federal. Crédito: Dorivan Marinho/SCO/STF
A Justiça, escultura de Alfredo Ceschiatti na fachada do Supremo Tribunal Federal. Crédito: Dorivan Marinho/SCO/STF

Uma das maiores controvérsias jurídicas do país finalmente começa a ter seu desfecho desenhado nesta quinta-feira (17), quando o Supremo Tribunal Federal analisa a legalidade da prisão após condenação em segunda instância. É a chance de a Corte pôr termo a anos de entendimentos flutuantes sobre o assunto - instabilidade que deu carona mais a casuísmos políticos e à impunidade do que a justas argumentações legais.

A primeira vez que o STF debruçou-se sobre a celeuma foi em 2009, ano em que, ao analisar um pedido de habeas corpus, decidiu manter o réu solto até que fossem esgotados todos os recursos. Em 2016, no entanto, a Corte entendeu ser possível a prisão antes do chamado “trânsito em julgado”. Sem dúvida um avanço no combate à corrupção. De lá para cá, entretanto, decisões isoladas mantiveram esse entendimento, mas sem efeito vinculante. É essa brecha que precisa ser preenchida por jurisprudência sólida.

Para os críticos da prisão em segunda instância, a execução antecipada de pena fere o princípio constitucional da presunção de inocência. No entanto, a medida é expressamente garantida no ordenamento jurídico brasileiro, com as prisões preventivas, mesmo nos tribunais estaduais. Além disso, pesa ainda o fato de que recursos e embargos apresentados ao STF e STJ não revertem praticamente nenhuma condenação (0,006%, para ser mais exato). Nos tribunais superiores discutem-se apenas aspectos jurídicos.

O que está posto é um risco grave de retrocesso no combate ao crime como um todo no país. Retroceder nessa questão em nome de uma suposta quebra da presunção de inocência é abrir espaço para a “perpetuação de inocência”, nas palavras do promotor de Justiça de São Paulo Marcelo Batlouni Mendroni, em artigo para o Estadão. O enquadramento da Lava Jato (de seus promotores e procuradores, mais precisamente), premissa que estará em jogo no julgamento desta quinta, mesmo que às sombras, não pode cobrar qualquer preço. Trata-se de um recuo intolerável, que traz de volta a prática da impunidade dentro do Brasil.

Enquanto milhares de presos provisórios que não podem bancar os altos honorários advocatícios lotam presídios sem qualquer condenação, isso sim uma afronta à Constituição, no reduto dos abastados pessoas que tiveram sentença confirmada beneficiam-se dos recursos infindáveis, às vezes até a prescrição do crime. Em um país que só há pouco tempo começou a ver figuras poderosas atrás das grades, a revisão da prisão em segunda instância pode representar um freio a avanços conquistados a duras penas no combate à corrupção.

Em voto proferido em 2016, quando a prisão em segunda instância voltou a ser aceita pelo STF, a ministra Cármen Lúcia foi precisa: "uma vez havendo apreciação de provas e duas condenações, a prisão do condenado não tem aparência de arbítrio. Se de um lado há a presunção de inocência, do outro há a necessidade de preservação do sistema e de sua confiabilidade, que é a base das instituições democráticas. A comunidade quer uma resposta, e quer obtê-la com uma duração razoável do processo”.

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