Maria Sanz é artista e escritora. Como observadora do cotidiano, usa toda sua essência criativa na busca de entender a si mesma e o outro. 

Um amor, A Gazeta

"Você sabe, nosso papel-jornal diário vai acabar. Pelo menos por enquanto"

Publicado em 01/10/2019 às 12h10

Desde muito pequena, na nossa casa esse jornal tem lugar em cima da mesa. Ele simplesmente faz parte. Pertence como um ente. Ou melhor, uma entidade. Um nobre. Uma autoridade.

"A Gazeta chegou?"; "Seu Aloízio, por favor, coloca pra mim no Elevador?"; "pai, me passa o Caderno 2?" –– envolvido na rotina, esse papel-jornal carrega uma certa urgência, uma vontade de ser tocado, uma vocação para ser compartido. E sempre foi assim, ele importa. Interessa.

Ou interessava... Você sabe, nosso papel jornal diário vai acabar. Pelo menos por enquanto.

Não tem novidade, o jornalismo impresso atravessa uma revolução interplanetária. São novos os tempos e novos os meios de nos comunicarmos. De modo que, natural e gradualmente, o leitor decidiu: ele quer saber, mas quer na palma da mão, de modo digital e imediato.

Justo. Fazer o quê? O leitor, no caso eu e você, não quer mais ir até a banca de revistas, ou esperar que o jornal seja entregue de manhã cedo. É aquilo mesmo: a espera pelo "saber" já não faz mais sentido.

E talvez não faça mesmo... Ainda assim, ressinto.

Na verdade, compreendi quando nossa editora disse a toda equipe com a máxima maturidade: o veículo muda, e bom jornalismo melhora. Compreendi, mas não sem uma ponta de nostalgia, precoce e assumida.

Já sofro sua ausência. Já sinto saudades do meu companheiro diário. Meu parceiro de café preto. Sua manchete de capa, seu barulho, seu cheiro. Já me incomoda o espaço vazio na mesa da cozinha.

Pensando bem, este jornal que eu acompanho desde menina, de tanto pertencer à minha vida, me fez sonhar em pertencer a ele um dia.

Aconteceu. Já faz quinze anos que faço parte dessa empresa como colaboradora apaixonada. Confesso, mais que tudo, é por amor e devoção que escrevo. Amo mesmo. Talvez Freud explique... De tanto ver meu pai com os olhos grudados naquelas páginas compridas e cheias de letras, dei um jeito de estar por ali ––– que meu desejo era ser lida por ele. É, foi assim que eu criei essa fantasia: estar aonde os olhos do meu passeavam todos os dias.

Deu nisso. Virei colunista de domingo e me entrego com cada vez mais alegria.

Não sei o que você acha disso, mas peço licença e aproveito a oportunidade... Tudo bem? Podemos seguir juntos, agora aos sábados? *A partir de agora nossa revista vai ser publicada junto com o jornal de sábado que, como na maioria da imprensa mundial, passa a circular mais robusto uma única vez na semana.

Finalmente, tudo muda o tempo todo – o poeta já disse, eu sei, você sabe e até minha avó já dizia. Mas mesmo segurando a bandeira da mudança com as duas mãos, olho para ontem e suspiro. Sinto orgulho. Sinto gratidão, sinto a força do tempo, sinto uma lágrima morninha e sinto uma precoce nostalgia.

Enfim, vamos adiante, com a coragem renovada para fazermos uma nova história. Vamos juntos escrever esse amanhã que assim se anuncia: contemporâneo, interessante e no tempo do tempo de cada um todos os dias. Menos aos sábados, que é quando temos um encontro marcado.

Até!

A Gazeta integra o

Saiba mais

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.

A Gazeta deseja enviar alertas sobre as principais notícias do Espirito Santo.