Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

Como nasceram as cartas de Natal? Rodrigo Santoro explica

Ao lado de Daniel Boaventura, Rodrigo Santoro dubla a animação "Klaus", filme de Natal da Netflix

Publicado em 10/11/2019 às 04h01

Qual a história por trás da primeira carta de Natal? Como nasceu essa tradição? "Klaus", filme que a Netflix lança na próxima sexta-feira (15) responde a dúvida. Na trama, o jovem Jesper (dublado por Rodrigo Santoro na versão brasileira) é o pior aluno da escola de carteiros criada por seu pai, que se cansa da vida boa do filho e o manda ao lugar mais ermo possível, um pequeno vilarejo onde o ódio domina.

Lá ele se depara com o misterioso Klaus (dublado por Daniel Boaventura), um homem solitário, marcado pelo passado, que escolheu se isolar do mundo para lidar com suas dores à sua maneira. Juntos, eles terão que trabalhar para devolver a alegria de volta àquela vila. 

Daniel empresta sua voz grave e uma rouquidão a Klaus. Já Rodrigo surpreende ao dar várias camadas a Jesper - é até difícil reconhecer a voz do ator. O jovem personagem, definido por Rodrigo como "elétrico", muda a voz de acordo com seu estado de agitação. 

"O filme traz uma narrativa muito feliz, uma escolha muito boa do diretor (o espanhol Sergio Pablos) para contar uma história que já foi contada outras vezes", diz Rodrigo Santoro, em entrevista por telefone à coluna. Na última sexta-feira (08), ele e Daniel Boaventura conversaram comigo sobre "Klaus" e sobre o estranho gosto de Daniel, que tem "Tubarão" como seu filme de Natal favorito. Confira abaixo a entrevista.

Como foi o processo de dublagem? Vocês estudaram os originais ou foi uma coisa mais livre?

Daniel: Seguimos a sinopse dos personagens, mas não sabíamos como seria em movimento, não tínhamos ideia de como seria a imagem. Chegando ao estúdio é quase um processo criativo 'real time'. Você vai testando, vendo as inflexões, trabalhando com o diretor (de dublagem) no processo criativo e o personagem vai nascendo. É trabalhoso, mas muito divertido.

Rodrigo:  Eu vi umas cenas do filme antes. No dia da dublagem a gente vai vendo cena a cena e vai entendendo como referência o trabalho da versão original, com o áudio em inglês. Aí a gente vai decodificando, traduzindo o que seria uma versão brasileira não só literal, mas também tentando entender o que faz sentido para a nossa cultura. As piadas que funcionam em inglês às vezes não funcionam em português, você vai trabalhando isso e, ao mesmo tempo, criando a alma, a voz, as emoções... Tudo baseado numa versão do personagem.

Tem a história de que a dublagem brasileira é a melhor do mundo. Vocês sentem essa demanda por qualidade dentro do processo de dublagem?

Daniel: A gente tem colegas, amigos, que fazem dublagem que são realmente um time de primeira. Não é uma lenda não, acho que temos sim uma qualidade profissional de dublagem muito grande. Neste caso específico estamos mais imbuídos do personagem, uma interpretação mais forte e mais detalhada. Estamos num país com profissionais muito tarimbados, então temos que fazer um trabalho no mínimo de muita qualidade.

Vocês têm algum filme de Natal favorito? Que marcou a infância ou outra idade?

Rodrigo: "Esqueceram de Mim"!

Daniel: "Tubarão"!

Rodrigo: "Tubarão"?

Daniel: É... foi lançado no Natal, sabia? (o filme foi lançado em 25 de dezembro de 1974, inverno americano, para não atrapalhar resorts e clubes de praia).

"Tubarão" é igual "Duro de Matar", né? Entra nessa categoria sem ninguém perceber.

Daniel: Boa! O primeiro "Duro de Matar"! Boa!

O primeiro e o segundo, na verdade.

Daniel: É.... até termina com aquela musiquinha ("Let it Snow"), sempre nevando. Muito bom. Um clássico.

Pra vocês, como dubladores nesse projeto, é mais interessante ser reconhecido pela voz ou dar uma identidade tão grande ao personagem que não dá pra perceber que é vocês?

Rodrigo: O mais importante é que a verdade seja transmitida, que o espectador se conecte com o personagem e acredite nele, independente do reconhecimento ou não, a finalidade é sempre humanizar os personagens e construir uma dramaturgia, emoções e cenas nas quais você envolva o espectador e ele acredite naquilo. Pra mim esse é o objetivo da história. Neste caso, por exemplo, para a voz do Jesper eu trabalhei muito com agudo, então às vezes nem associam à minha voz, que é essa que tá falando aqui com você (em tons muito mais baixos que o do personagem). Mas não é esse é meu objetivo. Eu não fiz porque queria ser diferente, mas porque achava que o personagem pedia, que tinha a ver com ele.

Eu me surpreendi com sua interpretação pro personagem...

Rodrigo: É porque ele é muito elétrico, tem arroubos muito rápidos. Ele vai transitando entre agudos e graves e ele simplesmente elétrico. Essa foi a forma que encontrei de traduzir isso. Na versão original americana, o ator (Jason Schwartzman) não faz dessa forma.

É.. Eu fui assistir com áudio original pra ver a diferença. O personagem tem a voz do Jason Schwartzman.

Rodrigo: Exato! Optei por isso porque me pareceu conveniente. Ao mesmo tempo achei que era o que a linguagem corporal do personagem me dizia. Ele é muito magrinho, franzino, e eu queria atribuir algo que parecesse real, que ele fosse "de verdade".

Rodrigo Santoro, dublador de "Klaus". Crédito: Netflix/Divulgação
Rodrigo Santoro, dublador de "Klaus". Crédito: Netflix/Divulgação

Vocês trabalharam juntos no processo? Chegaram a se encontrar?

Daniel: Não, não.... Geograficamente separados. Nós dois não nos encontrávamos desde "Hilda Furacão", em 1997, então tem um tempinho aí (risos). O interessante é que o processo foi tão bem feito, com tanto esmero, tanto carinho, que quando você edita tudo junto, ele funciona como se tivéssemos gravado lado a lado, o Rodrigo, eu, a Fernanda (Vasconcellos), o que é importantíssimo pela interação dos personagens que vão mudar a vida de uma vila, mudar toda a dinâmica de uma cidade.

Daniel, e pra você dar voz a Papai Noel, como foi?

Daniel: Eu gostei muito. O fato de se chamar Klaus, de ser uma concepção do que poderia ter sido a origem da tradição de Natal, do Klaus, me cativou bastante, a história toda me cativou. Um personagem que é solitário, misterioso, foi uma oportunidade muito interessante de trabalhar com essa embocadura diferente. É um cara que fala pouco, mas o que ele fala tem que ser dito de uma maneira muito sólida e bem edificada. Gostei muito do processo.

E o que vocês acharam dessa versão da história?

Rodrigo: Eu acho uma narrativa muito feliz que o diretor encontra em como narrar essa história que já foi contada algumas vezes de formas diferentes. O mais interessante é que o filme possibilita leituras diferentes, é um filme que você pode realmente dizer que vale pra todas as idades. Um adulto vai refletir sobre questões colocadas no filme, uma criança vai sair entretida, se divertir, um jovem também vai perceber coisas... Então a gente tem ali um filme muito abrangente nesse sentido, com um senso de humor meio ácido. Ele trabalha com tudo que você não espera, não com nenhuma questão mais óbvia que a gente está acostumado a ver. A própria figura do Klaus, quando você a encontra pela primeira vez, é assim. Tudo é meio inesperado e original.

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