Ativista e Empreendedora Social, Priscila Gama coordena 12 Projetos de Ação Afirmativa e Impacto Social e é presidente do Instituto Das Pretas.Org e detentora de um ego leonino

O Lugar do Respeito

É o espaço que você entende que a excelência em viver em plenitude todas as dinâmicas de sua vida, precisam ser pensadas e executadas de forma que elas causem o mínimo de ruído e zero de prejuízo e dores nas vidas que perpassam pela sua

Publicado em 02/03/2020 às 18h40
Atualizado em 02/03/2020 às 18h48
 Crédito: Reprodução/ Instagram
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Passado o carnaval, eu tenho certeza que você também tá sentindo um misto de emoções – a sensação é de que agora que o ano começou de verdade e o desespero de saber que ele começou há dois meses. E é isso mesmo.

E na semana que abre-alas pra todas as comemorações e discussões sobre a mulher, eu quero dar sequência ao nosso Manual Anti-violento com um capítulo sensível para nós. Vamos falar sobre o lugar - pegue isso e inclua o lugar de fala, a vez, a voz, a história e o respeito – porque existe sim um lugar que a gente não tem olhado: o Lugar do Respeito.

Não sei nem se existe já alguém falando sobre isso, mas é fato que eu leio e vejo muitas pessoas falando sobre o Lugar de Fala e nos últimos dias também, tenho sido convocada a falar sobre o lugar que nos colocamos quando alguém exerce esse seu lugar de fala.

Primeiro quero dizer que esse lugar que, para mim é esse tal Lugar do Respeito, precisa ser fomentado de forma individual em nós mesmxs, porque é sobre uma tentativa de chegarmos o mais próximo de sermos justos com o outro primeiro e conosco em segundo. E isso, eu sei bem, não é uma coisa muito fácil de fazer. Pois enquanto seres humanos, pensar primeiro no eu é o modos operandi infeliz da nossa existência. O Lugar do Respeito é o lugar que a gente tem que se obrigar a ficar para não violentar e também não permitir que outro violente. É sobre agir e não se omitir. Complexo, né?

O Lugar do Respeito é o espaço que você entende que a excelência em viver em plenitude todas as dinâmicas de sua vida, precisam ser pensadas e executadas de forma que elas causem o mínimo de ruído e zero de prejuízo e dores nas vidas que perpassam pela sua. E isso de uma maneira geral, considerando o todo, o plural, o diverso e o discordante de você.

No Carnaval eu vivenciei um monte de momentos incríveis onde os Lugares de Fala e Respeito foram pensados sob a inovação dessa mulherada que grita por seus direitos ao passo de quem já entendeu que é preciso muita pedagogia para conseguirmos exercê-los. Mas nesse mesmo Carnaval, vi e vivi momentos de um total afastamento deste Lugar do Respeito que é esse espaço em que parecemos querer ignorar à cada possibilidade de vantagem, protagonismo, visibilidade, lucro e etc.

É incrivelmente bizarro como mulheres que usam a camisa da sororidade são capazes de ignorar as semânticas de seus significados quando é oportunizado qualquer vantagem, mesmo que para isso alguma outra mulher seja grandemente prejudicada. Ou como homens brancos são capazes de injuriar, caluniar e assediar mulheres (quase sempre negras) quando elas estão desacompanhadas – comportamento que não se dá, por exemplo, se essa mulher está acompanhada de um outro homem. Uma triste realidade.

O Lugar do Respeito também se quebra quando uma mulher negra exige a expansão de seu espaço, protagonismo e verdade, desconsiderando esse mesmo direito para outras mulheres negras. Enfim, parece que tem ainda mais complexidade do que eu conseguiria explicar por agora e, talvez por isso, esse texto seja muito mais um chamado para a reflexão sobre qual o lugar que você amplifica em você do que uma receita de bolo.

É uma tentativa de que nós, mulheres, entendamos que sem isso de maneira cada vez menos hipócrita, a gente continua agindo sobre o reflexo de uma educação sistemática onde mulheres, negras, lésbicas, trans, pobres, mais velhas, mães, solo, gordas – em uma somatória dos perfis que se encaixa, equacionando um mundo de violências normatizadas e normalizadas em nós.

Então, a minha sugestão é que a gente repense como queremos ser tratadas para refletir, umas às outras, um tratamento igual. Se não, violento continuará sendo. Violentas seremos e a sororidade não passará de estampa de uma camisa sobrepondo o bordado que escode as características que a estratégia não permite mostrar, que é o ser: racista, machista, sexista, homofóbica, transfóbica, gordofóbica e etc.

Mais um capítulo doloroso no livro mas que pode ser mudado no futuro. Depende inclusive, e muitíssimo, de nós.

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