Publicado em 15 de julho de 2025 às 05:59
SÃO PAULO - Imagens da câmera acoplada ao colete de um policial militar mostram quando os agentes atiram e matam um suspeito rendido, durante uma ação na semana passada na favela de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo.>
Por causa da ação, considerada ilegal pela própria corporação, dois PMs foram presos.>
As imagens, divulgadas inicialmente pela Globo e obtidas pela Folha de S.Paulo, mostram que Igor Oliveira de Moraes Santos, 24, foi alvo de disparos duas vezes. A primeira, quando estava agachado com os braços erguidos atrás de uma cama. Na segunda, quando se levanta, com a mão direita erguida -do lado esquerdo do seu peito há uma marca de sangue. Nesse momento ele é atingido por mais disparos.>
A imagem mostra que ao menos quatro policiais militares da Rocam (Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas) vistoriam casas da comunidade. A gravação, iniciada às 15h43 da última quarta-feira (10), tem cerca de dois minutos de duração.>
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Um dos policiais, imediatamente à frente do agente que estava com a câmera ligada, abre a porta de um dos imóveis. Ele olha para o interior, deixa a porta aberta, e segue atrás do outro PM, quando o agente com o equipamento de vídeo pede para segurar.>
O PM que havia aberto a porta, então, volta para o interior do imóvel. Com uma lanterna ele vai até um cômodo. O agente com a câmera, com uma pistola na mão direita, caminha pela sala e chega a olhar atrás do sofá, além de outros espaços da casa.>
Na sequência, eles sobem uma escada. No andar de cima, o policial à frente do PM com a câmera aponta com uma arma para dentro do quarto onde estão dois homens. Os agentes atiram contra o interior do cômodo. Igor, antes dos disparos, aparece encostado na parede com as mãos atrás da cabeça. Após os tiros, ele se abaixa.>
Há som de gritos e um dos policias militares pede para "largar a arma".>
Igor aparece agachado atrás da cama e levanta o braço direito. Um dos agentes pergunta se ele tem antecedentes, o que ele nega com a cabeça, e pede para ele se levantar. Quando Igor faz isso, é baleado pelo PM com a câmera e pelo outro, com arma longa. Um dos tiros acerta o lado do suspeito, próximo à barriga.>
Há um barulho de equipamento eletrônico e o PM que gravou a imagens repete "as cop [câmeras operacionais portáteis]". A imagem mostra a seguir uma parede. É possível ouvir gritos e mais dois disparos e ordens para os suspeitos "que não estiverem armados" deitarem no chão.>
Ao todo, é possível ouvir seis tiros durante a gravação.>
Os dois policiais presos pela ação foram identificados como Renato Torquatto da Cruz e Robson Noguchi de Lima. A reportagem não conseguiu localizar suas defesas.>
No momento em que foi atingido, Igor estava na casa em que ele e outros três suspeitos haviam entrado para fugir da perseguição policial que começou em uma praça próxima.>
Um dos policiais omitiu a rendição e afirmou em boletim de ocorrência que o homem sacou a arma que carregava na cintura e que, por isso, efetuou os disparos.>
Na última sexta-feira (11), o chefe da comunicação da Polícia Militar de São Paulo, coronel Emerson Massera, afirmou que mortes de vítimas desarmadas e rendidas por policiais não ocorrem por falta de treinamento. Ele disse que PMs têm consciência de que mortes nessas circunstâncias são ilegais.>
Massera comentava a prisão em flagrante dos dois policiais pela morte de Igor.>
"Os policiais que cometeram erros sabiam que estavam cometendo erros e optaram por isso", disse o coronel, ressaltando que os militares recebem treinamento não apenas na academia de polícia mas ao longo de toda a carreira. "A falta de treinamento não pode ser alegada para o cometimento de algumas ações que são dolosas [com intenção].">
A morte desencadeou uma onda protestos e vandalismo na comunidade durante a noite de quinta-feira. Moradores atearam fogo em pneus e pedaços de madeira, viraram carros e fecharam algumas ruas do local. O tumulto foi sucedido de nova operação em que mais um homem foi morto e um agente da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar, tropa de elite da PM) ficou ferido.>
Na sexta, o chefe da comunicação da PM ressaltou que as imagens que mostraram a morte do suspeito quando já estava rendido foram captadas pelos novos modelos de câmeras corporais, e que elas foram acionadas automaticamente -via tecnologia bluetooth- após um dos policiais ligar seu próprio equipamento.>
As câmeras têm uma função que aciona todos os equipamentos num raio de 20 metros quando o botão de uma delas é ligada manualmente.>
Igor já tinha sido internado na Fundação Casa quando era menor de 18 anos por atos infracionais análogos a roubo e tráfico de drogas. A corporação disse que os outros três suspeitos também tinham antecedentes criminais por infrações como roubo, tráfico de drogas e furto.>
Os dois policiais presos foram indiciados por suspeita de homicídio doloso, ou seja, com intenção de matar.>
O Ministério Público de São Paulo disse que no último sábado (12) requereu, por intermédio dos promotores de Justiça Everton Zanella e Pedro Henrique Pavanelli Lima, a conversão da prisão em flagrante dos policiais militares em preventiva (sem prazo).>
Segundo a Secretaria da Segurança Pública, o caso está sendo investigado pelo DHPP (Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa).>
"A equipe já recebeu as imagens das câmeras operacionais, utilizadas pelos policiais militares envolvidos na ocorrência, que estão sendo analisadas para contribuir com o esclarecimento dos fatos", diz trecho da nota da pasta.>
Outros dois PMs também foram indiciados, por apresentarem versões incompatíveis com as imagens registradas.>
As prisões e os indiciamentos foram realizados pela Polícia Judiciária Militar, responsável pelo acesso imediato às gravações das câmeras operacionais portáteis , no âmbito do IPM (Inquérito Policial Militar) instaurado paralelamente à investigação conduzida pela Polícia Civil.>
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