Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

O crime tem compensado muito para a Netflix

Apostando em dramas criminais mais profundos, serviço de streaming lança a ousada "Criminal"

Publicado em 30/09/2019 às 14h20
netflix. Crédito: JOSE HARO
netflix. Crédito: JOSE HARO

A Netflix lançou na última sexta-feira (27) a antologia "Criminal", uma série difícil de ser definida. Trata-se de uma antologia policial dividida em quatro partes - cada uma delas com três episódios situados em um país diferente. Neste primeiro momento, Inglaterra, França, Alemanha e Espanha ganharam interessantes e surpreendentemente distintas temporadas.

Em cada episódio, a equipe de detetives e investigadores corre contra o tempo para interrogar suspeitos de crimes brutais. A série apresenta um caso por semana, mas, ao contrário de programas procedurais como "CSI", toda a ação se passa na sala de interrogatório; o espectador não é transportado para fora daquele ambiente nem em flashbacks. A história de cada personagem vai sendo criada na cabeça de quem acompanha, com cada detalhe apresentado como prova ou revelado pelo investigado. A narrativa, assim, se aproxima muito da de "Mindhunter", outra excelente série que se baseia em entrevistas, mas "Criminal" ainda tem o mérito de construir o suspense na dúvida se o sujeito é culpado ou não.

Vale ressaltar que não faz diferença começar por um ou outro país, as séries não se encontram. Eu, por exemplo, comecei pela série inglesa pelo simples fato de ter o rosto de David Tennant (o eterno 10º Doutor de "Doctor Who"), que protagoniza o primeiro caso, o brutal assassinato de uma jovem de 14 anos. É interessante também o pequeno desenvolvimento de cada investigador, traumas, casos mal resolvidos e situações citadas pelo roteiro que ajudam o espectador conhecer pelo menos um pouco de cada um deles.

Fórmula

A Netflix aprendeu com a já citada "Mindhunter" não ser preciso tiros, perseguições ou grandes reviravoltas para se construir uma série. O serviço também aprendeu, desde "Making a Murderer", que crimes atraem a atenção - quanto mais próximo do público, melhor. O mérito de "Criminal" é criar tensão com o combo ambientação e roteiro. As salas são claustrofóbicas, não há saídas, no máximo a presença de outros investigadores atrás do espelho falso.

"Criminal" é deliciosamente repetitiva - pouco muda de um país para outro, só os personagens e os casos, e, ainda assim, a série prende. Cada país tem suas subtramas, algum romance, problemas no ambiente de trabalho etc., nada muito aprofundado, apenas para dar alguma humanizada nos investigadores.

O crime compensa?

Bem... Todo mundo conhece aquela história de que "Stranger Things" é o resultado de como funciona o algoritmo da Netflix, que obviamente monitora tudo o que é consumido por seus assinantes. Gosta de anos 1980? Toma. Winona Ryder? Tá na mão! Aventuras fantasiosas com grupo de jovens? Mas é claro!

"Criminal" é mais um exemplo. A já citada "Making a Murderer" despertou o interesso do público para esses conteúdos. Com "Mindhunter", viram que nem só de ação vive um suspense. Não é à toa que o serviço disponibiliza também um documentário sobre Ted Bundy ("Conversando com Ted Bundy"), outro sobre condenados que se dizem inocentes ("The Confession Tapes") e ainda séries sobre histórias que pararam o mundo ("The Investigator: A British Crime Story e o "O Desaparecimento de Madeleine McCann", entre outras). Isso, claro, além de sucessos da ficção como "The Blacklist", "The Sinner", "Hannibal", todos sobre crimes.

Assim, entendendo o comportamento de seus assinantes e estudando o que eles querem, os serviços (a Netflix provavelmente não é a única a trabalhar assim) vão entregando conteúdo para todos. É praticamente a Indústria Cultural de Horkheimer e Adorno (aquele mesmo, "o quinto Beatle"), os filósofos da Escola de Frankfurt, que analisaram o modo de se produzir cultura no modelo capitalista, ou seja, os produtos são voltados para as massas, de acordo com seus hábitos de consumo, e não para o indivíduo.

Com Disney+, Apple TV+, Prime Video e outros concorrentes chegando cada vez mais pesado, a Netflix apresenta suas armas para não perder o domínio do mercado.

A Gazeta integra o

Saiba mais

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.

A Gazeta deseja enviar alertas sobre as principais notícias do Espirito Santo.