É psicóloga, psicanalista, entusiasta da maternidade, paternidade e mestre em Saúde Coletiva. Escreve sobre os bebês, as emoções, os comportamentos, os conflitos e dilemas contemporâneos do tornar-se família

“O bebê nasceu, mas quando ele nasce como gente?”

O nascimento psicológico da criança, ocorre fora do útero e é resultado da relação estabelecida entre o sujeito que cuida (mãe) e o "proto-sujeito” a ser cuidado (bebê) onde ambos modelam-se a partir da necessidade do outro

Publicado em 18/11/2019 às 11h15
Atualizado em 27/03/2020 às 20h10
O nascimento psicológico da criança, que é o que você pergunta, ocorre fora do útero e é resultado da relação estabelecida entre o sujeito que cuida (mãe) e o "proto-sujeito” a ser cuidado (bebê) onde ambos modelam-se a partir da necessidade do outro. Crédito: unsplash
O nascimento psicológico da criança, que é o que você pergunta, ocorre fora do útero e é resultado da relação estabelecida entre o sujeito que cuida (mãe) e o "proto-sujeito” a ser cuidado (bebê) onde ambos modelam-se a partir da necessidade do outro. Crédito: unsplash

A separação do corpo do bebê, do corpo de sua mãe, que ocorre no momento do parto e nascimento é o que chamamos nascimento físico. Essa é a primeira experiência de separação que todo ser humano inevitavelmente atravessará.

Mas para se manter vivo, fora da acolhida do corpo da mãe o bebê precisa de cuidados intensivos, minuciosos, voltados a sua demanda particular. Esses cuidados promovem a simbiose somato-psíquica necessária à construção de nossa subjetividade.

O nascimento psicológico da criança, que é o que você pergunta, ocorre fora do útero e é resultado da relação estabelecida entre o sujeito que cuida (mãe) e o "proto-sujeito” a ser cuidado (bebê) onde ambos modelam-se a partir da necessidade do outro, ou seja, o filho faz a mãe e o que falta ao bebê lhe é proporcionado pela por ela.

Quando um bebê nasce ele está alienado a si mesmo, ele é onipotente. Ele chora e “algo” o acalenta, mas ele não sabe que é alguém. A mãe não é uma pessoa, um sujeito, mas sim, parte dele. O bebê não apreende as trocas com o outro, mas inicialmente registra apenas as sensações físicas de tensão e alívio, que atribui a si. O seio da mãe é um apêndice do todo poderoso bebê.

A mãe é quem vai humanizado o bebê. Ao nomear sua fome, acolher seu choro, sugerir que o desconforto é devido a fralda está suja, vai inscrevendo suas necessidades na linguagem. É ao maternar o seu bebê que a mãe vai introduzindo-o na sociedade, cultura e família. Os cuidados de uma mãe com o seu bebê são fundantes da humanidade do bebê. São eles que encaminham o “infans” (o bebê que não fala) à condição de sujeito (criança).

Mas o fundamental dessa equação é que aos poucos essa fusão se dissipe e os cuidados possam ir dando lugar às experiências de autonomia para o bebê e para a mãe. Ambos possam ir se endereçando a outros objetos e experiência, que suportem os afastamentos e que os reencontros sejam estáveis. Já escrevi sobre os processos de desmame, mas para nascer enquanto sujeito o bebê precisa se a ver com faltas. É no movimento de vai-e-vem da mãe, que os se ocupar de outras coisas e não estar totalmente voltada ao bebê, a oportunidade dele também ir se constituindo faltoso.

Serão as atitudes emocionais singulares da mãe e a capacidade de apreensão do bebê que promoverão o encaminhamento para a individuação. Para nascer psiquicamente o bebê inevitavelmente precisa de uma mãe que demore a chegar e responder as suas demandas, que tenha se constituído também faltosa. A experiência de satisfação imediata vai se espaçando e o bebê vai diferenciado o seu corpo do corpo da mãe, as suas demandas das possibilidades de resposta dela e por fim vai percebendo que em sua ausência não se desintegra e em sua presença estará apaziguado.

Quando me perguntam qual é o trabalho mais importante do mundo respondo: o da mãe. Pois ao estabelecer a relação como seu bebê ela garante não apenas a manutenção de sua vida física, mas principalmente, se tudo correr bem, a capacidade de seu bebê se tornar sujeito e criar. 

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