É advogado. Doutor e Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo (USP)

Concessão de parques à iniciativa privada no ES: o que é preciso para dar certo

Muitas coisas precisam ser bem-feitas para que uma concessão funcione bem, para que os investimentos sejam realizados de modo adequado e que a sociedade possa sentir o retorno positivo almejado

Vitória
Publicado em 18/01/2024 às 01h20

A Gazeta noticiou em 11 de janeiro a contratação, pelo Estado, de consultoria para elaborar a modelagem do plano de concessão de parques estaduais, com a previsão de que no primeiro semestre de 2025 ocorra o primeiro leilão na Bolsa de Valores de São Paulo.

O Espírito Santo possui incríveis recursos naturais, com parques estabelecidos na mata fria de Domingos Martins, nas imediações do Caparaó, no centro do Estado e nas regiões litorâneas.

Evidentemente que, do ponto de vista ambiental, os parques podem – se adequadamente fiscalizados – exercer sua função de preservação da fauna e da flora, albergando espécies ameaçadas e servindo de refúgio para animais e plantas.

A despeito disso, é verdade que esses mesmos parques não atingem os fins sociais desejados. Não têm a capacidade de atrair uma quantidade significativa de visitantes e de gerar riqueza por meio do turismo e da exploração sustentável dos recursos naturais.

E isso por um motivo comum a quase tudo que não funciona no Brasil: baixa capacidade de investimento e dificuldades de gestão da coisa pública.

Não se trata de um problema especial de nosso Estado. Ao contrário, é comum que o dinheiro tirado à força do cidadão, pelos tributos, seja consumido pelas despesas corriqueiras da máquina pública, antes que qualquer investimento possa ser concebido. E mais: mesmo quando há possibilidade de investir, a eficiência do emprego desses recursos é reduzida, pela baixa eficiência da administração, limitada em vários quadrantes.

Ainda que possamos colocar de lado dificuldades éticas, a lei impede que o Estado faça mais com menos recursos. Nossa Constituição exige a contratação de profissionais por concursos públicos, com salários e “direitos” acima da média nacional e de difícil aferição de produtividade e eficiência.

Além disso, toda a atuação do gestor público se encontra limitada por uma série de procedimentos demorados, custosos e ineficientes, tal como a exigência de licitação para compras e contratação de serviços, a qual não raro leva meses e sujeita o poder público a preços pouco competitivos.

Sem paixões. Apenas fatos. Não é o caso aqui de avaliar se tudo isso tem justificativa ou não. Ou se, diante das mesmas leis, as coisas poderiam funcionar de modo melhor do que funcionam. A premissa é apenas essa: são dificuldades que existem e impedem que o Estado atinja o bem comum.

Isso significa que a concessão será uma panaceia para todos esses males, e resolverá todos os problemas pelo simples fato de representar a possibilidade de a coisa pública ser administrada, de modo mais eficiente, pelas mãos de empresas privadas?

Não. Evidentemente que não! Seria absolutamente temerária tal afirmação.

Parque Estadual de Itaúnas
Parque Estadual de Itaúnas. Crédito: Reprodução/IEMA ES

Muitas coisas precisam ser bem-feitas para que uma concessão funcione bem, para que os investimentos sejam realizados de modo adequado e que a sociedade possa sentir o retorno positivo almejado. A primeira delas diz respeito à realização de estudos prévios profundos, os quais tenham o condão de identificar os potenciais de receitas, os investimentos necessários e os entraves que eventual concessionária venha a enfrentar, caso vencedora no leilão. Esse passo, aparentemente, já está sendo seguido pelo Estado.

Depois disso, deve ainda ocorrer a utilização adequada do poder fiscalizatório do Estado, pautado exclusivamente em parâmetros legais e contratuais. A empresa concessionária, antes de dispor de seus recursos, em prol da atividade pública, precisa ter a garantia de que as obrigações que lhe serão exigidas serão apenas aquelas previstos em contrato e que o retorno para os seus respectivos investimentos deverá ser aquele proposto, sem o risco de alterações futuras a bel prazer das circunstâncias políticas da ocasião ou mesmo por decisões judiciais, pautadas em princípios vagos e motivadas por informações rasas ou baixo conhecimento a respeito das nuances do contrato e da operação.

O caminho, certamente, não será tão simples. Isso, todavia, não nos impede de celebrar a iniciativa do Estado e o reconhecimento de que, sem chamar a iniciativa privada para a equação, estaremos fadados a esperar eternamente por investimentos públicos que, se um dia vierem, serão ainda insuficientes para atender às necessidades da população.

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