Precisamente às 22h18 do dia 31 de dezembro de 1997, uma quarta-feira, na Rua da Laje, número 113, no bairro Itaquari, em Cariacica, foi assassinado um dos grandes expoentes do rádio no Espírito Santo, o então deputado estadual Antário Alexandre Theodoro Filho, aos 42 anos. Ele trabalhava nos estúdios da emissora Tropical FM, em tradicional programação de Réveillon, quando um homem invadiu o local e disparou 10 tiros contra o radialista, utilizando uma pistola calibre 380.
Ao lado de Antário Filho, estavam a namorada do radialista e o filho dele, Antário Neto, com 15 anos na época. A voz eloquente do apresentador da rádio, após os barulhos dos tiros, deu lugar aos gritos do adolescente, que tomou o microfone e pediu socorro pela vida do pai. A vítima chegou a ser levada às pressas para o Hospital Santa Rita, em Vitória, pelo amigo Renato Duarte, que também era locutor da emissora, porém, acabou não resistindo aos ferimentos.
De acordo com o Departamento Médico Legal (DML), dos 10 tiros que atingiram o radialista, oito foram no tórax, um no pescoço e outro no rosto.
O sepultamento de Antário Filho, realizado às 16h15 do dia 2 de janeiro de 1998, no jazigo 505 do setor Camélia, no Cemitério Jardim da Paz, em Laranjeiras, no município da Serra, foi palco de enorme comoção, em que estiveram presentes cerca de dez mil pessoas, entre apoiadores políticos, ouvintes, família e amigos.
Em homenagem a Antário Filho, a rádio Tropical FM chegou a dedicar, nos primeiros dias, parte da programação a temas religiosos, em vez da programação voltada à música popular.
A polícia logo entregou uma resposta ao clamor social identificando dois irmãos, prováveis responsáveis pelo crime, que acabaram sendo presos. Um teria sido o executor dos disparos e o outro teria ficado dentro de um veículo Volkswagen Gol esperando a volta do atirador. O carro foi encontrado queimado pouco depois, na Praia do Canto, em Vitória.
Durante toda a fase de investigação, o trabalho da polícia foi prejudicado pelo recebimento de diversas denúncias anônimas falsas. Na versão que trata a história como um crime passional, a tese seria de que teria sido fruto de ciúmes da ex-esposa do atirador, a quem Antário Filho teria prometido doações de uma cama e um guarda-roupas.
Apesar das suspeitas, inicialmente algumas questões foram levantadas como dignas de dúvida: os dois rapazes, de 31 e 33 anos à época, eram réus primários, com bons antecedentes, endereço fixo e ocupação lícita. Além disso, o depoimento à juíza da 4ª Vara Criminal de Cariacica não apresentava contradições e passava bastante segurança. O apontado como atirador, um auxiliar de serviços gerais, inclusive, negou o crime e disse que nunca havia encostado em uma arma.
Com o apontado como executor estava o irmão e, mais tarde, também foram trazidas duas mulheres ao caso, que teriam aguardado no carro na frente da emissora todos eles terão as identidades preservadas. Os acusados foram absolvidos em 1999, no primeiro julgamento realizado pelo Tribunal do Júri de Cariacica. Contudo, o Ministério Público Estadual recorreu e, em 2005, houve um novo julgamento em que o atirador foi condenado e os outros envolvidos, absolvidos.
Já durante o julgamento, o assassino confessou o crime, alegando que matou Antário Filho porque o radialista teria "cantado" sua esposa. Ele residia em Vitória e contou em depoimento que a esposa era fã do radialista. No dia 21 setembro de 2017, o acusado teve sua liberdade concedida após progredir de regime de cumprimento de pena.
Brutalidade. É assim que Antário Neto, hoje com 39 anos, classifica o atentado que presenciou contra o pai, quando tinha ainda 15 anos de idade. Ele, que seguiu o trilho de Antário Filho e é radialista da rádio Tropical FM, já tinha perdido a mãe Leila para um câncer, quando ele tinha 9 anos.
Antário Neto conta que não conseguia achar um motivo plausível para o homicídio e demorou a voltar a ter uma "vida normal". "Fui tentando voltar à normalidade, à escola, às coisas de adolescente. Fui retomando dia a dia, mês a mês. O que mais me marcou foi a brutalidade, a maldade do ser humano em cometer uma covardia tão grande com um ser humano bom. Como uma pessoa consegue ser tão cruel?", questionou.
Segundo o filho do deputado, a insegurança acabou tomando conta dos pensamentos dele, que frequentemente se perguntava do que o ser humano é capaz: "Se tiraram a vida de um político, de um comunicador, com essa brutalidade, o que são capazes de fazer com as outras pessoas, então?".
Apesar da tão lamentável lembrança do episódio contra Antário, o filho lembra do pai com muita alegria. "Penso nele com um sorriso no rosto, ajudando as pessoas, fazendo o bem, se comunicando na rádio. Só lembro dele assim. E o que ele mais me inspirou foi na minha profissão, de estar como radialista hoje, seguir o caminho dele no rádio. Tocar o sonho dele", revelou Antário Neto.
Por fim, Antário Neto, que era só um menino em 1997, desabafou ao contar que até hoje o trágico incidente mexe muito com ele. "Ainda é muito difícil falar de 31/12/1997. Mas, pela memória dele, para que nunca se apague, eu faço esse esforço", confidenciou.
À reportagem de A Gazeta, Alexandre Nunes Theodoro, irmão de Antário Filho e reitor de uma faculdade particular de Vitória, trouxe uma perspectiva da tragédia. A noite do crime, para ele, foi marcada por muitos sentimentos, entre eles a tristeza profunda de perder um ente querido.
Sobre o processo judicial, Theodoro afirmou que "a Justiça não elimina a dor da perda". "Infelizmente, o processo judicial não foi contundente. Foram muitas idas e vindas e sofremos com o desgaste da impunidade. Quando a Justiça pune os culpados, você se sente protegido enquanto cidadão. Quando ela tarda ou desvia o seu foco, provoca uma sensação de abandono. E foi assim que nos sentimos", disse.
Na definição do irmão, Antário Filho era um homem alegre e carismático, visionário e empreendedor, que valorizava a vida e as pessoas. Ele também era um apaixonado pelos filhos, pela comunicação e inspirava a todos com sua energia. "Além, é claro, de ter sido um irmão amado, que gostava de estar em família. Sempre foi um muito bom em tudo o que fazia e nos unia em torno das novidades que ele trazia. Sua energia era contagiante", finalizou.
O professor de Jornalismo da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), José Edgar Rebouças, era, à época do crime, assessor de imprensa de uma das empresas da família de Antário Filho. Com o episódio, passou a fazer uma ponte entre os veículos de mídia e os mais diretamente ligados ao locutor, já que muitas vezes não tinham condições psicológicas de suportar a pressão das entrevistas.
Rebouças contou à reportagem que se colocou à disposição da família logo ao descobrir o ocorrido. "Vi a notícia logo quando eu acordei no primeiro dia do ano de 1998. Logo liguei para eles e me coloquei à disposição para fazer o meio de campo com a imprensa. Foi um choque muito grande, porque além de um membro da família assassinado, houve o fato de o Antário Neto ter estado presente, e ele era só um menino, ficou muito abalado. Ficou todo mundo muito envolvido", iniciou.
O enterro do deputado estadual foi de uma comoção enorme. "Ali eu me apresentei com mais força para a família, já que havia muito jornalista presente e, às vezes, era um pouco inconveniente, então fiz uma barreira. Como Antário Neto esteve junto na hora do crime, ele era sempre levado à delegacia para fazer reconhecimento de suspeito e pediam para eu ir junto. Então dei uma força para eles e era preciso proteger o menino", acrescentou.
Edgard Rebouças conta que houve muita comoção em volta do caso, especialmente com a sociedade querendo saber se havia sido um crime político ou passional, como se especulou à época. Além de tudo, Antário Filho era um homem muito querido e popular.
Para o professor, desde o início o caso foi muito confuso, por envolver várias hipóteses diferentes. "Tinha suspeita de crime organizado ou político, que era muito forte no Estado à época, e a acusação do crime passional, com os dois irmãos envolvidos. Um deles falou que era porque a esposa era fã do Antário, mas essa versão não colou muito e os dois foram inocentados. Um deles só foi preso um tempo depois e já foi até solto. Mas havia outras linhas de investigação, até com envolvimento da Polícia Federal, de que era crime de mando por questões políticas", disse.
A cobertura jornalística do caso durou um longo período de tempo até que chegou ao julgamento dos irmãos suspeitos do crime. A história de crime passional, por ciúmes, para o assessor, parecia mal contada e isso chegou a ser levantado pelos jornais à época. Apesar disso, nenhum dos dois irmãos era um pistoleiro profissional, o que dificultava a versão de que teriam envolvimento com o crime organizado.
O assassinato do radialista-deputado estadual Antário Filho repercutiu na imprensa capixaba e nacional, inclusive no programa Linha Direta, veiculado pela Rede Globo. Veículos de várias partes do Brasil deram destaque ao crime. O jornal A Gazeta trouxe na capa de suas edições dos dias 2 e 3 de janeiro de 1998 os desdobramentos do caso e acompanhou em detalhes o caso ao longo dos dias. Confira a seguir alguns exemplares:
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